sexta-feira, agosto 31, 2018

O líder separatista Aleksandr Zakharchenko é morto em Donetsk

Em resultado da explosão no centro de Donetsk foi morto o chefe dos separatistas da dita “dnr”, Alexander Zakharchenko, que morreu no hospital, devido aos ferimentos contraídos, informa o portal Life. A informação sobre a morte do Zakharchenko foi confirmada pelas fontes separatistas e pela porta-voz da secreta ucraniana SBU, Olena Gitlyanska, informa a publicação ucraniana NV.ua

Sim, de acordo com as nossas informações, isso corresponde à verdade, acreditamos que isso é o resultado de guerras internas”, explicou a Sra. Gitlyanska.
Comandante das Forças Especiais da Ucrânia (SSO), tenente-general Ihor Luniov:
"Não fomos nos. Glória à Ucrânia!"
De acordo com a imprensa russa, Zakharchenko morreu em resultado da explosão no café “Sépar” (calão ucraniano, correspondente ao termo separatista) em Donetsk. O café estava situado nas proximidades da sua “residência” e alegadamente pertencia ao chefe da sua segurança pessoal. Na mesma explosão foi mortalmente ferido o chefe do “ministério das finanças/da fazenda” da dita “república popular”, natural da Rússia, Alexander Timofeev (1971).
Alguma imprensa russa escreve que Alexander Timofeev, nom de guerre “Tachkent”
(“ministério das finanças/da fazenda” da dita “dnr”,) acaba se tornar o “herói da dnr”
O local da explosão
Segundo alguns relatos, o dispositivo explosivo foi colocado num candeeiro junto à mesa, geralmente escolhida pelo Zakharchenko para as suas refeições, escreve a página Korrespondent.net

As forças terroristas se apressaram à afirmar que em Donetsk já foram detidos os alegados “sabotadores ucranianos”, suspeitos de liquidar Zakharchenko. 
Piada das redes sociais: "Os sabotadores ucranianos se retirando de Donetsk"
Outros dados apontam que o principal responsável pela liquidação do Zakharchenko é um dos seus seguranças, que desapareceu do local da explosão, e agora está sendo procurado pelos separatistas em todos os postos de controlo na fronteira entre os territórios da dita “dnr” com a Rússia e Ucrânia. As entradas e saídas de Donetsk estão sendo bloqueadas, amanha, no dia 1 de setembro, nas escolas da dita “república popular” foi cancelado o início do ano lectivo.
Blindados à circularem pelas ruas de Donetsk
O mecânico electricista da profissão, Aleksandr Zakharchenko (1976) notabilizou-se na primeira onda de manifestações separatistas, inspiradas pelo Kremlin, que assombraram o leste da Ucrânia na primavera de 2014. Na altura, Zakharchenko dirigia em Donetsk o filial local do clube de combate “Oplot”, cuja liderança e os membros foram muito ativos em diversas atividades anti-ucranianas. Em 16 de abril de 2014, ele liderou o grupo terrorista que ocupou o edifício da administração estatal de Donetsk. Como resultado das “eleições” na dita “república”, em novembro de 2014 Zakharchenko se tornou o líder do grupo terrorista “dnr”, substituindo no cargo o cidadão russo Alexander Boroday.
A continência do Zakharhenko (no meio) numa “parada militar” em Donetsk, 2017
É de notar que ex-líder do clube de combate (que desde 2014 se converteu em bando ilegal armado) “Oplot”, o terrorista Evgeniy Zhylin, foi morto no dia 19 de setembro de 2016, nos arredores de Moscovo. Cidadão da Ucrânia, Zhylin era conhecido pelas suas posições estalinistas e pró-russas, era responsável pelos diversos ataques violentos contra os manifestantes ucranianos durante a Revolução de Dignidade (movimento Maydan) no inverno de 2013-2014.
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Na Internet já surgiram as primeiras fotos do local da explosão em Donetsk, ​​ocupada pelos separatistas, no café, onde, foi atingido mortalmente o líder da dita “dnr”. Como observa a página News of Donbass, a explosão ocorreu dentro do recinto do restaurante, onde, em resultado da explosão, deflagrou um incêndio. De acordo com dados preliminares, Alexander Zakharchenko foi morto na explosão, mais dois ou três acompanhantes seus ficaram feridos.
A vista aérea do local de explosão

quinta-feira, agosto 30, 2018

A aguda crise alimentar soviética das décadas de 1960-1980

Em 1960, a URSS foi atingida por uma aguda crise alimentar. Nas lojas desapareceram vários tipos de cereais, massas, manteiga, leite derretido, produtos semiacabados de carne, carne de porco cozida, etc. Surgiram problemas com farinha e pão de trigo. Nas padarias foram impostos os limites na compra do pão, se vendia o pão feito com aditivo da farinha de feijão.

por: Dmytro Chekalkin, Ucrânia

Em dezembro de 1963, o governo soviético compra nos EUA o primeiro lote de 12 milhões de toneladas de trigo, na década de 1970, as importações de trigo são constantes. Em troca, Washington impões ao Moscovo a baixa dos preços de petróleo.

