sábado, dezembro 22, 2018

Testemunhos da barbárie comunista: os escritores que relataram o inferno do GULAG

Ao longo do século XX, milhões de pessoas foram presas e deportadas para campos de concentração na União Soviética. Entre eles estavam muitos artistas e escritores, vários dos quais partilharam a sua experiência em obras que vieram para a posteridade. A censura que sofreram, por parte da esquerda europeia, impediu muitos deles de ver as suas obras publicadas.

Gustaw Herling-Grudziński (Kielce, 20 de maio de 1919 – Nápoles, 4 de julho de 2000) é escritor, ensaísta, jornalista, crítico literário e sobrevivente do GULAG. Foi o primeiro intelectual ocidental a denunciar a existência do GULAG soviético.
Foi libertado do GULAG em janeiro de 1942 para se juntar ao exército polaco do general Anders em março do mesmo ano. Participou, com o Segundo Corpo Polaco/Polonês na Campanha da Itália, nomeadamente na batalha de Monte Casino.
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Em 1951, a editora londrina Heinemann publicou o seu livro “Um Mundo à Parte” em inglês, com prólogo de Bertrand Russell. Foi um dos primeiros testemunhos de horror do GULAG soviético, se tornando o objeto de uma autêntica caça às bruxas pela esquerda europeia, que negava a existência dos campos de concentração na URSS. Na França, nenhum editor teve a coragem de publicá-lo, apesar de os direitos foram adquiridos várias vezes e que próprio Albert Camus recomendou o livro a várias editoras, o livro demorasse mais de trinta anos para ser publicado em francês. Em 1990, livro foi publicado na URSS e na Polónia, onde por décadas liderou o índice de livros banidos pelo regime comunista (fonte).

Pavel Floresnky (Azerbaijão,  Yevlakh, 22 de janeiro de 1882 – GULAG, † 8 de dezembro de 1937), pensador e cientista russo, reconhecido pelo seu poliédrico interesse no campo do conhecimento, foi um dos defensores da necessidade de um pensamento capaz de aproximar e descrever o real em sua multiforme complexidade. O eloquente e convincente testemunho deste pensamento é a sua copiosa e ampla produção filosófico-teológica e científica. 
Em 1933, quando regime soviético decidiu levar Florensky para a prisão em GULAG, as cartas escritas aos familiares tornaram-se ocasião para que ele pudesse refletir pela última vez sobre aquelas intuições originais que estavam na base do seu projeto sobre o “pensamento integral” (fonte).
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Mais tarde, as suas cartas foram publicadas em espanhol sob o título “Cartas de la Prisión y de los Campos” (ler mais sobre o autor em português).

Karlo Štajner (15 de janeiro de 1902 – 1 de março de 1992) foi um ativista comunista austro-jugoslavo e um proeminente sobrevivente do GULAG. Štajner nasceu em Viena, onde ingressou na Juventude Comunista da Áustria, mas emigrou para o Reino dos Sérvios, Croatas e Eslovenos em 1922 sob a ordem da Juventude Internacional Comunista para ajudar ao recém-criado Partido Comunista da Jugoslávia. 
Karlo Štajner em 1988 | Wikipédia
Em 1932 se estabeleceu na União Soviética, onde trabalhou na editora Comintern em Moscovo. Durante o Grande Terror em 1936, Štajner foi preso e passou os 17 anos seguintes em prisões e campos de concentração, e mais três anos no exílio na Sibéria. Ele foi libertado em 1956 e após ser reabilitado voltou para a Jugoslávia. Passou o resto de sua vida em Zagreb com sua esposa Sonya, com quem se casou em Moscovo na década de 1930.

Em 1971, Štajner publicou um livro intitulado “Sete Mil Dias na Sibéria” sobre suas experiências. O livro foi um best-seller na Jugoslávia e foi nomeado o “livro do ano de 1972” pelo jornal Vjesnik.

Ante Ciliga (20 de fevereiro de 1898 – 21 de outubro de 1992) foi um político, escritor e editor croata, um dos fundadores do Partido Comunista da Jugoslávia (KPJ).
Ante Ciliga | foto: cartoliste
Em 1930, Ciliga ensinou na Universidade Comunista de Leninegrado. Preso pela OGPU, acusado de trotskismo, foi enviado para um campo de GULAG na Sibéria. Pelo resto de sua vida, Ciliga viveu na França e na Itália. Já expulso do Partido Comunista Jugoslavo em 1929, ele mais tarde renunciou à sua posição. Devido à sua cidadania italiana conseguiu sair da URSS em 1935.
Em 1936-1937 em Paris, ele escreveu o livro “No país da Grande Mentira”. Livro foi publicado em 1938. É uma história sobre a sua permanência na URSS e uma análise política do regime comunista, que Ciliga definiu como “capitalismo de estado”. Em seguida, este trabalho foi complementado, a sua versão final foi intitulada “Dez anos no país da Grande Mentira” (En el país de la mentira desconcertante). 
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Em agosto de 1941, ele completou o segundo volume de suas memórias “Sibéria. Terra da deportação e de industrialização” (“The Russian Enigma”).

Vasily Grossman (Berdichiv, Ucrânia, 12 de dezembro de 1905 – Moscovo, 14 de setembro de 1964), foi um proeminente escritor e jornalista soviético, de origem judaica-ucraniana.
Embora Grossman nunca tenha sido preso pelas autoridades soviéticas, suas duas obras-primas (“Vida e Destino” e “Tudo Passa”) foram censuradas na URSS como obras anti-soviéticas. O principal ideólogo da URSS, Mikhail Suslov disse ao Grossman que o seu livro “Vida e Destino” não poderia ser publicado em duzentos ou trezentos anos. 
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No livro “Tudo Passa” o autor descreve a vida Ivan Grigórievitch, um sobrevivente do GULAG, que passou nos campos de concentração sovieticos os últimos trinta anos da sua vida. Posto em liberdade após a morte de Estaline, descobre que os anos de terror impuseram uma escravidão moral coletiva... Quando Grossman morreu em 1964, as suas obras permaneceram inéditas. Foram publicadas na União Soviética apenas após a proclamação das reformas Mikhail Gorbachev. A Vida e Destino rapidamente alcançou enorme sucesso e chegou a ser saudado como uma das maiores obras literárias do século XX.

Victor Serge (pseudónimo do Victor Kibalchich), (Bruxelas, 1890 – México DF, 1947), foi um anarquista, político, escritor, desde 1919 funcionário do Comintern como jornalista, editor e tradutor. Crítico aberto do estalinismo, obrigado a abandonar a União Soviética fugindo à repressão, faleceu no exílio mexicano.
Victor Serge | Wikipédia
Em 1928, Serge é expulso do Partido Comunista e inabilitado para trabalhar para o Governo. Nos anos seguintes, escreve O ano I da Revolução Russa (1930 – existe tradução brasileira, da Editora Ensaio) e dois romances: Homens em Prisão (1930) e O nascimento do nosso poder (1931), além de traduzir para francês as Memórias de Vera Figner. Todas essas obras são banidas da União Soviética e publicadas na França e Espanha.
Victor Serge no GULAG
Serge é detido e levado a prisão em 1933. A maior parte da Oposição de Esquerda acabou por ser executada, mas Serge conseguiu abandonar o país graças às pressões e protestos de sectores políticos em França, Bélgica e Espanha.

No seu conto “O longo crepúsculo” ele conta a história de um professor soviético, detido pelo NKVD e acusado de ser contra-revolucionário devido à um comentário seu sobre a revolução francesa.

Varlam Shalamov (Vologda, Rússia, 18 de junho de 1907 — Tushino, URSS, 17 de janeiro de 1982) foi um escritor, jornalista, poeta, dissidente e prisioneiro político, sobrevivente do GULAG soviético.
Varlam Shalamov na cadeia de NKVD | Wikipédia
Shalamov passou dezoito anos preso nos campos de concentração soviéticos, cumprindo três condenações quase consecutivas por “atividades contra-revolucionárias”. Em 1956 foi reabilitado e retoma a sua atividade literária em Moscovo. 
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Em conjunto com a obra de Soljenítsin, a sua obra Contos de Kolimá é um dos melhores retratos da vida nos campos de concentração soviéticos, principalmente na Sibéria, em condições desumanas, com temperaturas baixíssimas que, como relata, “era tão frio que não era possível pensar em nada”.

Aleksandr Tvardovsky (08/21 de junho de 1910 – 18 de dezembro de 1971) foi poeta e escritor soviético, editor-chefe da revista literária (de cariz liberal) Novy Mir (Novo Mundo) de 1950 à 1954 e de 1958 à 1970.
Tvardovsky publicou o romance de Alexander Soljenítsin “Um dia da Vida do Ivan Denissovich”, verso de Leonid Kiselev, dirigido contra a política agressiva dos czares russos na Ucrânia (“Os Czares”), obra do Ivan Dziuba, já banida na Ucrânia Soviética. Tvardovsky se tornou um dos “desviados” da linha do partido comunista, principalmente após a publicação no Ocidente do seu poema “Por direito de memória (1968), e no início de 1970  foi removido do cargo de editor-chefe da revista.

Oleg Sentsov (Simferopol, Crimeia, 13 de Julho de 1976). Após a ocupação e anexação da península da Crimeia pela Rússia, o cineasta ucraniano Oleg Sentsov foi preso, condenado e colocado numa prisão russa no Ártico sob acusações de “terrorismo” que foram denunciadas como amplamente exageradas ou fabricadas por motivos políticos.
A 12 de Dezembro de 2018 Oleg Sentsov recebeu (do Parlamento Europeu) o Prémio Andrey Sakharov para a Liberdade de Pensamento, em reconhecimento e solidariedade para com a sua luta. Na ocasião o Parlamento Europeu apelou à libertação imediata de Oleg Sentsov, descrevendo-o como um símbolo da luta pela libertação de todos os prisioneiros políticos na Rússia.

Ler original em espanhol

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