Na
primavera de 2014, na cidade de Luhansk e com ajuda das forças russas, foi
proclamada a “república popular de Luhansk”, a famosa “lnr”. Quase cinco anos
depois, a “jovem república” já consegue mostrar ao mundo as suas primeiras conquistas...
Muito
recentemente, o principal ideólogo de Putin, Vladislav Surkov, publicou a
sua visão programática do “putinismo em curso”, semelhante ao discurso de
Hitler em Munique e baseada nos mesmos princípios – nós não precisamos da
civilização, há inimigos ao nosso redor, continuaremos fazendo propaganda e a guerra,
“nos amem, ou vós mataremos”! O texto também fala de algumas realizações
incríveis do putinismo – que consegui criar a chamada “novorossia” – uma espécie de URSS 2.0
estalinista ambientada na década de 1930 – com muita pobreza, propaganda, delação
dos vizinhos e conhecidos, ódio mútuo.
Luhansk na primavera de 2014, exortação ortodoxa da invasão russa | @arquivo |
Todas
as fotos dessa reportagem foram tiradas no inverno de 2018 pelos moradores de
Luhansk. Fotografar era extremamente perigoso – a secreta separatista “mgb”
funciona à semelhança do NKVD e manda qualquer cidadão suspeito “para a cave”,
o acusando de ser um “espião e sabotador ucraniano”. Fotografar a lixeira,
sendo visto por algum delator, é suficiente para ser declarado “espião e sabotador”.
As repressões em Luhansk são mais severas e rigorosas do que em Donetsk – a
dita “lnr” é mais pobre e os orcos locais são muito mais famintos e impiedosos.
A vida na «lnr»
As
pessoas em Luhansk ocupada sobrevivem revendendo a roupa de segunda mão comprada
na Rússia e os alimentos e medicamentos trazidos da Ucrânia. Para fazer compras
na Ucrânia os súbditos da “república” se deslocam até a vila de Stanytsia Luhanska (do
lado da Ucrânia livre, junto ao ponto de controlo/e na linha de separação),
onde funciona o escritório dos correios “Nova Poshta”, que recebe todo o tipo
de encomendas da Ucrânia. Em princípio, é todo o “negócio” que ainda funciona
em Luhansk.
Stanytsia Luhanska, ponto de controlo/e na linha de separação, inverno de 2018-19 foto @arquivo |
Os
salários são pagos em rublos russos. O salário médio é de cerca de 5-7 mil
rublos (75 – 100 dólares americanos), o pessoal das limpezas/faxineiros/as recebem
1.200 rublos (18 dólares). Os mercenários afetos às unidades separatistas
ganham 15.000 rublos (225 dólares). Vivem razoavelmente bem apenas as chefias da
“república popular” e os militares russos – únicas pessoas que fazem compras nos
supermercados. Um bom apartamento no centro de Luhansk já se vende por 11.000
dólares [voltando ao nível de preços dos meados da década de 1990]. Os empregos disponíveis aos cidadãos comuns
são caixas e guardas de lojas, agentes de carga (carregadores e armazenistas). Os
restantes cidadãos se dedicam à venda de alguma coisa nos mercados, na cidade também
surgiram imensas lojas que vendem as roupas e calçado da segunda mão.
A
propaganda total separatista diz que se ucranianos vencerem, todos os de
Luhansk serão mortos, presos e enforcados. Embora ultimamente, a retórica
começou a mudar – “nós somos Ucrânia, então Ucrânia deve nos pagar as pensões/reformas,
devemos ser ajudados”, etc. Ao mesmo tempo na televisão local se fala
constantemente dos acordos incríveis que são celebrados com Abecásia, Crimeia e Transnístria [territórios ocupados da Geórgia, Ucrânia e Moldova], e que “muitos
investidores estrangeiros” estão prestes a entrar em Luhansk. A “república” está
literalmente à beira de um boom económico!
Todas
as esferas de influência na “república” são divididas entre os seus dirigentes
– um manda na venda de combustível, outro recebe a “taxa de proteção” das lojas,
terceiro – controla os mercados, e assim por diante. Luhansk não produz quase
nada, a infra-estrutura está se deteriorando e apodrecendo. Mas surgiu o seu
próprio “estilo corporativo” – os letreiros às cores da bandeira tricolor russa
e os nomes próprios “à russa”, por exemplo, o cinema “Ucrânia” foi rebatizado
de “Rus”.
Muitos
edifícios e outros estabelecimentos, como antigos restaurantes ou escolas
técnicas, foram transformados em quartéis e bases militares, departamentos do
“mgb” (NKVD local) e outros semelhantes. Dentro da cidade se criam as vacas. O
recolher obrigatório é à partir das 23h00, na realidade, no inverno, às 16
horas, já ninguém se arrisca de sair às ruas.