Em 20 de outubro de 1975, entre URSS e os EUA assinam um acordo de longo prazo, segundo o qual a URSS se compromete à comprar, anualmente, 6 milhões de toneladas de trigo nos EUA.

No fim da década de 1970, as regiões da Rússia Central vivem a falta constante do pão, carne, leite e outros produtos alimentares mais básios. A falta dos alimentos obriga os moradores destas regiões se deslocarem às compras nas lojas de Moscovo, Leninegrado e outras grandes cidades. Os alimentos estão disponíveis nos mercados chamados “kolkhozianos”, mas seus preços são demasiadamente altos aos bolsos do cidadão comum.
A intelligentsia citadina soviética na "ajuda voluntária" ao algum kolkhoz "milionário", década de 1980
No início da década de 1980, as compras de trigo nos EUA chegaram aos 16 milhões de toneladas, quando as autoridades norte-americanas impuseram à URSS o embargo comercial, devido à invasão soviética do Afeganistão. URSS foi forçada à recorrer na compra dos cereais aos mercados de Canadá, Argentina e Austrália. Em 1985, as compras soviéticas representavam mais de 15% das importações mundiais de grãos – 44 milhões de toneladas.

Em 25 de agosto de 1983, a URSS assinou um dos maiores acordos de comércio exterior, silenciado, por completo, na imprensa soviética: compra de grãos nos EUA ao preço recorde de 10 bilhões de dólares. Em comparação, a compra de gigantesca fábrica de automóveis Fiat, rebatizados na URSS como VAZ (Lada Zhiguli), que na década de 1970 fabricava mais de metade de todas as viaturas particulares soviéticas, custou aos cofres da URSS apenas 900 milhões de dólares (11 vezes menos).

Em 1984 a URSS chegou à mais um “recorde de construção do comunismo”: pela primeira vez, o volume de importações de grãos ultrapassou 40 milhões de toneladas, representando quase um quarto das necessidades soviéticas (toda 4ª tonelada de trigo era comprada pela URSS no exterior). O “país do socialismo desenvolvido”, tornou-se o maior importador mundial de grãos.

No ano seguinte, 1985, o volume de importações aumentou e atingiu o recorde absoluto de 44 milhões de toneladas. Cerca de 50 anos de experiências comunistas levaram à um colapso completo na agricultura, apesar dos enormes esforços e altos investimentos na produção dos equipamentos agrícolas, em que a União Soviética, em números absolutos, estava em primeiro lugar mundial. Mas nada disso ajudou, o próprio sistema era inviável.
Slogan da década de 1930: "Kolkhozianos, na base da colectivização total liquidaremos kulak como a classe"
As reformas económicas de Khrushchev, que deveriam elevar o país a uma economia mais produtiva, começaram a fracassar. As suas iniciativas, como a campanha de milho, o desenvolvimento de terras virgens, a eliminação das “aldeias sem perspetivas”, uso abundante de agro-químicos (e como consequência, o rápido esgotamento das terras) – tudo isso afetava a quantidade e a qualidade da colheita de grãos.

As estatísticas mostravam: se em 1954-1958 a colheita média do trigo chegou na URSS aos 730 kg por hectare, em 1962 as colheitas caíram aos 610 kg por hectares. Quando a URSS não dispunha de quantidades suficientes da moeda forte, o fornecimento de trigo era pago em suas reservas de ouro. Segundo analistas americanos, na compra de trigo e outros cereais, desde o início dos anos 1960 até os meados da década de 1980, a União Soviética gastou mais de 900 toneladas de ouro. Por ano, a URSS gastava em média, de 12% a 15% de suas reservas de ouro.

