Em
resultado da vitória do movimento Maydan (2013-2014) e de descomunização
posterior, Ucrânia desmontou praticamente todos os monumentos ao líder
bolchevique Vladimir Ulianov (nom de guerre Lenine). Uma figura histórica terrível
e sinistra para com Ucrânia e os ucranianos.
Foi
Lenine quem, de facto, ordenou a ocupação e destruição da independente República
Popular da Ucrânia (UNR) e do estabelecimento da Ucrânia Soviética, criada,
armada e dirigida pela Rússia Soviética; foi Lenine que instigou o início de
onda das repressões políticas na Ucrânia, que levaram à primeira fome em
grandes proporções de 1921-23, que se transformou em Holodomor de 1932-1933.
Foi Lenine quem começou a deportar da Ucrânia a população trabalhadora e ativa –
chamando-a de kulaks/kurkuls e de “sanguessugas”, a declarando inimiga do
regime soviético.
O
que Lenine dizia sobre Ucrânia
Se
deve admitir, Lenine, em um certo sentido, era um homem honesto e direto, ele
não se apegava aos mitos de “povos irmãos” ou “mundo eslavo unido”, ele dizia
claramente: temos de conquistar Ucrânia, a fim de se apropriar do pão [trigo] e
recrutar de lá soldados ao exército vermelho. Aqui está o que Lenine disse na
conferência de trabalhadores ferroviários em 1919, o discurso publicado no 38º volume
de suas obras completas:
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Discurso na conferência de trabalhadores ferroviários, 38º volume das obras completas do Lenine (em russo) |
«Agora,
com a conquista da Ucrânia e com o fortalecimento do poder soviético na [região]
de Don, a nossa força está se fortalecendo. Agora estamos dizendo que temos as
fontes de pão [trigo] e alimentos, temos a oportunidade de receber combustível
da bacia de Donetsk. Estamos confiantes de que, apesar de chegarem os meses
mais difíceis, quando a crise alimentar se agravou, quando o nosso [sistema] de
transporte está desgastado e destruído, nos, no entanto, sobrevivemos essa crise.
Na Ucrânia há estoques enormes, excedentes de pão [trigo], é difícil os tomar
imediatamente – lá ainda existe a insurgência.
Nos
devemos mover para a Ucrânia não menos de três mil trabalhadores ferroviários,
parte dos camponeses da Rússia faminta. O governo ucraniano [governo fantoche
da Ucrânia soviética] já aprovou um decreto sobre a expropriação exata de pão [trigo]
que agora pode ser levado em quantidade de 100 milhões de poods” (cerca de 1.638
milhões de kg).
Lenine
não mentiu – de facto, após a ocupação da Ucrânia e da expropriação forçada de trigo
e da leva de recrutas, o poder soviético ficou mais fortalecido, deixando na
Ucrânia as aldeias devastadas pela fome e pela guerra.
O
que Lenine criou na Ucrânia
Em
1917 na Ucrânia já existia a UNR independentemente, que possuía a Rada Central,
o parlamento estatal, situado em Kyiv. Em contrapartida, os bolcheviques, sob a
liderança, apoio e financiamento da Rússia soviética, criaram em Kharkiv o “governo”
da Ucrânia Soviética e usando os meios militares (à Ucrânia foram enviadas numerosas
tropas russas), os bolcheviques tomaram à força o poder da Ucrânia.
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Os trabalhadores da fábrica de locomotivas de Kharkiv junto ao sino de prata, expropriado da Catedral de Kharkiv na campanha da expropriação dos valores da igreja, 21 de maio de 1922 |
Imediatamente
após a ocupação da Ucrânia, Lenine, como um homem honesto, honrou a sua
promessa – organizando a coletivização e expropriação de trigo da Ucrânia, provocando
a fome de 1921-23 anos – em maio de 1921 na Ucrânia passavam a fome cerca de 10
milhões de pessoas, quase metade da sua população – entre 1,5 à 3 milhões de
pessoas, morreram em resultado dessa fome. Além da expropriação de trigo, os bolcheviques
leninistas também devastaram as igrejas ucranianas, da onde, sob o disfarce de luta
“anti-religiosa” expropriavam os ícones, ouro, outros valores históricos – que depois
eram vendidos no Ocidente, e o dinheiro era novamente usado para a guerra contra
ucranianos e contra outras nações do império soviético.