Estradas,
quintais, pátios e ruas
O
lixo em Luhansk já não é recolhido há algum tempo, os pátios da cidade se tornaram
lixeiras. Os separatistas gritaram em 2014: “Rússia, venha!”, Rússia veio – não
com glamour televisivo moscovita, mas em forma de Omsk real.
Pombos
rastejam em montes de lixo em decomposição, à procura de algo comestível.
Mais
um quintal com contentores à abarrotar de lixo:
As
estradas de Luhansk não são limpas, nem são reparadas/consertadas – no meio de uma
rua movimentada podemos ver os poços cheios de água.
As
ruas centrais da cidade, outrora animada, agora se assemelham a uma cidade
fantasma de alguma distopia. Passadeiras/calçadas geadas, montanhas de lixo ao
longo da estrada, a quase completa ausência de carros na estrada coberta de
neve.
Quiosque,
montanhas de uns escombros e uma parede, como se estivesse coberta de escamas
de centenas de anúncios: “vendo, vende-se, comprem”.
Mais
quintais. A rua central de Luhansk se chamada Sovetskaya (soviética). No fundo –
um prédio de escritórios parcialmente abandonados, por cima de contentores de
lixo enferrujados está colado o anúncio da compra dos cabelos.
Mais
quintais da rua duplamente “soviética”:
Mesmos
quintais no centro de Luhansk.
Às
vezes, para recolher o lixo é colocado um contentor maior, mas aparentemente –
ninguém paga ou zela a sua remoção.
Mais
quintais. Estacionamento local e lixeiras.
Um
outro pátio da “pequena Suíça”, como chamam os fãs da “lnr” a sua “república
popular”:
Transporte
público, lojas e prédios habitacionais
O
transporte público municipal praticamente desapareceu em Luhansk, se aguentam
apenas os miniautocarros/miniônibus – funcionam sem horários fixos, abandonam a
rota quando entendem, não chegam aos destinos finais, e assim por diante.
Finalmente livres da Ucrânia! O minibus de Luhansk que perdeu a sua roda traseira
no meio da estrada:
As
entradas dos prédios de habitação. O poema exorta as virtudes do “mundo russo”:
“mijo fora de sanita, p'ro c@ralho, não importa”, as tampas de caixas de
correio foram quebradas, roubadas e vendidas à sucata.
A poesia do “mundo russo”: “mijo fora de sanita, p'ro c@ralho, não importa” |
Mais
uma entrada. Alguém fez essa inscrição demorada e diligente, mostrando o seu “apreço”
pela dita “lnr”:
“lnr [é uma] merda” |
Em
Luhansk funciona o supermercado Spar [sem a ligação com a cadeia holandesa desde
o início de ocupação em 2014]. A variedade pode ser vista na foto à esquerda –
algumas sopas secas, temperos e farinha.
Os moradores comuns não fazem compras
no Spar – essa é a prerrogativa dos dirigentes locais, que vivem como a
nomenclatura soviética. Na foto à direita – na entrada das “lojas populares”,
situadas nos prédios de habitação e outras pequenas instalações. São abertas
das 8h00 às 20h00 e prometem pão de boa qualidade diariamente e as “patas de frango”.
Departamento
de carne /açougue. Carne de frango picada custa 131 rublos (1,97 dólares) e “patas de frango” custam
36 rublos (0,54 dólares). Há também panquecas congeladas com queijo cottage.
Departamento
de laticínios. Há leite (1), manteiga (2) e também muitas maioneses chamados
“light”, “de casa de campo” e “de ovos de codornizes” (3).
Álcool
O
passatempo popular em Luhansk é o consumo de álcool, principalmente a cerveja
barata e vodca falsificada importada da Rússia. Isso permite se abstrair da
realidade e não pensar sobre o que está acontecendo. Eles dizem que isso ajuda,
especialmente em combinação o consumo das televisão, canais russas e da estação
local.
Os
locais de depósito de lixo nos bairros residenciais nas manhas:
Em
Luhansk funcionam vários locais, chamados de “enchimentos” – onde o cidadão da
“república” pode tomar a sua dose de álcool barato. Estes pontos se abrem nos
prédios habitacionais e instalações vazias, aparentemente, é mais um negócio
rentável de “lnr”.
A
janela de um “enchimento” típico. Cliente vem à janela, entrega o dinheiro e recebe
a sua dose de álcool.
Foto
da recepção de um dos hospitais de Luhansk, onde em janeiro de 2018 foram
registadas três comas alcoólicas numa só tarde...
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