Especialistas soviéticos/russos apontam mais uma razão da dependência soviética do trigo americano. Até à década de 1960, na URSS, uma proporção significativa de moagem de farinha e de panificação estava efetuada pelas cooperativas. As padarias estatais existiam principalmente nas grandes cidades, e a sua variedade de pão era extremamente escassa; a maioria da produção de panificação era produzida por padarias pertencentes às cooperativas.
O tal famoso, "sorvete saboroso", que se tornou um meme, décadas de 1970-80
Em meados da década de 1960, a URSS eliminou quase por completo o seu sistema de cooperativas, e as suas unidades produtivas foram nacionalizadas. Nas novas empresas estatais foram introduzidos cargos administrativos absolutamente desnecessários que consumiam a maior parte do seu orçamento, não ajudando a melhorar o desempenho das empresas. Como resultado, o interesse financeiro dos funcionários desapareceu, o que imediatamente afetou a qualidade e o volume dos produtos. Mesmo com reservas suficientes de trigo, as moagens e as panificadoras deixaram de atender às necessidades do país.

Mas por outra, quem é que precisava de pão num país, que produzia o sorvete tão saboroso?
Na foto do arquivo: uma fila feminina (pois homens ou bebiam, ou morreram ou fugiram do kolkhoz) para comprar o pão numa aldeia da Rússia soviética, década de 1960

A tragédia ucraniana do cerco de Ilovaysk é recordada em Kyiv

No dia 28 de agosto de 2014, as colunas militares ucranianas, se retiravam do cerco de Ilovaysk, na região de Donetsk, usando o “corredor verde”, oferecido como “caminho seguro” pelos oficiais do exército regular russo. Em resultado e segundo as fontes oficiais, morreram 366 e foram feridos 429 ucranianos.
Os militares e membros das unidades voluntárias ucranianas (batalhões “Aydar”, “Azov”, “Dnipro-1”, “Djokhar Dudaev”, “Donbas”, “Kryvbas”, Setor da Direita, etc.) foram alvejados pela artilharia e sistemas «Grad» russos. 
As emblemas das unidades ucranianas envolvidas 
Uma parte das forças ucranianas conseguiu romper o cerco, mas vários combatentes foram mortos, feridos, desaparecidos em combate (MIA) ou capturados (POW) pelo inimigo. As forças regulares russas alvejaram até os seus próprios militares, capturados, dias antes, em combate, pelos ucranianos. Os ucranianos capturados, por sua vez, passaram pelo pleno calvário russo-terrorista. Vários deles foram fuzilados, mesmo sendo feridos (principalmente os combatentes das unidades voluntárias). Existem as recordações absolutamente horrorizantes, quando os militares ucranianos eram fuzilados, mortos, alvejados, mesmo pisados pelos camiões/caminhões do bando ilegal armado “batalhão Vostok”.
No fim, os militares das FAU sobreviventes à chacina, de forma geral, foram entregues aos cuidados da Ucrânia, os voluntários capturados ou foram assassinados ou entregues aos terroristas das “repúblicas populares” (muitos deles conseguiram escapar com a vida, trocados pelos separatistas ou mesmo libertados consoante o pagamento dos resgates exigidos pelos terroristas).
Em memória de todos os civis e militares ucranianos mortos (ou desaparecidos em combate) na guerra russo-ucraniana desde 2014, no dia 29 de agosto de 2018, em frente da embaixada russa em Kyiv foram colocados as cruzes com os seus retratos. Ucrânia deseja mostrar que não irá esquecer, nem perdoar todos os crimes russos, cometidos pelos seus “voluntários” ou efetivos regulares no leste da Ucrânia.
Fotos: @Miroslav Gai  

O trecho do filme documentário “Cavalheiros do Céu da Ucrânia”, dedicado ao tema da tragédia de Ilovaysk, exibido em Portugal em maio de 2016, legendado em português (o trecho infelizmente não):

quarta-feira, agosto 29, 2018

Orest, o Polaco, que defende Ucrânia na linha da frente na Donbas

Antes de completar os seus 18 anos, o cidadão polaco/polonês Orest se mudou para Ucrânia. Com início da guerra russo-ucraniana na Donbas, ele pediu a nacionalidade ucraniana e se alistou no exército da Ucrânia (FAU), para defender a terra dos seus antepassados, escreve a publicação ucraniana Novynarnia.com

por: Anastasia Fedchenko, região de Donetsk, fotos da autora

Orest tem vergonha de usar o capacete. Diz, com os risos, que as suas orelhas ficam fora dele. Ele tem olhos castanhos, é baixo, magro e muito jovem.
O 1º soldado Orest observa com atenção as posições inimigas num dos pontos ucranianos avançados nos arredores de Avdiivka. A vila é defendida pela sua 92ª Brigada mecanizada das FAU: “dois deles foram para algum lugar, então a atenção deve ser redobrada”, explica Orest.

