domingo, fevereiro 17, 2019

A manifestação paga contra as manifestações pagas

Cerca de 1.000 pessoas se reuniram em Kyiv neste domingo numa manifestação para se manifestarem contra as manif pagas. Com promessa de receberem 130-150 UAH (4,7-5,5 dólares) por duas horas de “trabalho”. Não receberam nada, foi uma ação puramente educativa.
Melhor slogan da manif: "Não estou aqui pelo dinheiro!" | foto: FB do Sergii Naumovych
A praça Kontraktova no Podil em Kyiv neste domingo | foto: FB do Sergii Naumovych
O povoficou reunido na praça Kontractova (bairro do Podil) das 10h00 às 12h00, só depois se aprecebendo que não iria receber coisa alguma. É um dos problemas reais da vida política ucraniana, uso do “povo” (estudantes, reformados, diverso lúmpen) nas mais diversas manifestações à favor e contra, à troco da promessa de receber alguma taxa fixa, geralmente entre 5-20 dólares (20-80 reais) por algumas horas da “atividade”. A grande hipocrisia dos políticos, se baseia na pequena hipocrisia dos “cidadãos”, que então escolhem os políticos hipócritas. Um círculo vicioso (fotos).
"As manif não são um negócio!" | foto: FB do Sergii Naumovych
"Não estamos à venda" | foto: FB do Sergii Naumovych
"Tenho dignidade/consciência - não recebo dinheiro!" | "Manifestante não é uma profissão!"
foto: FB do Sergii Naumovych
Até recentemente o problema parecia sem uma resolução à vista. Alguns políticos e deputados do parlamento ucraniano até propuseram a introdução na legislação a responsabilidade criminal por essa atividade. Os ativistas, como quase sempre, criaram uma tática, aparentemente muito mais simples e efetiva. Em 2019 e através dos meios habitualmente usados pelos políticos à procura do “povo de aluguer/aluguel” (fóruns com propostas de emprego temporal online), ativistas começaram marcar as manifestações em várias cidades ucranianas. As manif à favor de diversas causas fake, em que apareciam, em massa, os clientes habituais dessas ações. Só que dessa vez ninguém lhes pagava nada, para explicar, de forma prática, que na democracia as manifestações servem para demonstrar a sua posição cívica e não para receber dinheiro ou sandes de mortadela, como acontecia no Brasil ou continua à acontecer em Cuba e Venezuela.
A manif em Odessa de 10/02/2019 | foto: 048.ua
Tudo começou em 10 de fevereiro em Odessa. Os ativistas marcaram a manif paga em apoio do candidato ao presidente da Ucrânia – Serhiy Filatov, personagem fictícia e puramente inventada. Quando o “povo” se reuniu no local combinado, os ativistas enviaram a informação com conselho de aproveitarem o dia e passearem no funicular, pois o “candidato caiu na caixa de canalização e morreu”. Alguns dos “enganados” ficaram bastante tristes, um deles trouxe consigo à manif 270 pessoas, pois cada “amigo” trazido valia prémio monetário.
- O candidato caiu na caixa de canalização e morreu. Recebemos as condolências.
-  As minhas condolências.
Depois veio Kharkiv. No dia 13 de fevereiro os jornalistas, com ideia de um veterano de OAT, organizaram a manif também fake em apoio ao candidato à presidência – Anatoly Onoprienko, na realidade um conhecido assassino em série soviético e ucraniano.

O veterano Andriy anunciava que oferece 1.000 UAH (36,7 dólares) por “uma tarde de trabalho”. Só nas primeiras 24h ele recebeu cerca de 150 telefonemas dos que pretendiam ganhar o dinheiro fácil. Mais de uma centena dos “cidadãos” apareceu no local e na hora marcados, na praça de Constituição de Kharkiv. Com muita facilidade o “povo” gritou em frente das câmaras de TV: “Onoprienko somos nós!”, “Onoprienko é a força” ou “Onoprienko é o futuro da Ucrânia!”. Além disso, os manifestantes garantiram publicamente que votariam em Anatoly Onoprienko, embora “ainda não tinham lido o seu programa eleitoral”, escreve a página ucraniana 057.ua – a co-organizadora do evento.
Manif em Kharkiv, 13/02/2019 | foto/screen: Kharkiv News / YouTube
Literalmente, uma hora após o início da manif, os jornalistas e ativista deixaram o local e começaram receber às chamadas indignadas dos “cidadãos enganados” que desejavam receber os seus 1.000 UAH. Às todas as lamentações, exigências e até ameaças, aos manifestantes foi pedido para que lessem com mais cuidado – à favor de quem eles se manifestaram naquela tarde e até estariam dispostos à venderem os seus votos:

É de notar que a esmagadora maioria dos internautas ucranianos apoia, em absoluto, as ações dos ativistas e jornalistas. Centenas de comentários em ucraniano e russo dizem praticamente a mesma coisa:

Evgeny Volnov: Os c@brões destes precisam de se exercitar dessa forma, porque estes fdp vendem o futuro do seu país.

Anton Grinblat: É único caminho possível com eles. Mandá-los às manifestações fakes até que pela proposta de “se manifestar à troco de X UAH” vão mandar para o c@ralho )) Até então essa compreensão que lhes chegue através das suas pernas [cansadas].

Nataliya Halas: Obrigado. Fizeram realmente um grande trabalho. Espero que muitos vão ver. Divulguei onde podia.

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