Em
março de 1980, a capa da revista alemã «Der Spiegel» publicou a foto dos quatro militares
da República Democrática Alemã (RDA), junto à uma faixa ambientada ao estilo de Wehrmacht com a inscrição: «Honeckers
Afrika-korps». A revista falava dos 2.720 assessores alemães em África: 1.000
em Angola, 600 em Moçambique, 400 em Líbia e 300 na Etiópia.
Anteriormente,
em 29 de maio de 1978, a informação parecida foi publicada no semanário «Die Zeit»
com o título «Hoffmanns
Aafrikakorps»; em junho de 1978 «Bayernkurier» publica o artigo «Honecker
rotte Afrika-korps» e em 18 de novembro de 1979 «New York Times» falava sobre «East
German Afrika-korps».
Os
números
Em
agosto de 1978 a «Le Figaro» parisiense falava do envio para Etiópia de mais de
2.000 militares da RDA, sob o comando dos generais soviéticos. A «Tagesspiegel»
alemã, em dezembro de 1978 escreveu, citando o chefe do governo regional da
Baviera, Franz Josef Strauss,
que apenas em Angola estão estacionados cerca de 5.000 homens do “exército da
RDA”, principalmente as “unidades da elite, nomeadamente os pára-quedistas», 2.000
dos quais eram usados na «atual ofensiva». Em fevereiro de 1979 «Tagesspiegel» informou
sobre a movimentação de um regimento do exército da RDA de Etiópia para Angola.
O militar angolano (?) com equipamento da RDA |
No
filme popular da época, «The Wild Geese»
(1977), abrilhantado pelo Richard Burton, Roger Moore, Richard Harris e Hardy
Krüger existe a sequência em que os mercenários europeus atacam, algures em
África, a estação de controlo aéreo, liquidando um oficial do Exército
Nacional Popular (NVA), facilmente identificável pelo seu boné típico. No campo
atacado, além dos soldados africanos e cubanos, também são visíveis dois
oficiais da RDA. Mas até que ponto o NVA realmente estava metido em África?
Os
pedidos dos camaradas
Os
governos africanos por várias vezes pediram a RDA fornecer o seu pessoal militar,
principalmente os pilotos. Os pedidos eran formulados em 1979-1980, por exemplo, pelo
presidente da Zâmbia, Kenneth Kaunda
e
pelo seu ministro da defesa, Alexander Grey Zulu.
Os zambianos queriam que a força aérea da RDA defendesse o espaço aéreo do
país. O ministro da defesa da RDA, general Heinz Hoffmann (1960-1985),
recusou imediatamente a proposta, a classificando de «impraticável». Em 1980,
os zambianos voltaram a pedir os assessores militares, mas as negociações com
Hoffman “ainda não levaram à nenhuma decisão”, – se queixava Kaunda na carta ao
secretário-geral do Partido Socialista Unificado da Alemanha, Erich Honecker.
O general Heinz Hoffman em 1965 |
A
RDA também não pretendia manchar a sua reputação internacional, queria evitar
os riscos militares no estrangeiro, recusando-se a participar nas aventuras
semelhantes às dos camaradas soviéticos ou cubanos. Não sem algumas excepções pontuais.
Os oficiais do Volksmarine |
A
presença militar da RDA em Moçambique
A delegação da RDA em Moçambique em 1981 |
A entrega da ajuda humanitária da RDA ao Moçambique |
O embaixador da RDA em Moçambique na cidade de Tete em 1981 |
Heinz Kessler em 1968 |
A
presença militar da RDA na Etiópia
Em
fevereiro de 1977, o poder no país foi tomado pelos militares, chefiados pelo
coronel Mengistu Haile Mariam. O novo poder, engajado em guerra contra Somália
e futura Eritreia, declarava a lealdade ao Moscovo, Havana e Berlim Oriental. Mengistu
enviava os apelos dramáticos de ajuda militar às embaixadas da URSS, Iémen do
Sul, Cuba e RDA: “O povo da Etiópia se sente isolado e abandonado, Camarada!” –
escreveu ele literalmente, num telegrama ao Honecker em agosto de 1977.
