Em
agosto de 1967, dois jovens prisioneiros foram levados para o hospital prisional da
cadeia operativa (SIZO №1) da cidade de Donetsk. Eles foram trazidos para a
enfermaria não para os tratamentos – foram lhes dissecadas as tatuagens de “conteúdo
hostil”.
As
personagens dessa história eram jovens delinquentes reincidentes. Olexander
Zhuravskiy (1944), vivia em Avdiivka e aos 23 anos já teve 4 condenações prévias:
hooliganismo, fuga da prisão, roubo e destruição de propriedade estatal por via
do incêndio. Pavló Topchiy (1945), aos 22 anos já foi preso por tentativa de
estupro e por assalto qualificado.
Zhuravskiy,
estando na cela de detenção, fez a tatuagem na barriga com a frase: “Sou
escravo do PCUS [Partido Comunista]” e “Fora com Brezhnev Kasygin” (com erros
ortográficos). Usado, como muitos outros prisioneiros, meios improvisados –
uma placa metálica e borracha queimada de sapatos.
Olexander Zhuravskiy (1944) |
Topchiy,
por violação maliciosa do regime prisional primeiro foi transferido para uma
cela de regime severo. Lá ele escreveu na própria testa: “Escravo da URSS”. A
tatuagem foi removida pelas autoridades (na foto são visíveis os cicatrizes na
testa). Mas o prisioneiro não desistiu: cerca de um mês depois, ele usou um
prego e, com a mesma borracha queimada, fez vários tatus. O retrato de Lenine
no peito [os prisioneiros comuns soviéticos acreditavam, de forma ingénua, que
a imagem do Lenine no peito, impediria as autoridades soviéticas de os fuzilar],
e logo abaixo – a frase “Sou escravo da União da URSS” e “Vítima do Saulin”.
Pavló Topchiy (1945) |
O
apelido possivelmente pertence à algum membro da administração prisional. Antes
de fazer a segunda tatuagem, Topchiy exigiu uma transferência para outra
colónia penal.
Talvez
os prisioneiros fizeram as tatuagens com ajuda de companheiros de cela, mas não
os denunciaram. É curioso que ambos os episódios ocorreram no mesmo dia – 17 de
agosto de 1967. Mas, muito provavelmente, isso é apenas uma coincidência, é
improvável que Zhuravsky e Topchiy conseguiriam se contatar para coordenar as
suas ações.
Em
geral, esses casos não eram muito incomuns nas cadeias e campos de concentração
soviéticos. As frases “Escravo do PCUS” e “Escravo da URSS” – são as mais
comuns de tatus proibidas pelas autoridades prisionais. Muitas vezes eram
escritas na testa, tal como fez Topchiy.
Essas
tatuagens dificilmente podem ser consideradas como uma manifestação da posição cívica
ou política. Mais certo, era uma das formas primitivas de protesto contra o
Estado soviético, as partes integrantes do qual eram o odioso sistema legal e
penitenciário.
Uma
história semelhante – com as tatuagens em forma de suásticas. Naquela época, as
suásticas dos prisioneiros comuns soviéticos também simbolizavam a sua posição “anti-sistema”,
e não as tendências nazis/nazistas. Aliás, os presos políticos, ao contrário
dos criminosos, nunca fizeram este tipo de tatuagens.
As
autoridades prisionais informaram o KGB, os chekistas de Donetsk passaram as
informações para Kyiv, na capital ucraniana foi elaborado um relatório especial
ao primeiro secretário do Partido Comunista da Ucrânia, Petró Shelest. O
documento, que estava na mesa da líder comunista da Ucrânia Soviética agora é
guardado no arquivo do SBU, onde essa história foi encontrada. Junto ao documento
foram anexados as fotos dos prisioneiros, o que é um caso muitíssimo raro
(fotos de tatuagens proibidas são, em princípio, pouquíssimos).
Relatório especial do KGB ao Petró Shelest |
Zhuravsky
e Topchiy, já sem tatus, mas com costuras e cicatrizes, voltaram para as suas
celas. A procuradoria provincial instaurou os processos criminais contra eles,
incriminando-lhes “a disseminação de invenções conscientemente falsas, desacreditando
o Estado e o sistema social soviéticos”.
O
seu destino posterior é desconhecido, o arquivo de SBU não possui nenhuma
informação ao seu respeito. Se tal incidente ocorresse alguns anos antes,
quando o “liberal” Nikita Khrushchev estava no poder, ambos poderiam ser
executados.
Por exemplo, é conhecido
o caso dos criminosos russos comuns Chukhlantsev e Sattarov, que em 1963 foram
fuzilados por fazerem as tatuagens “hostis” (por exemplo “Khrushchev é vampiro”).
Em 1964, a URSS foi liderada por Leonid Brezhnev, e as punições tornaram-se
mais suaves. Existem as referências que no início da década de 1970 em alguns
casos semelhantes, os portadores de tatuagens “anti-soviéticas” levavam o
acréscimo de entre 1 à 1,5 anos da prisão efetiva. Muito provavelmente, o mesmo
destino esperava os jovens prisioneiros de Donbas: Topchiy e Zhuravsky...
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