O
papel real da União Soviética na criação dos movimentos comunistas no Brasil, recrutamento de agentes via secreta checoslovaca StB, o
treino clandestino dos militantes do PCB na URSS desde a década de 1920 e em Cuba após 1959.
por:
Astier Basílio, poeta, jornalista, escritor e dramaturgo (versão curta)
[...] Não
é delírio persecutório, nem teoria da conspiração, afirmar que Ancelmo Gois foi
à União Soviética e sob os auspícios do serviço secreto, a o KGB, obteve
documentação falsa com a qual viajou e que ao chegar em Moscou, veio a estudar
“marxismo e leninismo”, na escola de formação de jovens quadros do Partido
Comunista. Foi Ancelmo quem contou em detalhes sua ida à Rússia [URSS]
em 1968. A entrevista
concedida há dez anos, está disponível no site da Associação Brasileira de
Imprensa para qualquer um ver [...].
O treinamento do futuro
tradutor de Dostoiévski
Ancelmo
não foi o único jovem esquerdista a receber treinamento doutrinário na União
Soviética. Dentre os relatos conhecidos, destaca-se o do paraibano Paulo
Bezerra, célebre por seu trabalho de tradução das obras de Dostoiévski. Quando
viajou, outros nove brasileiros o acompanhavam com o igual propósito. Era
Bezerra o único operário do grupo.
A
aventura aconteceu em finais de 1963 [...]
[...]
Sob as bênçãos do curto mandato de Goulart, os soviéticos gozaram de liberdade
e ensaiaram aproximação com o Brasil. É o que diz o historiador Rodrigo Patto
Sá Motta¹, ao referir-se ao restabelecimento dos laços com Rússia [URSS].
“Com a recém conquistada liberdade de movimentos, a URSS implantou programas
para facilitar o aprendizado da língua russa, principalmente através dos
Institutos Culturais Brasil-URSS (ICBUS). Além disso, firmaram-se convênios
para envio de estudantes brasileiros à União Soviética”.
Patto
Sá Motta faz uma ressalva e toca num ponto importante. Para além do acordo
formal havia um intercâmbio que ocorria no subterrâneo. “Clandestinamente, a
URSS recebia brasileiros para treinamento desde os anos de 1920, mas tratava-se
de militantes selecionados pelo PCB” [...]
A guerrilha existiu
antes golpe
Denise
Rollemberg em seu livro “O apoio de Cuba
à luta armada no Brasil: o treinamento guerrilheiro” (Rio de Janeiro: Mauad,
2001) desmonta um dos pontos centrais da narrativa de esquerda armada: a de
que guerrilha só existiu por não haver
outro meio de luta, sendo, portanto, uma reação à ditadura militar.
O apoio de Cuba a luta armada no Brasil: o treinamento guerrilheiro |
“A
relação das Ligas com Cuba evidencia a definição de uma parte da esquerda pela
luta armada no Brasil, em pleno governo democrático, bem antes da implantação
da ditadura civil-militar”, assevera a escritora.
A
discordância da União Soviética com a implantação por Cuba dos focos de
guerrilha pela América Latina pode ser emblematizada no encontro, ocorrido em
Havana, em 1963 – ainda sob a vigência do governo de João Goulart, repita-se –
entre Francisco Julião e Luís Carlos Prestes, este Secretário Geral do Partido
Comunista, aquele representante das Ligas Camponesas.
[...]
Apesar da posição contrária dos dirigentes soviéticos, Cuba treinou em torno de
200 militantes brasileiros. Para Denise Rollemberg “(…) a própria URSS,
evidentemente, sempre esteve a par do fluxo mantido nos anos posteriores de
militantes indo a Cuba treinar. As rotas de entrada e saída do país, por
exemplo, passavam por Moscou e Praga, onde os guerrilheiros eram recebidos e
orientados”.
Brasil nos arquivos
soviéticos
Em
maio de 1964, o diplomata t/checoslovaco Zdenek Kvita, que ocupava no Brasil o
segundo posta na embaixada de seu país, foi preso por agentes do DOPS carioca,
“quando tentava obter documentos secretos de suposto informante, na verdade
agente policial. O agente da polícia estava fingindo vender a Kvita informações
secretas, como a planta da Refinaria Duque de Caxias e os planos brasileiros
para monitorar Embaixadas dos países socialistas”.
Ler mais |
A
informação está nos arquivos da CIA, recolhidos pelo historiador Rodrigo Patto
Sá Motta. Este personagem, Zdenek Kvita,
é citado no site “STB, o Brasil nos Arquivos Soviéticos”, como o primeiro
integrante da polícia secreta a manter contato com seus colegas cubanos.
O
portal disponibiliza documentos, reproduz artigos da presença do serviço secreto da
T/Checoslováquia no Brasil de 1945 a 1990. O trabalho redundou no livro “1964, O
Elo Perdido – O Brasil nos arquivos do serviço secreto comunista” (ler
mais), do brasileiro Mauro Kraenski e do polaco/polonês Vladimir Petrilák.
O serviço t/checoslovaco era a o verdadeirao KGB no Brasil
Em
resenha ao livro 1964 e a atuação
da KGB n Brasil, João César de Melo
observa que a StB atuava livremente no Brasil pois a Checoslováquia não era
vista como inimiga, “o que dava liberdade para seus agentes circularem, se
relacionarem com brasileiros e obterem informações sem despertar suspeitas. O
resultado foi a infiltração de dezenas de agentes tchecos que recrutaram
centenas de brasileiros a partir de 1952. Tudo, absolutamente tudo, registrado
metodicamente. Em outras palavras: a StB era, de fato, a o KGB no Brasil, dado
que todas as diretrizes da agência tcheca eram definidas em Moscou” [...]
Fundo para organizações
de esquerda
Em
1969, o Partido Comunista do Brasil aparece num documento do Politburo [do CC
do PCUS], numa lista de envio de dinheiro, para criação de um “Fundo
Internacional para ajudar Organizações de Trabalhadores de Esquerda”. Dos 15
primeiros destinatários da verba, o Brasil figurou na oitava colocação, com a
quantia de 200 mil dólares.
Brasil e Portugal nos Arquivos Soviéticos |
Há
pedidos de trein(ament)o, com todas as despesas pagas pelo fundo do Partido
Comunista Russo [soviético], para militantes brasileiros. Quem assinou as solicitações foi Luís Carlos
Prestes. Em 1974, recepção e despesas para um curso de três meses, ao camarada
Leonardo Leal, quadro do Partido, que fez parte das Ligas Camponesas, na
Paraíba. Em 1978, curso de treinamento
em atividades clandestinas para Marcelo Santos, membro do Comité Executivo do
Partido Comunista do Brasil.
Fontes
citadas no texto:
(1)
http://www.ufjf.br/locus/files/2010/02/131.pdf
(2)
https://www.cia.gov/library/readingroom/docs/esau-22.pdf
Ler
o texto integral do Astier Basílio:
Ancelmo
Gois, União Soviética e a ditadura militar brasileira
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