A
tradição soviética do Ano Novo, assim como a respetiva mesa
festiva, se formaram apenas após a II G.M., antes disso, a festa era
tolerada, mas vista como “atavismo burguês”, algo de que os cidadãos
soviéticos, certamente, iriam prescindir nas futuras “amanhas cantantes” do
comunismo triunfante.
A
festa do Ano Novo na época soviética exigia dos cidadãos a procura árdua dos
alimentos para a mesa festiva — maionese e outras “iguarias”, como a ervilha enlatada,
eram compradas com meses de antecedência, mas ainda tinha que encontrar uma árvore
de Natal Ano Novo decente, pensar onde e como conseguir obter presentes para familiares
e amigos – movimento frenético que gerava o sentimento de um milagre e um
feriado. Hoje, todas essas coisas são compradas na hora e em qualquer
quantidade e qualidade, como tal, a festa é encarada de forma mais simples e
sem o frenesim de outrora.
Árvore
de Natal Ano Novo e TV
02.
A celebração do Ano Novo na URSS foi permitida, de forma oficial, no período
pós- II G.M., apenas em 1947 (o Avô
Geada/Died
Moroz e sua neta,
Sniegurochka, foram permitidos desde 1935
), neste ano, pela primeira vez na União Soviética, o
dia 1 de janeiro foi declarado como feriado. Antes disso, acreditava-se que a
árvore de Natal Ano Novo era colocada apenas por “pequenos burgueses”, que em
segredo das autoridades soviéticas estavam celebrar as “velhas festas czaristas”.
03.
Devolvida em 1947 a árvore, dentro de alguns anos se tornou a tradição. O que é
interessante – até o fim da URSS, no país não surgiu a verdadeira “indústria da
árvore do Ano Novo”, as pessoas “arranjavam” as arvores em mais diversos
lugares – nas grandes cidades eram organizados os “bazares de árvores do Ano
Novo”, mas na maioria das vezes vendiam apenas os restos – as árvores de Natal Ano
Novo mais ou menos decentes provavelmente eram vendidas “aos amigos” com uma
pequena sobretaxa e não chegavam ao comércio de massas.
Era
bastante normal ir à floresta e cortar uma árvore de Natal Ano Novo – que, por
vezes era escolhida ainda no outono ou mesmo no verão. [Cortavam mesmo as
árvores decorativas nos parques urbanos, a polícia fazia as rusgas contra os pevericadores,
em alguns locais as árvores eram pulverizados com a tinta pegajosa para
desencorajas os bárbaros].
04.
Não havia à venda as bases para as árvores, uns faziam a base da madeira,
outros colocavam a árvore num balde com areia e outros metiam a árvore numa
panela, com água, amarrada a um tamborete — desta forma a árvore durava mais
tempo. Num dado momento se tornaram muito populares as árvores de Natal Ano
Novo, feitas de polietileno – um chique especial era árvore prateada, como na
foto abaixo:
05.
Na década de 1970 surgiu a tradição de celebrar o Ano Novo em frente da TV –
naquela época os aparelhos da TV já se massificaram bastante, começaram
aparecer os programas como Luzinha Azul (1962-1985
e desde 1997 até hoje na TV russa “Rossija”), em 1970, Brejnev, pela primeira
vez na URSS, leu o seu “apelo ao povo por ocasião do ano novo”. Em 1986,
aconteceu algo inédito – Gorbachev felicitou, por ocasião da chegada do Ano
Novo, os cidadãos dos Estados Unidos e o presidente Ronald Reagan felicitou os habitantes
da URSS:
Mesa
festiva e défice
|
"Pelo Ano Novo" dizem os balcões frigoríficos praticamente vazios de uma mercearia soviética |
06.
Os cidadãos soviéticos começaram a preparar-se ao Ano Novo bastante antecipadamente,
várias semanas, senão meses – os produtos “festivos” eram bens escassos e tinham
que ser comprados com muita antecedência. Os “produtos clássicos” da mesa
soviética do Ano Novo eram: ervilhas enlatada búlgara, espadilhas bálticas,
lulas/polvo do Extremo Oriente soviético (mais tarde – “barras de caranguejo”),
chouriço defumado, tangerinas de Abecásia, maionese sem falta e champanhe
soviético.
