Hoje
veremos uma pitada daquilo que era a medicina na União Soviética, espreitaremos
as salas de operações, os quartos, apreciaremos os primeiros cartazes
soviéticos dedicados à epidemia de HIV-SIDA.
Muita
gente, até hoje, acredita que a medicina na URSS era gratuita, o que não é
inteiramente verdade. Dado que o Estado não produzia nada, apenas redistribuía
os benefícios produzidos pelos cidadãos. O “financiamento estatal” de medicina
era diretamente deduzido dos salários dos cidadãos comuns. Na verdade, era um
sistema gigante de seguro obrigatório – financiado de forma compulsiva (era
impossível recusar as deduções do salário), e que mesmo assim, funcionava
bastante mal.
Atenção!
Algumas imagens podem ferir a sensibilidade dos nossos leitores mais sensíveis.
01.
O contato do cidadão soviético com o sistema de saúde começava, geralmente, com
a chamada do médico de plantão – nos casos de urgência era chamada a
ambulância, e nos casos não urgentes – o médico do policlínico local,
responsável por atender uma determinada área urbana ou rural. Para chamar este
médico o cidadão tinha que ligar ao policlínico, explicar o seu problema, assim
como dizer a sua idade e o local de trabalho.
A
carga laboral destes médicos normalmente era bastante grande – às vezes até
várias dezenas de chamadas por dia, especialmente em novos bairros, com um
grande número de prédios de habitação de vários pisos, construídos maciçamente nas
décadas de 1970-1980. Havia casos em que as idosas solitárias chamavam o médico
apenas para medir a sua pressão arterial, o batimento cardíaco e para conversar.
02.
Os doentes com os problemas mais ou menos graves eram internados. Praticamente
todos os hospitais soviéticos tinham a mesma aparência burocrática – as paredes
pintadas de cores claras (principalmente azuladas ou esverdeadas), linóleo no
chão, camas de rede metálica sobre rodas. Opcionalmente, nos quartos se
encontravam as machucadas bacias de alumínio ou de esmalte amarela, com as inscrições
tortas de tinta vermelha – algo misterioso como “ZP-31-B” ou simplesmente “urina”
ou “para vomitar”.
Em
geral, os hospitais soviéticos eram instituições públicas bastante desconfortáveis,
com as enfermarias superlotadas. Existiam também os quartos de “luxo” para 2-4
pessoas (“para os veteranos da II G.M.”), etc., assim, como as unidades e até hospitais
especiais para a nomenklatura do partido (e camaradas estrangeiros), mas isso é
uma outra história.
03.
A sala de operações de padrão soviético. O paciente na foto está consciente,
provavelmente não fica muito contente em contemplar as grades nas janelas e mesas
de procedimentos.
04.
Arménia em 1988. Médicos tratam o menino afetado pelo terremoto de Spitak. Na
imagem vimos o típico armário expositório de vidro e uma cadeira giratória, bastante
comuns nos hospitais e em alguns escritórios soviéticos.
05.
Mais uma das vítimas de Spitak – os médicos efetuam a cirurgia na sua perna. Com
essa fina lona azulada nos hospitais da URSS cobriam tudo o que poderia estar
em contato com os líquidos, particularmente com o sangue. Mais uma coisa notável
na foto é o médico anestesista, ele segura na face do paciente a máscara de anestesia
geral – quem experimentou conta que era uma terrível porcaria.
06.
A maternidade. As mulheres que deviam parir eram tratadas nos hospitais
soviéticos sem muita cerimónia, de forma bastante grosseira. Em geral, era uma das
características das especificidades da sociedade soviética – a grosseria para
com os dependentes, os que precisavam de receber os serviços, o mesmo era muito
habitual no comércio.
A
licença de maternidade nem sempre existia na União Soviética. A constituição de
Estaline de 1936 declarou pateticamente a “igualdade de géneros” – no sentido
soviético isso significava que uma mulher deveria trabalhar algumas semanas
após o parto. No entanto, gradualmente os períodos da licença de maternidade
foram aumentados, chegando aos 2 anos, no fim da década de 1980.
07.
O parto. Na URSS eram usadas as seringas reutilizáveis e esterilizados em armários
especiais (muflas portáteis cromadas de forma semicircular). As agulhas também eram
reutilizáveis, e às vezes eram tão «cegas» que, literalmente, “rasgavam” a pele
do paciente.
08.
Os médicos com um recém-nascido, ligado ao dispositivo para monitorar a sua atividade
cardiovascular.
09.
A enfermaria infantil. As camas são
pequenas demais para as crianças já crescidas, e os funcionários do hospital
improvisaram, usando os cabos de vassouras e as ligaduras.
10.
A enfermaria para os mais crescidos. As
crianças liam para passar o tempo. A roupa de cama, muitas vezes, tinha as
inscrições “Ministério da Saúde” – aparentemente para não ser roubada pelo pessoal
de serviço (que roubava estes lençóis e fronhas na mesma).
11.
