segunda-feira, dezembro 17, 2018

Liubov Abrvitova: “Temos muito para cooperar com Moçambique”

A entrevista da Encarregada de Negócios da Ucrânia na República da África do Sul, Sua Excia. Sra. Liubov Abravitova, concedida ao semanário independente moçambicano “Savana”, № 1301, de 14 de dezembro de 2018.
1.      Como é que avalia a cooperação entre Moçambique e Ucrânia? 
As relações ucraniano-moçambicanas são tradicionalmente amigáveis. As relações diplomáticas foram estabelecidas em 19 de agosto de 1993 – então, neste ano, celebramos o 25º aniversário de seu estabelecimento. Ao mesmo tempo, as nossas relações têm uma longa história desde o estabelecimento de relações diplomáticas entre a URSS e Moçambique em 1977. Muitos estudantes moçambicanos estudaram nas universidades ucranianas, embora neste momento o seu número é bastante menor. Ambos os países têm grande potencial para desenvolver cooperação mutuamente benéfica em vários domínios.

2.      Em que áreas os dois países cooperam?
Ucrânia e Moçambique estão apenas começando a definir as prioridades da cooperação bilateral. E, como podem imaginar, para iniciar qualquer diálogo sectorial é necessária uma base contratual e jurídica adequada. Actualmente, as partes estão a desenvolver acordos bilaterais de cooperação no domínio do comércio, economia e de investimentos, cooperação nas áreas da educação e do turismo. Está sendo trabalhada a questão da assinatura do Acordo na área da defesa. Na verdade essas são as áreas promissoras para os dois países nas áreas de cooperação.
Sua Excia. Sra. Liubov Abravitova em Maputo
3.      Que sectores da economia moçambicana interessam à Ucrânia e o que é Moçambique pode ganhar da Ucrânia?
Acreditamos que o estado actual da cooperação comercial e económica entre a Ucrânia e Moçambique não revela plenamente o potencial do nosso relacionamento. Tanto Ucrânia, como Moçambique, devem envidar esforços para os elevar a um nível superior. Entre as áreas promissoras e mutuamente benéficas de cooperação podemos destacar a agricultura (incluindo o incremento de fornecimento de grãos e outras mercadorias ucranianas), indústria alimentar (fornecimento de carne, aves e seus derivados, bebidas, biscoitos, massas, cereais, etc.), sector energético (no contexto do desenvolvimento do sector de petróleo e gás de Moçambique), bem como a construção naval.

4.      Há condições para os dois países elevarem a cooperação para outros patamares?
Ucrânia é favorável ao reforço da cooperação com Moçambique. Nesse contexto, acreditamos que a conclusão de acordos intergovernamentais da cooperação comercial e económica, bem como a promoção e protecção mútua de investimentos, poderiam fornecer um ímpeto adicional real à intensificação da cooperação entre os dois Estados. Anteprojectos destes acordos estão actualmente a ser considerados pela parte moçambicana.

5.      Quantos ucranianos residem em Moçambique?
Posso dizer o número exacto dos cidadãos ucranianos que vivem em Moçambique e que possuem o registo consular na Embaixada da Ucrânia na África do Sul, que neste momento é responsável por Moçambique, são 10 pessoas. Ao mesmo tempo, sabemos que o número real de nossos cidadãos aqui é muito maior, ligeiramente acima de 100 pessoas.
Um dos momentos de encontro da Liubov Abravitova com a comunidade ucraniana residente em Maputo
6.      A presença de uma comunidade ucraniana em Moçambique é um elemento facilitador da cooperação entre os dois países?
Sem dúvidas. Eles são um canal importante para manter o nosso relacionamento. Através da comunidade ucraniana residente em Moçambique os moçambicanos conhecem a nossa rica cultura, tradições e arte. Além disso, um elemento importante no aprofundamento das nossas relações foi o lançamento, em 2017, do Consulado Honorário da Ucrânia em Maputo, liderado pelo Dr. Abílio L. Soeiro. Actualmente, com o seu apoio, existe um diálogo entre os nossos estados sobre o lançamento da Câmara de Comércio e Indústria Ucrânia-Moçambique, que nos permitirá identificar as prioridades específicas da cooperação comercial e económica e traduzi-la em termos práticos.

