sexta-feira, junho 08, 2018

Rússia apaga os registos do terror comunista soviético

O Museu russo da História do GULAG denunciou a destruição de informações sobre cidadãos soviéticos – vítimas de repressões comunistas. Ação verdadeiramente orweliana, tomada na base de um Decreto secreto de 2014, classificado como “apenas ao uso de serviços”, informa o jornal russo Kommersant.  

Na Rússia, estão sendo destruídos, os cartões de registo de arquivos sobre as vítimas de repressões políticas, ação que se baseia numa ordem secreta interdepartamental, emitida em 2014. A denúncia partiu do diretor do Museu de História do GULAG, Roman Romanov. A destruição de cartões significa a destruição completa de informações sobre a presença de condenados no sistema soviética de campos de concentração – GULAG.
Roman Romanov, foto Dmitri Lebedev @Kommersant
O Centro de documentação do Museu de História do GULAG foi confrontado com informações inesperadas, que, podem ter consequências desastrosas para a história do GULAG e para a obtenção de dados sobre as vítimas da repressão política na URSS.

No caso de prisioneiro morrer ou for morto no GULAG, o seu processo pessoal era despachado para armazenamento intemporal. E se a pessoa era liberada, o seu processo era destruído, mas era aberta uma ficha de arquivo, que especificava o seu nome, data e local de nascimento, movimento do prisioneiro entre os campos de GULAG a data de liberação.

Até que um dos parceiros do Museu do GULAG, o pesquisador Sergey Prudovsky, soube sobre a prática de destruição destas fichas. Na primavera de 2018, ele estava à procura de informações sobre o camponês russo Fedor Chazov, vítima das repressões estalinistas.
Faça click para visitar a página do museu
O Ministério do Interior russo da região de Magadão informou que o processo pessoal do prisioneiro foi destruído em 1955, de acordo com a ordem da época. Verificou-se então, que a ficha de registo de arquivo também foi destruída. Quando se fez o ofício para perceber a razão dessa destruição, o chefe do Centro de Informação do Ministério do Interior russo na região de Magadão, Mikhail Seregin respondeu que a decisão foi baseada numa ordem inter-ministerial de 12 de fevereiro de 2014, classificada como “apenas para uso de serviços”, intitulada “Sobre aprovação das instruções da manutenção e utilização de referências operacionais centralizadas, registos criminalistas e de investigação, formados na base de organismos [do Ministério] do Interior da federação russa”. A ordem é assinada conjuntamente pelo Ministério do Interior, Ministério da Justiça, Ministério de Situações de Emergência, Ministério da Defesa, Serviço de Segurança Federal (FSB), Serviço Federal de Controlo de Droga, Serviço Alfandegário Federal, Serviço Federal de Segurança, Serviço de Inteligência Externa (SVR), bem como pelo Gabinete do Procurador-Geral e do Serviço de Correios do Estado. “O prazo de arquivamento das fichas dos condenados é de até (os presos) atingirem 80 anos de idade. O “prazo de validade” da ficha do camponês Chazov expirou em 1989, o documento foi destruído em 11 de Setembro de 2014”, – explicou na sua resposta oficial o chefe do Centro de Informação do Ministério do Interior de Magadão, Mikhail Seregin.

Os processos criminais de cidadãos são mantidos nos arquivos estaduais ou no arquivo do FSB. Mas todos terminam com a data da condenação e informações sobre o veredicto: fuzilamento ou GULAG. O fuzilamento é um caso terminal. Mas a informação, sobre o destino posterior do condenado (para onde foi enviado, as transferências entre os campos de concentração, a sua possível sobrevivência), se encontra apenas nas fichas, arquivadas no Ministério do Interior russo. No caso de destruição da ficha, toda essa informação é apagada para sempre. Parcialmente devido à disso, o número exacto de condenados durante os anos de repressão soviética é desconhecido. Somente em 1937-1938 houve mais de 1,7 milhão de detenções, sob acusações políticas. De acordo com as estimativas da ONG “Memorial”, o número total de vítimas de repressões soviéticas pode chegar aos 12 milhões.

Este não é o único exemplo de destruição de materiais. Em 2014, a moradora da região de Moscovo, Nina Trushina, tentou encontrar informações sobre seu parente, que foi condenado em 1939 e recebeu uma resposta do Ministério do Interior da região de Magadão de que essa ficha foi destinada para a destruição na base de ordens oficiais. Sra. Trushina entrou com uma ação no Tribunal Supremo / Suprema Corte da federação russa, ressaltando que a ordem que afeta seus direitos é classificada e não oficialmente publicada, o que contradiz a Parte 3ª do Art. 15º da Constituição russa. No entanto, o Tribunal/Corte não satisfez o seu pedido, indicando que a ordem contém informações secretas, e o decreto presidencial russo de 1996 permite não publicar oficialmente documentos relativos aos direitos das pessoas, se eles contêm as informações confidenciais, que, de acordo com o decreto presidencial russo, de 1997, pertencem às informações para uso de serviços.

O Tribunal Constitucional da federação russa também se recusou a aceitar as alegações da cidadã, explicando que a polícia russa mantém e destrói os dados pessoais com base na legislação russa.

Sem comentários: