domingo, dezembro 09, 2018

A doutrina Gerasimov: a estratégia de caos do Kremlin

O caos é a nova estratégia que o Kremlin persegue na sua guerra política: o general russo Valery Gerasimov especifica que o objetivo da estratégia é alcançar um ambiente de inquietação permanente e conflito dentro de um Estado inimigo. Provavelmente está sendo usada em você.

por: Molly K. Mckew *, Politico.com (versão curta em português)

Em fevereiro de 2013, o general Valery Gerasimov – o chefe do Estado Maior do Exército russo publicou na revista russa Correio Militar-Industrial” um artigo chamado “O valor da ciência está na Previsão”. Gerasimov adotou as táticas desenvolvidas pelos soviéticos, misturou-as com o pensamento militar estratégico sobre a guerra total e estabeleceu uma nova teoria da guerra moderna – que se assemelha mais ao hackear a sociedade do inimigo do que atacá-lo em frente [da batalha]. Ele escreveu: “As próprias 'regras de guerra' mudaram. O papel dos meios não militares de alcançar objetivos políticos e estratégicos cresceu e, em muitos casos, eles excederam o poder da força das armas em sua eficácia. … Tudo isso é complementado por meios militares de caráter oculto”.

O artigo é considerado por muitos como a articulação mais útil da estratégia moderna da Rússia, uma visão da guerra total que coloca a política e a guerra dentro do mesmo espectro de atividades – filosoficamente, mas também logisticamente. A abordagem é de guerrilha e travada em todas as frentes com uma gama de atores e ferramentas – por exemplo, hackers, mídia, empresários, vazamentos [informativos] e, sim, notícias falsas, assim como meios militares convencionais e assimétricos. Graças à Internet e às redes sociais, os tipos de operações de que as equipas/es soviéticas de psy-ops / psy-war apenas podiam sonhar – subvertendo os assuntos domésticos [de nações] apenas com informações – são agora plausíveis. A Doutrina Gerasimov cria uma estrutura para essas novas ferramentas e declara que as táticas não militares já não são auxiliares do uso da força, mas se tornam a maneira preferida de vencer. Que eles são, na verdade, a guerra real. O caos é a estratégia que o Kremlin persegue: Gerasimov especifica que o objetivo é alcançar um ambiente de inquietação permanente e conflito dentro de um Estado inimigo.
França: os "coletes amerelos" destroem a placa do
Centro Cultural e Informativo da Ucrânia em Paris
Isso funciona? As ex-nações oprimidas, como Geórgia, Estónia e Lituânia soaram o alarme nos últimos anos sobre as tentativas russas de influenciar suas políticas domésticas e a segurança, na medida em que o governo Obama minimizou as preocupações com uma nova Guerra Fria. Mas os três países agora têm partidos com conexões financeiras russas, liderando seus governos, que defendem suavemente uma abordagem mais aberta a Moscovo.

Na Ucrânia, a Rússia vem implantando a Doutrina Gerasimov nos últimos anos. Durante os protestos de 2014, o Kremlin apoiou extremistas de ambos os lados da luta  forças pró-russas e ultranacionalistas ucranianos – alimentando conflitos que o Kremlin usou como pretexto para ocupar a Crimeia e lançar a guerra no leste da Ucrânia. Acrescente uma dose pesada de guerra de informações e esse ambiente confuso – no qual ninguém tem certeza dos motivos de ninguém e praticamente ninguém é um herói – é aquele em que o Kremlin pode prontamente exercer controlo/e. Esta é a Doutrina Gerasimov na prática.

Os Estados Unidos são o alvo mais recente. O estado autoritário russo define a América como o principal adversário. Os russos sabem que não podem competir com a gente [EUA] – economicamente, militarmente, tecnologicamente – então eles criam novos campos de batalha. Eles não pretendem se tornar mais fortes que nós [EUA], mas enfraquecer nós até que sejamos equivalentes.

* Molly K. McKew, especialista em guerra de informação, aconselha governos e partidos políticos sobre política externa e comunicações estratégicas. Foi conselheira do governo do presidente da Geórgia, Mikheil Saakashvili, de 2009 a 2013, e do ex-primeiro ministro da República da Molova, Vlad Filat, em 2014-15.

Ler o texto integral em inglês.

Bónus

O uso prático da doutrina Gerasimov nos protestos de “coletes amarelos” em Paris

Dois homens que seguram, nas ruas de Paris, a bandeira dos separatistas de Donbas foram identificados como cidadãos franceses Fabrice Sorlin e Xavier Moreau.
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Fabrice Sorlin (marcado à amarelo) é o líder da organização de extrema-direita Dies Irae, fã do “Mundo russo”, membro da “Frente Nacional”, ex-líder da organização “Associação França – Europa – Rússia”, chefe do centro Katehon (um dos membros do seu conselho diretivo é neofascista russo Alexander Dugin, com as conexões óbvias com a secreta militar russa GRU).
Xavier Moreau (marcado à vermelho) visitou ilegalmente os territórios ocupados de Donbas, foi um dos “observadores internacionais” no dito processo eleitoral nas ditas repúblicas populares” de Donbas. Após disso, produziu uma série de colunas pró-russas na mídia francesa. Vive e trabalha em Moscovo.

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