quarta-feira, dezembro 26, 2018

A comédia russa negra «Prazdnik» — “blasfémia” acessível somente no YouTube

O realizador russo Aleksey Krasovskiy apresentou ao público o trecho da sua comédia negra «Prazdnik» (Festa), o enredo da qual decorre em Leninegrado, numa festa do Ano Novo, no decorrer do cerco nazi da cidade, marcado pela fome generalizada e extrema da sua população.
Os personagens principais do filme, membros da família privilegiada do cientista Voskresensky, comemoram o Ano Novo numa casa de campo. Convidados inesperados juntam-se à festa: o filho dos Voskresensky traz para casa a sua namorada que não está acostumada ao luxo que goza a família, e a filha trouxe o noivo que acaba de voltar da linha da frente. Os Voskresensky têm que esconder a sua vida de privilégios, porque os outros moradores de Leninegrado estão, literalmente, morrendo de fome.
As filmagens do Prazdnik
O realizador arrecadou o dinheiro para fazer o filme com a ajuda do crowdfunding. Ele recebeu várias ameaças pelo telefone e nas redes sociais, devido ao facto de fazer uma comédia sobre Leninegrado sitiado. O filme, sem sequer ser visto, foi chamado pelos críticos do regime de “blasfémia”; acusando os seus criadores de “pisotear o tema sagrado”. Krasovskiy se recusou a receber a licença estatal para exibição do seu filme – decidindo, simplesmente, colocar a película, de forma livre, no seu canal no YouTube.
Ler a entrevista do realizador (em russo)
A estreia do «Prazdnik» será já no dia 31 de dezembro. Vocês poderão ver o filme online AQUI.

Blogueiro: o cerco a Leninegrado pelos exércitos alemão, finlandês e espanhol, durou longos 872 dias. Cerco resultou, diretamente, na morte de 641.000 pessoas e milhares de outros morreram fora da cidade, já após a sua evacuação.

Por outro lado, a cidade sitiada recebia comida, quer por caminho-de-ferro (que na realidade nunca foi cortado pelos alemães), quer por via aérea, mas que claro, não chegava e nem era distribuída para todos. Na cidade circulavam os talões e cabazes especiais, acessíveis à elite soviética militar, científica e do NKVD. Um grande número desses documentos históricos está nos arquivos, no Museu do Cerco da cidade, que até hoje não podem ser exibidos publicamente (fonte).

No período mais terrível do inverno de 1941-42 (a temperatura caiu abaixo de – 30ºC), um operário recebia 250 g de pão por dia e os cidadãos “improdutivos” apenas 150 g. No entanto, na cidade existia o sempre presente mercado negro de alimentos e foram registados diversos atos de canibalismo (segundo arquivos do NKVD-MGB em Leninegrado foram detidos cerca 2.000 praticantes do canibilismo, 586 deles foram executados. Anne Reid, “Leningrad: The Epic Siege of World War II, 1941-1944”).

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