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Crianças inchadas pela fome. Foi publicada pela primeira vez no jornal socialista de Lviv "Zemlia i Volia" (Terra e Liberdade). Em 28 de junho de 1922 re-publicado no "Ucraniano Canadense". |
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Crianças inchadas pela fome. Foi publicada pela primeira vez no jornal socialista de Lviv "Terra e Liberdade". Em 28 de junho de 1922 re-publicado no "Ucraniano Canadense". |
Foi
Lenine que começou a deportar da Ucrânia a sua população mais activa, que foi chamada
de kulaks (em russo) ou kurkuls (em ucraniano) – os camponeses mais capazes e
mais trabalhadores, na melhor das hipóteses eles tiveram o direito de levar
consigo apenas uma carroça (por família) de coisas pessoais, deportados para a
Sibéria ou para Cazaquistão. Na Rússia atual além dos montes Urais e mais à Leste
– cada segundo ou cada terceiro russo possui as raízes ucranianas, os seus
antepassados vieram da Ucrânia à estas regiões inóspitas não pela vontade própria...
Na
década de 1930, a política do Lenine foi continuada na Ucrânia por Estaline –
organizando o Holodomor de 1932-33 e continuando a deportação dos ucranianos
para os campos de concentração soviéticos (sistema GULAG) – os acusando de
serem os “inimigos do povo”.
O
que do Lenine sobrou na Ucrânia
No
decorrer da Maydan de 2013-2014 e da descomunização que se seguiu, Ucrânia se
livrou quase completamente de todos os vestígios do Lenine – desde 2015, quando
a lei de descomunização foi aprovada, o país mudou os nomes de 987 localidades
(geralmente devolvendo os seus nomes históricos) e mudou 52.000 outros topónimos.
Também foram desmontados cerca de 1.500 monumentos do Lenine, que generosamente
foram construídos na era soviética – Ucrânia até recentemente era o 1º país do
mundo em número de monumentos do líder bolchevique.
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A fome na URSS em 1921-1923 e ajuda alimentar anglo-americana |
[Como
testemunham os documentos de arquivo, por exemplo, os cartões semelhantes ao da
fotografia em cima, em 1921-1923 os moradores da Ucrânia Soviética recebiam a ajuda alimentar
americana. Bastava preencher o cartão emitido pela ARA em inglês e russo,
colocando nele a sua identificação e o endereço. O cartão na imagem foi
preenchido pelo cidadão ucraniano de origem judaica, Kalman-Wolf Hatskelev
Minkes, morador da cidade de Odessa. Não se conhece a sua vida posterior. Não
se sabe se ele consegiu escapar a fúria soviética de luta contra os “espiões
ocidentais”. Nem tão pouco se sobreviveu a “solução final” nazi...]
A
lei de descomunização proibiu na Ucrânia completamente o partido comunista e os
seus símbolos, abriu totalmente os arquivos da KGB, e agora qualquer cidadão pode
descobrir o que realmente foram o poder soviético, o que o bolchevismo e Lenine
representavam para os ucranianos.
Foto:
GettyImages | archives.gov.ua | istpravda.com.ua | Texto: Maxim Mirovich e [Ucrânia em África]
Bónus
Entre
1931 à 1944 existiu na Belarus soviética o kolkhoz “Krasnie Podonki” (Escumalha
Vermelha), certamente um topónimo que tinha todo o direito de permanecer em
memória coletiva do povo...
A
cidade russa de Lensk, onde as vespas locais construíram uma casa diretamente
no cú / na bunda de Lenine.
E mais alguns...
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