Ocasionalmente,
esses alimentos apareciam à venda livre nas vésperas do Ano Novo, geralmente
eram “deitados/jogados fora” – “vá depressa, na mercearia na esquina jogaram fora
as tangerinas!”
07.
Outra regra de bom-tom era a presença na mesa de bolos e bolinhos comprados na loja
– na maioria das vezes eram piores que a produção caseira (cozinhados com a margarina,
na base de um creme oleoso gorduroso e decorados com rosas de cores ácidas),
mas aqui não era apreciada a qualidade, mas o estatuto da iguaria, o bolo “comprado”
era considerado uma delícia cara e de difícil obtenção.
08.
A fila para comprar os bolos – a cauda da fila fica na rua e, no primeiro plano se pode ver como um comprador feliz sai da loja, levantando
triunfalmente duas mãos com bolos honestamente conseguidos e ao muito custo –
para que eles não fossem amarfanhados na saída. Também podemos ver duas
velhotas exaltadas, que praticamente se empurram, na fúria de entrar na loja
para conseguir comprar o bolo.
09.
A venda do chouriço defumado também criava filas – este alimento era valorizado
pelo facto de ter um alto teor de carne e poucos aditivos (como em salsichas ou
mortadela), o que o transformava em um bom substituto da carne. O chouriço era
comprado como uma iguaria para a mesa festiva e sob a forma de um presente – trazer
consigo, numa visita social, uma peça de chouriço fumado e um bolo comprado na
loja era considerado como algo semelhante ao bom-tom.
10.
Afinal, o que componha a mesa soviética festiva? Se você passou, com sucesso, por
várias filas para comprar chouriço e bolos, e também de antemão (ainda no
outono), se preocupou de comprar os alimentos enlatados necessários, então a
sua mesa de Ano Novo poderia ser algo assim: salada olivier (salada russa),
arenque sob o casaco de pele, salada mimosa, 2-3 tipos de chouriço, sandes com
espadilhas e caviar vermelho, legumes enlatados (legumes frescos na URSS era um
dificit tremendo). Para a sobremesa – bolo, tangerinas e doces, de álcool –
champanhe soviético, vodca e vinho tinto seco (se conseguir obtê-lo).
Opcionalmente, se fazia algum prato quente – frequentemente galinha no forno
com batatas ou carne fria de porco.
Na
mesa havia muito pão – castanho e branco, na URSS, era um sinal de prosperidade
e da vida plena.
Visitas
e prendas
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Dois cavalheiros soviéticos à caminho de uma visita social |
11.
Na festa do Ano Novo da URSS costumava-se fazer visitas – o que também era preparado
com antecedência. Na visita, era necessário mostrar o seu melhor lado – um
homem deveria usar fato/terno ou, pelo menos, em uma camisa bem passada, e as
mulheres tinham que arranjar o cabelo – nas vésperas de Ano Novo os
cabeleireiros trabalhavam em um regime reforçado.
12.
O que poderia ser oferecido aos anfitriões? Um bom presente era considerado uma
delícia para a mesa – um bolo comprado, um conjunto de doces, frutas ou algum
tipo de vinho. Também era possível trazer uma caixa de chocolates ou um saco de
tangerinas.
13.
Quem quisesse oferecer algo mais sério, teria que se empenhar um bocado – ficar
algumas horinhas nas filas ou tendo um vendedor conhecido, se podia comprar de
presente uma lata de uma boa conserva (especialmente caviar vermelho ou preto),
bom chá ou algum perfume ou conjunto de maquilhagem [ao menos de origem de
algum país ocidental socialista, como Polónia].
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"Vocês são muitos e eu estou aqui SOZINHA!" |
14.
As donas de casa soviéticas levavam nos seus ombros todos as questões de preparação
da mesa festiva e aprimoramento e limpeza do apartamento para a recepção de
convidados, enquanto o marido estava preocupado com compras, correndo pelas
lojas e vendedores conhecidos, “apanhando” tudo o que era necessário.
E
vocês, os nossos queridos leitores, gostariam de passar um Ano Novo assim?
Gostariam?!! Podemos
vos ajudar, venham
aqui!