Ele acordou nesta manhã devido ao fogo de franco-atirador inimigo que alvejava as posições ucranianas. A sua unidade conhece as posições dos terroristas, mas não respondem à provocação [mais um cessar-fogo entrou em vigor desde o dia 29 de agosto]. Os militares ucranianos respondem apenas quando o inimigo dispara durante muito tempo e de forma consistente.

Orest é um polaco/polonês. Sua mãe é ucraniana, o pai é polaco/polonês. O jovem nasceu na Polónia, praticamente não falava ucraniano. Depois quis se mudar para Ucrânia, para a casa da sua avó em Lviv. Conta que primeiro ficou com medo da barreira da língua. Embora sendo duas línguas bastante semelhantes, Orest tinha receio de errar e se envergonhar. Então, começou estudar a língua.

Quando começou a guerra russo-ucraniana, ele quis ir para a linha da frente/front. Era um estrangeiro, só poderia entrar num batalhão voluntário. Mas decidiu esperar até receber a cidadania ucraniana. Levou alguns meses, durante os quais Orest aprendeu bem a língua e as tradições ucranianas – ajudaram os seus amigos ucranianos que ele conheceu na Polónia.

Logo que recebeu a cidadania ucraniana, assinou o contrato com as FAU. Tinha apenas 18 anos. Os pais nada sabiam da sua escolha. Orest disse-lhes que foi estudar num colégio militar. Quando falava com os pais pelo telefone, explicava os tiros, dizendo que estão em exercícios militares.

Um dia, quando eles falavam, começou um bombardeio pesado, Orest teve que desligar o telefone e ligou aos pais apenas uma semana depois. Eles perceberam tudo. Não ficaram felizes com a sua decisão, especialmente o pai, mas aceitaram a sua escolha.

Se expressando propositadamente em polaco/polonês, Orest explica que ama Ucrânia e muito: “este é um país digno pelo qual se deve lutar. Se não pararmos o inimigo aqui, este irá até Kharkiv, depois para Kyiv, Zhytomyr, Lviv. Ninguém quer disso, então precisamos estar aqui. E nós não entregaremos a nossa terra, não importa como os russos a desejarem. Nenhum de nos irá embora”.

Segundo Orest, os ucranianos são muito gentis e patrióticos: “estou impressionado com o seu núcleo interior. Por exemplo, meus irmãos de armas. Fosse o que fosse, não importa o fogo inimigo, eles só riem e não deixam as posições”.

Às vezes ele usa sua língua nativa: grita em polaco/polonês em direção das posições próximas do inimigo, às vezes fala em polaco/polonês na rádio. Ele se diverte com a crença cega do inimigo que pela Ucrânia lutam as “legiões da NATO/OTAN” [...]
Os comandantes da unidade, na qual o jovem serve, falam dele como um combatente corajoso, inteligente e responsável.

O seu contrato com as FAU termina em novembro de 2018, e Orest já tem planos claros para o futuro: “Após a desmobilização, quero me tornar um instrutor no campo de treino/treinamento de Yavoriv, para treinar jovens (quando um soldado de 21 anos diz a palavra “juventude”, isso provoca o sorriso do seu interlocutor). Espero que possa ensinar-lhes algo de útil. Do resto, à ver veremos”, – diz ele.

Em nenhum momento Orest lamentou de sua decisão de se mudar para a Ucrânia e lutar pelo país. Perdeu a nacionalidade polaca/polonesa, e nem se preocupa de saber se terá o direito de recupera-la.
Orest e Anastasia Fedchenko
Eu amo Ucrânia, – sorri o menino, – e viverei aqui”.

Blogueiroa história do Orest é muito interessante, principalmente, comparada com a dos brasileiros do grupo Lusvarghi, que vieram à Ucrânia de tão longe para “combater o imperialismo americano” ou para lutar “contra os banqueiros judeus”. Já Orest veio defender a terra dos seus antepassados, sabendo que se o inimigo não for parado na Donbas, certamente, tentará avançar mais, tal, como alias, eram os seus planos da primavera de 2014. Também é interessante a reação dos pais do Orest, como as pessoas normais, eles não ficaram felizes de ver o filho à entrar numa guerra. Posição que contrasta, e muito, com as famílias dos mercenários brasileiros, que dizem, sentir “orgulho” da escolha dos filhos, que sacrificaram a decência das suas vidas para sempre, viajando milhares de quilómetros, apenas para matar os ucranianos e destruir as infra-estruturas da Ucrânia ao troco de uma ideia absolutamente vaga de uma luta imaginária “antiamericana”, “anti-sionista” ou “antinazi”, algo que nem sequer existe na realidade das trincheiras do leste ucraniano...

