Os sistemas Visa
e MasterCard cessaram a prestação dos seus serviços na Crimeia. As empresas
explicam que a decisão foi tomada devido a introdução das sanções económicas, impostas
pelos Estados Unidos em 2014.
A
política ocidental em relação a Crimeia sempre foi absolutamente clara: tornar a
ocupação da Crimeia extremamente cara para Kremlin, e não apenas em termos de gastos
diretos com o território ocupado, mas também em forma de perdas e prejuízos
indirectos. Ocidente pode esperar um ano ou dez, isso não importa. A tarefa é recuperar
o antigo status quo do território, com a transferência de todas as perdas ao
passivo russo. Aproximadamente assim aconteceu no Iraque – país está pagar pela
sua libertação do regime anterior, tal como Líbia, viu confiscadas quase todas
as suas participações fora do país. A Rússia, neste sentido, não difere em nada.
A
ocupação e anexação da Crimeia criou uma série de contradições pesadíssimas. A
decisão acabou com a ordem anterior no espaço pós-soviético, destruiu o sistema
existente de confiança e segurança, eliminou de vez o único projeto estratégico
da Rússia – o projeto da União Aduaneira Euro-asiática. Em troca da anexação
Rússia ganhou uma mão cheia de nada. O seu fracasso no espaço pós-soviético
tornou-se um fator extremamente ameaçador para a estabilidade da própria
Rússia, com consequências negativas a médio e longo prazos. As sanções ocidentais,
em comparação com esta ameaça e este problema são, por enquanto, a mera
ninharia.
O
colapso da URSS – um evento potencialmente extremamente conflituoso, manteve-se
dentro de limites aceitáveis, impedindo a repetição do cenário jugoslavo. Em
grande parte devido ao uso da fórmula para o consentimento de todas as partes
interessadas: as fronteiras administrativas das antigas repúblicas soviéticas no
momento do colapso da URSS foram reconhecidas como as fronteiras dos novos estados
independentes. Em termos gerais, não foram disputados os “direitos históricos”
sobre essa ou aquela parcela dos seus territórios, adquiridos ou perdidos após a
II G.M. Por isso, e até 2008, este princípio foi razoavelmente observado –
nenhuma região autoproclamada era reconhecida como independente (Alto Karabakh,
Transnístria ou Chechénia), cada conflito regional era encarado (em termos de princípios
gerais) como questão puramente interna de cada respectivo estado.
Em
2008 decorreu a guerra russo-georgiana, um evento em si extraordinário, mas com
as consequências muito mais grave após o reconhecimento da Rússia das “independências”
da Abecásia e da Ossétia do Sul, destruindo, de vez, os princípios do
equilíbrio de todo o espaço pós-soviético. Uma decisão absolutamente desastrosa
do ponto de vista das consequências ao médio e longo prazos. A partir deste
momento no espaço pós-soviético foi criado o precedente de mudar as fronteiras
de um Estado de ex-URSS sem o seu próprio consentimento.
A
ocupação e anexação da Crimeia pela Rússia, mais uma vez e ainda mais minou os
princípios da organização do espaço pós-soviético, em consonância com a
situação na Abecásia e na Ossétia do Sul. Ou seja, a liderança russa
enfraqueceu ainda mais toda a estrutura pós-soviética da organização do espaço
da ex-URSS, o que, é claro, afetou negativamente todo o sistema de segurança
desse espaço.
Além
disso, a ocupação e anexação da Crimeia pela Rússia mudou a situação
estratégica em toda a região. A mudança nas fronteiras da Rússia e da Ucrânia
inevitavelmente afetou os interesses de todos os países da bacia do Mar Negro, tendo
em conta que a maioria dos países pertencem à União Europeia e ao NATO/OTAN. De
facto, anexando a Crimeia, Kremlin fez um claro gesto ameaçador contra o bloco
político-militar e o principal parceiro económico da Rússia. É lógico que tanto
a NATO/OTAN, como a UE tenham reagido de uma forma hostil e, tomem todas as
medidas possíveis para eliminar essa nova ameaça à sua própria segurança.
A
ocupação e anexação da Crimeia, forçou todos os países vizinhos da Rússia
considerar a situação como inaceitável. Os países que surgiram após o colapso da
ex-União Soviética receberam um sinal inequívoco de que seus territórios podem
ser anexados pela Rússia. A segurança do espaço pós-soviético foi seriamente minada,
e é absurdo esperar que mesmo últimos aliados russos, Belarus ou Cazaquistão, possam
reconhecer a anexação da Crimeia, uma vez que eles percebem que muito
facilmente podem ser próximos. Sem falar de todos os outros países da região que
também avaliaram a decisão russa de forma extremamente negativa, uma vez que,
pela primeira vez desde o fim da II G. M., houve uma mudança violenta das
fronteiras de um dos países europeus.
Os
fãs da Rússia podem, como é habitual, apontar os dedos aos EUA, usando argumento
de que “os americano fazem isso e muito
mais”. Mas “os americano” sempre foram
criando as alianças estratégicas com os seus aliados, além disso, os EUA são o praticamente
único emissor de uma moeda mundialmente aceite, como tal, o país tem a possibilidade
de transferir uma parte dos seus problemas económicos ao resto do mundo. As
perdas, decorrentes das aventuras de Putin são e serão pagas exclusivamente pela Rússia e pelos
cidadãos russos.
A
recusa da Visa e do MasterCard de trabalhar na Crimeia é apenas um pequeno
pedaço de um quebra-cabeça comum, que é discretamente arrumado pelo Ocidente. A
liderança não muito brilhante do Kremlin não faz a mínima ideia da aparência
futura deste mesmo quebra-cabeças. Nem está por aí para perceber ameaça, para
isso precisaria de um mínimo de inteligência. E onde é que os ex-tenentes do
KGB, rodeados pelos moços das periferia
teriam o tal luxo?
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