An-26 da RDA em África, década de 1980 |
Entre
1984 e 1988, primeiro quatro e depois cinco aviões de transporte da RDA se
baseavam no Corno de África, usados para combater as consequências da seca
catastrófica de 1984. Desde novembro do mesmo ano RDA usava para o efeito dois aparelhos
da sua força aérea e dois, pertencentes à companhia de aviação civil Interflug.
A operação secreta envolveu 41 pessoas, 22 oficiais e sub-oficiais do NVA e 19 funcionários
da Interflug.
Mais um An-26 da RDA em África, década de 1980 |
Quase
simultaneamente com as aeronaves da RDA, para Etiópia vieram três Transall C-160
da Força Aérea de Bundeswehr – oficialmente e sem nenhum segredo. Os C-160 baseiam-se
em Assab, na atual Etiópia,
depois em Dire Dawa e eram
usados do mesmo jeito dos aviões da RDA. Assim, podemos dizer que Etiópia
beneficiou de uma incomum cooperação alemã-alemã.
Os
An-26 transportavam os alimentos, material médico e vestuário. A operação
continuou até outubro de 1985, os aviões da RDA também tomaram a parte das
operações etíopes controversas de reassentamento populacional imposto. Ao
pedido do governo etíope os aviões do NVA voltaram em abril de 1986, desta vez na
qualidade da “força-tarefa do NVA da RDA”. O pessoal alemão foi apresentado oficialmente
como pertencente à Força Aérea da RDA. Dois An-26 foram colocados na capital
Addis Abeba.
Mais militares africanos com os fardamentos e equipamentos da RDA |
Para
garantir a sobrevivência do regime, Honecker, aprovou pessoalmente em 1988 e
novamente em 1989 o envio ao país dos grandes fornecimentos de armamento,
incluindo os blindados. Ações que não impediram a queda do Mengistu Haile
Mariam, derrubado em 1991. Um dos documentos internos da RDA, já em 1977
classificava o regime comunista da Etiópia como um “poço sem fundo”.
A contra-informação
consciente?
Os militares angolanos com fardamentos e equipamentos da RDA |
Em
aberto permanece a questão da origem destas informações. Os artigos da época
citavam os “especialistas em segurança” ou “analistas ocidentais”. Acredita-se
que as mesmas serviam aos interesses da África do Sul. A informação sobre milhares
de militares da RDA nas suas fronteiras trazia os benefícios tangíveis ao
governo de Pretória: confirmando a luta no sul de África como a parte do
conflito entre Leste e Ocidente, posicionando-se como um aliado natural do
Ocidente.
Como
tal, a ativação na RFA da imagem do velho inimigo – a RDA poderia ser a tática
bastante inteligente, do ponto de vista de sul-africano. A revista «Der Spiegel»
suponha em 1980 que os serviços de inteligência sul-africanos poderiam executar
a tarefa de propaganda e das RP com bastante facilidade. Após uma intensa
pesquisa nos arquivos, hoje é possível chegar à uma conclusão: o “corpo
africano de Honecker”, existia, grosso modo, na mente dos jornalistas, políticos
e agentes dos serviços secretos (fonte).
Bónus
Procurado
pelo coronel Gaddafi para pedir o envio dos militares do NVA a Líbia, Honecker hesitou
em fornecer mais do que a tecnologia militar. Honecker, no entanto, consentiu a
formação dos cerca de setecentos militares líbios nas academias da RDA, cobrando
a quantia módica de 27,2 milhões de dólares. No final, vieram apenas 283
formandos. O maior contingente dos futuros oficiais veio a RDA do Vietname, o
segundo maior – da Síria. No caso da Síria, a RDA foi ainda preparada para
renunciar à instrução política obrigatória: “Aos quadros militares sírios ...
não é exigida a formação sócio-científica”.
José Eduardo dos Santos na RDA, década de 1980 |
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