terça-feira, agosto 28, 2018

«Adeus, amigo!» — a morte do senador John McCain

No dia 26 de agosto de 2018 morreu um dos mais brilhantes políticos americanos contemporâneos – o senador republicano John McCain, que raramente deixava indiferente o público, principalmente no espaço pós-soviético, devido as suas posições firmes e declarações vívidas. Nos últimos anos, McCain lutava contra o cancro/câncer, ficando combativo e ativo até aos últimos dias, mas a doença, ainda assim, o ceifou.
John e a sua mãe, Roberta McCain (106)
Em 2000 e 2008, John McCain poderia se tornar o presidente dos Estados Unidos – e quem sabe como seria o mundo e o espaço pós-soviético se ele conseguisse. Já antes de sua carreira política, John McCain era conhecido como piloto militar e POW dos Estados Unidos, que passou cinco anos e meio no desumano cativeiro norte-vietnamita.

Piloto McCain
McCain, com os companheiros, último à direita, 1965 | Wikipédia
John Sidney McCain III nasceu em 29 de agosto de 1936, na Zona do Canal do Panamá e numa família com raízes escocesas e irlandesas, cuja linhagem militar incluía um ancestral que serviu como ajudante do general George Washington durante a Guerra Revolucionária. O pai de McCain era um oficial da Marinha dos Estados Unidos e participou da II G. M. como um oficial de submarino que completou o serviço com a patente de Almirante de 4 estrelas e tornou-se em 1967 comandante da Marinha dos Estados Unidos na Europa.
John McCain, 1965 | Wikipédia
John decidiu seguir os passos de seu pai e, após a formatura, ingressou na Academia Naval de Annapolis, onde se graduou em 1958. Em 1958-1960, McCain continuava o treino de voo no caça-bombardeiro “Douglas A-1 “Skyraider” em várias bases aéreas nos Estados Unidos. Desde 1967 McCain participa na Guerra do Vietname – efetuando até o final de outubro do mesmo ano as 22 missões de combate.
John McCain numa cama de hospital em Hanói, no Vietname do Norte,
depois de ter sido feito prisioneiro de guerra, novembro de 1967 | foto: François Chalais
Em 26 de outubro de 1967 John McCain foi abatido sobre Hanói, catapultado (com duas pernas e um braço quebrado), preso e brutalmente espancado pelos norte-vietnamitas. Desde março de 1968, McCain foi mantido em confinamento solitário. Em julho de 1968, e para os fins da propaganda, ele recebeu a proposta para ser libertado – mas recusou a oferta, dizendo que será libertado apenas em conjunto com outros militares americanos que foram capturados antes.
O ex-oficial soviético que se gabou de abater (o mais provavelmente não foi) o “Skyraider”
do John McCain, moreu em 2009, dependente de álcool e na miséria financeira.
Em agosto de 1968, padecendo da disenteria, John McCain era espancado à cada duas horas, quebrando alguns costelas e novamente o braço, depois disso ele perdeu a capacidade de levantar as mãos acima de sua cabeça. McCain era forçado à entregar os nomes de companheiros do seu esquadrão – ele “concordou” e ditou aos norte-vietnamitas os nomes de jogadores da equipa do futebol americano “The Green Bay Packers”.
Os momentos da libertação do John McCain em 15/03/1973
John McCain foi libertado em 15 de março de 1973 – após cinco anos e meio em cativeiro. Desde 1982, McCain foi ativamente envolvido na vida política dos Estados Unidos – pela primeira vez ele foi eleito como membro do Congresso pelo Partido Republicano.

Combatente contra ditaduras e tiranos

Quase toda a sua carreira política, John McCain criticava fortemente os governantes autoritários de diferentes países – de Fidel Castro ao Saddam Hussein – causando o “arder dos cús” constante no campo dos bolcheviques. McCain defendeu o fortalecimento do potencial militar dos EUA, fortalecimento das suas forças armadas e implementação do sistema de defesa antimíssil como garantia de paz frente às ameaças potenciais.
Os senadores John McCain e Lindsey Graham
John McCain costumava criticar a Rússia putinista, considerando que no país chegaram ao poder os “golpistas rastejantes”, afirmando o seguinte: “o golpe rastejante contra as forças da democracia e do capitalismo de mercado na Rússia está ameaçando os fundamentos das relações EUA-Rússia e cria o espectro de uma nova era da “paz fria” entre Washington e Moscovo”.