7.      Há condições para os dois países elevarem a cooperação para patamares mais elevados?
Tais condições existem sempre e sob todas as condições e circunstâncias. Ucrânia está expandindo a sua cooperação com os países africanos, existindo vários níveis de interacção. O primeiro, na minha opinião, deveria ser o desenvolvimento da cooperação no âmbito de organizações internacionais, o diálogo político regular e o apoio mútuo no âmbito de fóruns internacionais. Isto, por norma, dá um ímpeto a todas as áreas de cooperação, nas quais as partes estão interessadas.

8.      O facto de Moçambique manter uma cooperação já antiga com a Rússia não é uma entrave na cooperação entre Moçambique e a Ucrânia, tendo em conta o conflito entre a Rússia e Ucrânia?
Moçambique mantém a cooperação de longa data com a Rússia, mas essa tem a mesmíssima duração em relação à Ucrânia, dado que essas relações foram estabelecidas desde a União Soviética. Eu não iria exagerar o papel da Rússia no desenvolvimento de relações amistosas com a região da África Austral, incluindo Moçambique. Aqui, a parte importante pertence à Ucrânia, à Geórgia, à Bielorrússia e ao resto dos nossos antigos “amigos” na URSS. Eu acredito que, independentemente dos projectos implantados em conjunto pela Rússia e pelo Moçambique, o vosso país está interessado em desenvolver a cooperação com o maior número possível de outros estados. Numa economia mundial globalizada, nenhum país quer depender de uma orientação única, porque isso, poderá afectar directamente a sua segurança nacional e independência económica. Bem, tenho a certeza que Moçambique está principalmente interessado em diversificar os seus projectos externos nas áreas da política e de economia.

9.      Moçambique tem tido uma postura de neutralidade na questão Rússia/Ucrânia, pelo menos publicamente. Como analista essa opção?
Este tipo de posição foi tomada por uma série de países (mas não a maioria), o que é patente nas votações no âmbito das organizações internacionais na questão da agressão russa na Ucrânia. Pessoalmente, associo essa posição dos países “neutros” com o fenómeno da guerra híbrida, que a comunidade internacional está assistindo, nesta envergadura, pela primeira vez na história das relações internacionais. Mas hoje, quando o mundo inteiro está ciente do papel da Rússia e dos seus métodos de guerra na Ucrânia, tenho certeza que a maioria destes países irá modificar a sua posição actual para uma mais clara. Pois, a preservação do direito internacional como o maior instrumento de resolução de conflitos é uma prioridade para todo o mundo civilizado. O nivelamento, por baixo, dos valores e da efectividade do direito internacional afecta todos os países, porque quando o Direito internacional não é respeitado, todo e qualquer país pode se tornar uma vítima já amanhã. O que se deu com a interferência da Rússia nas eleições na Alemanha, França, Estados Unidos, no caso recente de Salisbury.

10.  Qual é a posição que Maputo tem transmitido a Kiev em relação ao conflito com a Rússia?
Não recebemos, por parte de Moçambique, uma posição clara nesta questão.

11.  Qual é o papel que Moçambique pode jogar para ajudar a resolver o conflito entre a Ucrânia e a Rússia?
Acredito que a adesão de Moçambique à posição da maioria dos países, em, ao menos condenar a violação das normas e princípios básicos do direito internacional, a Carta das Nações Unidas e vários acordos internacionais e bilaterais ucraniano-russos, contribuiria significativamente para a pressão da comunidade internacional sobre a liderança russa. Isso impediria a repetição futura de cenários semelhantes em outras partes do mundo.

12.  Está projectada a instalação de uma embaixada da Ucrânia em Maputo?
Como se pode ser comprovado pelas estatísticas dos nossos indicadores de comércio bilateral, bem como pela ausência de um diálogo político activo, a abertura de uma missão diplomática ucraniana exclusivamente para Moçambique não é oportuna. Mas, mais uma vez, gostaria de enfatizar que nos últimos anos Ucrânia expandiu consideravelmente sua cooperação com os países da África. Portanto, estou confiante de que a abertura da representação diplomática ucraniana é provável no futuro, no processo de aprofundamento da cooperação bilateral.

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