A foto de uma clínica dentária privada (organizada em forma de cooperativa) em
Moscovo. Geralmente, a odontologia na URSS era um verdadeiro terror contínuo, em
todos os sentidos – a obturações e extracção dentária, próteses... Não havia
nem os consumíveis, nem os analgésicos. O chumbo soviético lembrava cimento, era
de cor cinza ou mostarda amarela e mal se aguentava nos dentes.
12.
Mais fotos do consultório odontológico privado. No privado o tratamento já era melhor,
mesmo assim, a odontologia decente (com consumíveis e tecnologias modernas) apareceu
no espaço pós-soviético apenas nos meados – fim da década de 1990.
13.
O transporte em maca do toxicodependente em overdose. Não acreditem a quem dizer
que na União Soviética não havia viciados – simplesmente a imprensa soviética
ignorava, por completo, este problema.
14.
O centro de reabilitação para viciados em drogas. As meninas mostram as mãos
com as veias limpas de hematomas, que apareciam devido ao uso de drogas
injetáveis... No braço da menina à esquerda está a chamada “pulseira magnética”,
muito em voga nos últimos anos da existência da União Soviética; a sua
publicidade alegava que pulseira ajudaria a lidar com todos os problemas do
nosso tempo – desde as tempestades magnéticas, passando pelos nitratos e até a radiação.
15.
Mais fotos de centro de reabilitação; o enfermeiro verifica o pulso ao
ex-toxicodependente. Desde o início da campanha anti-álcool do Gorbachov,
muitos começaram a procurar outros meios para “relaxar” – bebiam água-de-colónia,
cheiravam a cola, acetona, gasolina, líquido anticongente, entre outros.
16.
Mais fotos do centro de reabilitação com as grades nas janelas...
17.
A enfermaria de psiquiatria de um hospital soviético – os criminosos psicóticos
frequentemente eram mantidos juntamente com os dissidentes, oponentes
ideológicos ao regime soviético, que também eram considerados de “anormais”.
18.
O jovem numa das unidades psiquiátricas em Vílnius, na Lituânia – ele desertou
do exército soviético. Na época, o regime pretendia fazer acreditar que só um
louco iria fugir do “exército mais avançado e justo dos operários e camponeses”.
Você não quer ir para Afeganistão para apagar da face da terra as aldeias inteiras
dos “contra-revolucionários”? Decididamente é louco!
19.
No final dos anos 1980 – início dos 1990 na União Soviética começaram falar
sobre o HIV-SIDA, este problema tornou-se real e tangível. Dentro de um ou dois
anos dos hospitais e clínicas desapareceram as seringas reutilizáveis e muflas
para a esterilização, apareceram as seringas descartáveis (frequentemente oferecidas
a União Soviética sob a forma de ajuda humanitária pelos países ocidentais, os
mesmos que até ai representavam o “capitalismo decadente”).
Um dos primeiros cartazes
soviéticos dedicados ao problema de HIV-SIDA/AIDS.
20.
Uma das primeiras pacientes soviéticas com diagnóstico de “HIV”. Na sua mesinha
de cabeceira há fruta e até a grande défice, o café (provavelmente brasileiro),
mas na época o diagnóstico significava a morte certa...
21.
A enfermeira tira a amostra de sangue de uma paciente com HIV.
22.
A imagem assustadora – dois pacientes com o diagnóstico de “SIDA/AIDS” em uma
das clínicas. Na época, na URSS não existia a terapia anti-retroviral e o
diagnóstico de SIDA (ou mesmo apenas HIV), de fato, significava a condenação...
23.
Os meios terapuêticos populares na URSS.
Por exemplo, a ventosaterapia
era usada nos casos de pneumonia, acreditava-se que o efeito do vácuo criado pelo
frasco, aumentasse a circulação linfática de sangue, permitindo a cura mais rápida
das inflamações. O método é realmente muito controverso, muitos médicos
modernos o consideram como efeito placebo – mas o ritual quase místico de lubrificação
com a vaselina, a ignição de algodão embebido em álcool e colocação dos frascos
nas costas, era capaz de produzir uma grande impressão :-)
24.
Mais um procedimento interessante – as crianças em pé, em frente de uma lâmpada
ultravioleta para que os tecidos dos seus corpos produzissem a vitamina “D”.
Este procedimento pretendia-se utilizar nas cidades nortenhas da URSS, em que
(especialmente no inverno) havia pouco sol. A foto foi tirada na cidade de Murmansk.
25.
A fisioterapia no sanatório em Pärnu, na Estónia. Os pacientes são pendurados
em bandagem especial na piscina de água salgada – acreditava-se que isso ajudaria
a curar alguns problemas da coluna.
25.
Duche Charcot –
o procedimento bastante comum nos sanatórios soviéticos. O corpo é massageado
com um forte jato de água, dirigido pela enfermeira à uma distância de cerca de
3-5 metros.
26.
A preparação dos banhos num dos sanatórios soviéticos.
27. O aquecimento
ultravioleta com uso de um aquecedor de UV. Em cima da máquina podemos ver uma ampulheta,
geralmente usada para medir o tempo do procedimento (@maxim-nm).
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