Também é conhecida a sua frase: “Hoje estamos vemos a Rússia liderada por um grupo de ex-oficiais de inteligência. Eles estão tentando intimidar seus vizinhos democráticos, como a Geórgia, tentam jogar em dependência da Europa em relação ao petróleo e gás russo. É necessário reconsiderar a visão ocidental de Rússia revanchista. Para começar é necessário expandir o [grupo] G8 e incluir nele as principais democracias de mercado – Brasil e Índia, e também excluir a Rússia”.

Após a introdução, em 2014, de sanções contra o regime russo, John McCain repetidamente exigia o seu endurecimento e expansão, afirmando: “A Rússia é um posto de gasolina grande, que está disfarçado de um país. É uma cleptocracia, cuja corrupção, e economia dependem inteiramente de fornecimentos de petróleo e gás. Por isso, as sanções económicas são importantes”.

John McCain tem sublinhado repetidamente que critica não o povo russo, mas o seu poder putinista, é conhecida a sua citação sobre o assunto: “Os russos merecem mais do que Putin, o presidente Putin não acredita que a natureza humana, baseada na liberdade, pode ultrapassar as suas próprias fraquezas para construir uma sociedade justa, pacífica e próspera. Ou, ao menos, ele não acredita que isso pode ser feito pelos cidadãos da Rússia. Por isso ele governa usando essas fraquezas, com a ajuda de corrupção, repressão e violência. Ele governa para si, mas não para vocês”.

«Adeus, amigo!»

John McCain era conhecido como um amigo firme da Ucrânia, desde 2014, apoiando ativamente o país. McCain visitou Maydan e repetidamente – a linha de combates na OAT no leste da Ucrânia. Os ucranianos gostam muito do McCain, e o twitter ucraniano está cheio de postagens que dizerem “adeus, amigo e muito obrigado por tudo”.
John McCain, discursando na Maydan em Kyiv em dezembro de 2013
John McCain na Maydan em Kyiv em março de 2014
John McCain era um defensor do fornecimento de armas letais à Ucrânia, dizendo uma vez: “Vamos viver com eterna vergonha porque não providenciamos aos ucranianos as armas para se protegerem”.
Senador John McCain, presidente Petró Poroshenko e senador Lindsey Graham na linha da frente no leste da Ucrânia
Em março de 2014, McCain foi alvo das sanções do governo russo – proibido de entrar no território da federação russa. Ao que John McCain, de maneira irónica, respondeu: “Aparentemente, não vou poder passar as férias de primavera na Sibéria, minhas ações da Gazprom desapareceram e minha conta bancária secreta em Moscovo está congelada. Contudo, nunca deixarei de apoiar liberdade, independência e integridade territorial da Ucrânia”.

Fotos: arquivo | AFP | GettyImages | Texto: Maxim Mirovich  

Bónus

Abatido sobre Hanói em 26 de outubro de 1967, John McCain foi preso com fraturas na sua perna direita e em dois braços. Ele recebeu cuidados mínimos e foi mantido em péssimas condições, que descreve, vividamente num relatório especial. John McCain passou 5½ anos em cativeiro norte-vietnamita como POW. Seu relato em primeira pessoa desse calvário doloroso foi publicado no US News & World Report em 14 de maio de 1973.
Tenente Comandante McCain sendo entrevistado após seu retorno do Vietname, abril de 1973
Fotos: Wikipédia
Certa vez, eles [seus captores norte-vietnamitas] queriam que eu escrevesse uma mensagem para meus companheiros de prisão na [época do] Natal. Eu escrevi:

Aos meus amigos no campo, aos quais eu não tenho permissão para ver ou falar, espero que suas famílias estejam bem e felizes, e espero que vocês possam escrever e receber cartas de acordo com a Convenção de Genebra de 1949, o que não é permitido a vocês por nossos captores. E que Deus vós abençoe”.

Ler o texto completo em inglês.

domingo, agosto 26, 2018

RIP John McCain, “rebelde” do Senado e ex-POW que morreu aos 81 anos

O senador McCain numa pausa para um retrato durante sua turnê de campanha “Straight Talk Express” em Manchester, N.H., em 2007 (foto: Melina Mara / The Washington Post)
Morreu o senador norte-americano John S. McCain, um grande homem, grande político, um exemplo para todas as pessoas do mundo livre, um dos últimos republicanos. Descanse em paz Senador McCain, você merece, você fez um ótimo trabalho para a América e para o mundo, sentiremos a sua falta.

