sexta-feira, julho 20, 2018

“Escravo do PCUS” e “Escravo da URSS”: as tatuagens proibidas dos prisioneiros soviéticos

Em agosto de 1967, dois jovens prisioneiros foram levados para o hospital prisional da cadeia operativa (SIZO №1) da cidade de Donetsk. Eles foram trazidos para a enfermaria não para os tratamentos – foram lhes dissecadas as tatuagens de “conteúdo hostil”.

por: Eduard Andryushchenko, Ostro.org

As personagens dessa história eram jovens delinquentes reincidentes. Olexander Zhuravskiy (1944), vivia em Avdiivka e aos 23 anos já teve 4 condenações prévias: hooliganismo, fuga da prisão, roubo e destruição de propriedade estatal por via do incêndio. Pavló Topchiy (1945), aos 22 anos já foi preso por tentativa de estupro e por assalto qualificado.

Zhuravskiy, estando na cela de detenção, fez a tatuagem na barriga com a frase: “Sou escravo do PCUS [Partido Comunista]” e “Fora com Brezhnev Kasygin” (com erros ortográficos). Usado, como muitos outros prisioneiros, meios improvisados ​​– uma placa metálica e borracha queimada de sapatos.
Olexander Zhuravskiy (1944)
Topchiy, por violação maliciosa do regime prisional primeiro foi transferido para uma cela de regime severo. Lá ele escreveu na própria testa: “Escravo da URSS”. A tatuagem foi removida pelas autoridades (na foto são visíveis os cicatrizes na testa). Mas o prisioneiro não desistiu: cerca de um mês depois, ele usou um prego e, com a mesma borracha queimada, fez vários tatus. O retrato de Lenine no peito [os prisioneiros comuns soviéticos acreditavam, de forma ingénua, que a imagem do Lenine no peito, impediria as autoridades soviéticas de os fuzilar], e logo abaixo – a frase “Sou escravo da União da URSS” e “Vítima do Saulin”.
Pavló Topchiy (1945)
O apelido possivelmente pertence à algum membro da administração prisional. Antes de fazer a segunda tatuagem, Topchiy exigiu uma transferência para outra colónia penal.

Talvez os prisioneiros fizeram as tatuagens com ajuda de companheiros de cela, mas não os denunciaram. É curioso que ambos os episódios ocorreram no mesmo dia – 17 de agosto de 1967. Mas, muito provavelmente, isso é apenas uma coincidência, é improvável que Zhuravsky e Topchiy conseguiriam se contatar para coordenar as suas ações.

Em geral, esses casos não eram muito incomuns nas cadeias e campos de concentração soviéticos. As frases “Escravo do PCUS” e “Escravo da URSS” – são as mais comuns de tatus proibidas pelas autoridades prisionais. Muitas vezes eram escritas na testa, tal como fez Topchiy.

Essas tatuagens dificilmente podem ser consideradas como uma manifestação da posição cívica ou política. Mais certo, era uma das formas primitivas de protesto contra o Estado soviético, as partes integrantes do qual eram o odioso sistema legal e penitenciário.

Uma história semelhante – com as tatuagens em forma de suásticas. Naquela época, as suásticas dos prisioneiros comuns soviéticos também simbolizavam a sua posição “anti-sistema”, e não as tendências nazis/nazistas. Aliás, os presos políticos, ao contrário dos criminosos, nunca fizeram este tipo de tatuagens.

As autoridades prisionais informaram o KGB, os chekistas de Donetsk passaram as informações para Kyiv, na capital ucraniana foi elaborado um relatório especial ao primeiro secretário do Partido Comunista da Ucrânia, Petró Shelest. O documento, que estava na mesa da líder comunista da Ucrânia Soviética agora é guardado no arquivo do SBU, onde essa história foi encontrada. Junto ao documento foram anexados as fotos dos prisioneiros, o que é um caso muitíssimo raro (fotos de tatuagens proibidas são, em princípio, pouquíssimos).
Relatório especial do KGB ao Petró Shelest
Zhuravsky e Topchiy, já sem tatus, mas com costuras e cicatrizes, voltaram para as suas celas. A procuradoria provincial instaurou os processos criminais contra eles, incriminando-lhes “a disseminação de invenções conscientemente falsas, desacreditando o Estado e o sistema social soviéticos”.

O seu destino posterior é desconhecido, o arquivo de SBU não possui nenhuma informação ao seu respeito. Se tal incidente ocorresse alguns anos antes, quando o “liberal” Nikita Khrushchev estava no poder, ambos poderiam ser executados.

Por exemplo, é conhecido o caso dos criminosos russos comuns Chukhlantsev e Sattarov, que em 1963 foram fuzilados por fazerem as tatuagens “hostis” (por exemplo “Khrushchev é vampiro”). Em 1964, a URSS foi liderada por Leonid Brezhnev, e as punições tornaram-se mais suaves. Existem as referências que no início da década de 1970 em alguns casos semelhantes, os portadores de tatuagens “anti-soviéticas” levavam o acréscimo de entre 1 à 1,5 anos da prisão efetiva. Muito provavelmente, o mesmo destino esperava os jovens prisioneiros de Donbas: Topchiy e Zhuravsky...

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