O senador norte-americano John S. McCain, filho e neto de almirantes de quatro estrelas, foi criado para o combate. Ele sofreu mais de cinco anos de prisão e tortura norte-vietnamita como um jovem oficial da marinha e foi combater os inimigos à esquerda e à direita em Washington, guiado por um código de honra que o definiu e assombrou.

por: Karen Tumulty, The Washington Post (versão curta)

O senador McCain, de 81 anos, morreu em 25 de agosto em seu rancho perto de Sedona, Arizona, informou seu escritório em um comunicado. O senador foi diagnosticado em julho passado com um tumor no cérebro, e sua família anunciou esta semana que ele estava descontinuando o tratamento médico.
O senador John McCain (Arizona), o candidato republicano à presidência em 2008, cumprimenta os partidários em uma manifestação em Prescott, Arizona, na véspera da eleição geral. (foto: Melina Mara / The Washington Post)
Durante três décadas representando o Arizona no Senado, ele concorreu duas vezes sem sucesso para a presidência. Ele perdeu uma amarga campanha primária para George W. Bush e o establishment republicano em 2000. Então ele voltou a ganhar a indicação em 2008, apenas para ser derrotado nas eleições gerais por Barack Obama, [que parecia] um carismático democrata de Illinois que havia servido menos de um termo como senador.

Um homem que parecia ser o seu verdadeiro eu quando indignado, o senador McCain revelou-se um combatente contra a ortodoxia. A palavra “maverick” (rebelde, dissidente) praticamente se tornou parte de seu nome.

O senador McCain atacou regularmente os cânones de seu partido. Ele concorreu contra o Grande Partido Republicano (GOP) defendendo a reforma das finanças de campanha, liberalização das leis de imigração e proibição do uso pela CIA de “técnicas avançadas de interrogatório” – amplamente condenadas como tortura – contra suspeitos de terrorismo.

Para vencer sua mais recente batalha de reeleição em 2016, para um sexto mandato, ele se posicionou como um republicano mais convencional, perturbando muitos de seus fãs políticos. Mas na época do presidente Trump, ele voltou a ser um rebelde.

Os termos de engajamento entre os dois foram definidos logo depois que Trump se tornou candidato à presidência e o senador McCain comentou que o magnata do imobiliário tinha “incendiado os loucos”. Em uma manifestação em julho de 2015, Trump – que evitou o alistamento ao Vietname por cinco vezes – falou desdenhosamente da boa-fé militar do senador McCain: “Ele foi um herói de guerra porque foi capturado. Eu gosto de pessoas que não foram capturadas”.

Uma vez que Trump estava no cargo, o senador McCain estava entre seus críticos republicanos mais veementes, dizendo que o presidente havia enfraquecido a posição dos Estados Unidos no mundo. Ele também alertou que a investigação sobre os laços de Trump com a Rússia estava “chegando ao ponto em que é do tamanho e da escala do Watergate”.

Em ambas as suas corridas presidenciais, o senador McCain chamou o seu autocarro/ônibus de campanha de “Straight Talk Express” (Expresso do Discurso Direto / do Papo Reto). Para deleite dos repórteres que viajaram com ele em 2000, ele estava acessível e sem filtros, um conflituoso desfavorecido que se deleitava em perturbar a ordem republicana. [...]

Uma família militar

John Sidney McCain III nasceu em 29 de agosto de 1936, na Zona do Canal do Panamá e em uma família cuja linhagem militar incluía um ancestral que serviu como ajudante do general George Washington durante a Guerra Revolucionária.

Ele recebeu o nome do primeiro pai e filho da história da Marinha que se tornaram os almirantes completos: John S. “Slew” McCain Sr., um dos principais comandantes do teatro de guerra do Pacífico na Segunda Guerra Mundial, e John S. McCain Jr., comandante de todas as forças armadas no Pacífico durante a Guerra do Vietname. [...]

Cativeiro brutal

Em 26 de outubro de 1967, o senador McCain estava em sua 23ª missão e seu primeiro ataque à capital inimiga, Hanói. Ele mergulhou seu A-4 em uma fábrica/usina termelétrica perto de um lago no centro da cidade.

Quando ele lançou suas bombas no alvo, um míssil soviético do tamanho de um poste de telefone explodiu sua ala direita. O tenente-comandante puxou a alavanca do assento de ejeção e foi deixado inconsciente pela força quando foi arremessado do avião. Ele recuperou a consciência quando chegou ao lago, onde uma multidão de vietnamitas se reuniu.

Com os dois braços e o joelho direito quebrado, ele foi arrastado do lago, espancado com uma coronha de fuzil e ferido no pé com uma baioneta. Então o senador McCain foi levado para a prisão construída pela França que os prisioneiros de guerra americanos haviam chamado de “Hanoi Hilton”. Assim, começaram cinco anos e meio de tortura e prisão, quase metade deles em confinamento solitário. Durante esse tempo, seu único meio de se comunicar com outros prisioneiros era através de batidas do alfabeto pelas paredes [...].
Cossacos voadores: ucranianos no Vietname: ler mais

Em março de 1973, quase dois meses após a assinatura dos acordos de paz de Paris, o senador McCain e os outros prisioneiros foram libertados em quatro etapas, na ordem em que foram capturados. Ele tinha 36 anos e era bastante emaciado.
Algimantas Reivytis: lituano na guerra do Vietname: ler mais
Jovem John McCain e presidente Richard Nixon, 1973, foto: Pinterest
Os efeitos de ferimentos sofridos permaneceram pelo resto de sua vida: o senador McCain não conseguia erguer os braços o suficiente para pentear os cabelos prematuramente grisalhos, só podia tirar o paletó e andar com as pernas rígidas.

Ler o obituário completo em inglês.

Memorial das vítimas do comunismo foi inaugurado em Tallinn na Estónia

Em 23 de agosto, em Tallinn, na colina de Maarjamäe, foi oficialmente inaugurado o memorial das Vítimas do Comunismo na Estónia de 1940-1991. No local são gravados os nomes dos 22.000 estónios, vítimas da primeira onda da ocupação e das repressões do regime soviético.
O regime do terror comunista foi estabelecido no país com a ocupação da Estónia pelas tropas soviéticas em 17 de junho de 1940 e terminou com a restauração da independência do país em 20 de agosto de 1991. Como consequência da política soviética de ocupação, Estónia perdeu um em cada cinco cidadãos, que viviam no país até 1940, no total mais de um milhão de pessoas, dos quais mais de 75.000 foram assassinadas, presas ou deportadas. A grande maioria deles descansa em sepulturas anónimas. Em memória de todas as vítimas do comunismo na Estónia, o povo e o Estado estónios criaram este memorial, inaugurado em agosto de 2018.
A presidente da Estónia Kersti Kaljulaid
Toda a ideologia totalitária é a inimiga de liberdade já pela sua própria natureza, e nós sabemos o seu alto preço pela nossa própria experiência histórica”, disse a presidente da Estónia Kersti Kaljulaid no discurso de abertura do memorial.
O Memorial, chamado Eesti kommunismiohvrid (https://www.memoriaal.ee/en) têm duas partes – a “Viagem”, um corredor, formado por duas altas paredes, com as placas que indicam os nomes das vítimas, que na sua maioria morreram longe da Estónia, e cujo local de enterro é praticamente desconhecido. O corredor simboliza o carinho humano e a hostilidade do regime totalitário. O “Jardim da Casa” simbólico possui vários textos informativos e pedras de localização, marcando os locais do terror. A paz e segurança simbolizam as macieiras no Parque Memorial e as abelhas na parede lateral do memorial. Um monumento aos oficiais militares estónios que foram vítimas do terror comunista também faz parte do Memorial.
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Os cidadãos da Estónia encaram os dois regimes de ocupação, soviética e nazi, de mesma forma. Embora, naturalmente existem diferenças temporais, devidas, sobretudo, à duração da ocupação da Estónia por estes dois regimes. A ocupação soviética durou 51 anos (1940-1991) e a ocupação nazi apenas 3 (1941-1944).  
Como tal, na Estónia também existem os monumentos em memória das vítimas do nazismo, como os memoriais de vítimas do Holocausto, também foram preservados os monumentos aos militares soviéticos que morreram durante a re-ocupação da Estónia em 1944.
A primeira pedra do memorial em Maarjamäe foi lançada em 4 de maio de 2018 e a data de inauguração no dia 23 de agosto simboliza a memória do tristemente conhecido pacto Molotov-Ribbentrop, assinado pela Alemanha nazi e URSS comunista em 1939, que dividiu a Europa entre as zonas de influência nazi e soviética, traçando, e marcando para sempre, o destino de milhões de pessoas na Polónia, Ucrânia, Belarus, Moldova e Países Bálticos.
Konstantin Päts (1874-1956), Presidente da Estónia (24/04/1938 — 21/06/1940);
morreu no hospital psiquiátrico russo, acusado de (entre outras coisas):
“Reivindicação persistente de ser o presidente da Estónia”...
Konstantin Päts (1874-1956), foto tirada na cadeia de NKVD em 1941.
Todas as fotos do memorial @AronUrb