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O massacre russo de Bucha e realizadores do filme «Russians at War» |
O filme “Russians at War” é a propaganda russa, embora menos importante e talentosa do que a obra de Leni Riefenstahl, o filme omite completamente a destruição
e os crimes de guerra cometidos pelo exército russo na Ucrânia.
A realizadora filmou o seu filme nos territórios das ditas «lnr» e «dnr», bem como em Moscovo (onde os jornalistas russos independentes não podem trabalhar).
Os acontecimentos do filme são de 2023. Trofimova passou sete meses diretamente com os militares na retaguarda e na linha da frente, salientando que realizou o documentário sem autorização e acreditação
do Ministério da Defesa russo (é impossível confirmar ou refutar as suas afirmações).
Na rússia atual não é possível, sem autorização do Ministério da Defesa russo e do FSB, ir durante seis meses com uma câmara até
à zona de combate do lado russo e aí filmar um documentário (também cheio de críticas às autoridades por parte dos soldados). E depois, com dinheiro estrangeiro de um Estado “hostil”,
montar o filme e o enviar para o Festival de Veneza. Tal operação simplesmente é impossível.
Quem é Anastasia Trofimova?
Trofimova nasceu em Moscovo. Antes de “Russos em Guerra”, fez vários filmes para e com a participação da corporação russa de propaganda estatal Russia Today (RT).
No seu filme não há um único convocado contra a sua vontade que tenha sido mobilizado. Não há wagneleiros nem ex-prisioneiros. Não existem fanáticos
convencidos.
Não há uma palavra sobre o porquê e em que circunstâncias a rússia invadiu Ucrânia. Nem um indício de crimes de guerra. Os soldados no ecrã
servem num batalhão médico ou sentam-se e aguardam comandos. Nenhum deles mata ninguém dentro ou fora do ecrã (embora alguns morrem).
Poderia Trofimova chegar à frente de combate sem permissão das autoridades russas?
Segundo Trofimova, na altura conseguiu convencer todos os seus superiores de que este trabalho era semelhante ao que os oficiais militares soviéticos faziam durante a Grande Guerra Patriótica
em Berlim. O “comandante máximo” da brigada disse-lhe: “É um bocado estranho, porque precisas disso?” “Eu disse: bem, ora, o evento principal. Ele disse-me: bem, não sei,
deixe-me pensar, fique quieto por enquanto e não se mostre. Não que o tenha permitido, mas também não o proibiu.”
No início ela viveu com o pelotão de apoio, depois passou para o serviço médico. No dia 17 de fevereiro, o batalhão deveria ir para a frente: Assim, cheguei
à frente [linha da frente] sem a autorização do comandante da brigada. Ele viu-me ali e disse, bom, o jornalista chegou, bom, que se foda.
Quão realista é esta história? Avaliação dos analistas militares da Meduza
A presença de civis nas tropas, incluindo repórteres de meios de comunicação social sujeitos à censura russa, com a permissão do comandante de uma
determinada unidade não é incomum. Por norma, esta é uma cooperação mutuamente benéfica: por exemplo, os “correspondentes militares” recebem um vídeo exclusivo das
unidades e, em troca, organizam a angariação de fundos para a compra de drones ou equipamento individual de guerra eletrónica.
Ora, naturalmente, um civil deve ser uma pessoa de confiança – por exemplo, um jornalista deve ter experiência de trabalho nos meios de comunicação estatais.
Não é por acaso que Anastasia Trofimova colaborou com a RT.
Não há um único herói ucraniano no filme (exceto Ilya, que luta pela federação russa), e a própria Trofimova admitiu que as pessoas que apoiam
Ucrânia não falaram com ela. Segundo a mesma, os heróis com tal posição ou se recusaram a falar com ela ou já tinham abandonado os locais onde estava a filmar.
Num comentário ao canal de televisão Dozhd, o realizador de documentários russo Vitaly Mansky elogiou o trabalho de Trofimova como “profissional” e “muito
importante”. Ao mesmo tempo, Mansky classificou a exibição do filme em Veneza como “um erro do festival”.
Por exemplo, em Veneza, em 1938, o muito profissional, talentoso e brilhante filme de Leni Riefenstahl “Olympia” ganhou mesmo o prémio principal. O prémio então,
porém, chamava-se nada mais nada menos que Taça Mussolini ou algo do género.
Assim, Riefenstahl realizou o filme “Triunfo da Vontade” - um trabalho muito mais profissional e muito mais talentoso do que “Russos em Guerra”. Mas depois este filme
foi proibido pelo Tribunal de Nuremberga, foi simplesmente proibida de ser exibido em público.
Não concordo [que este seja um filme anti-guerra]. Porque aqui, se há pathos, reside no facto de as mesmas pessoas estarem a lutar do lado russo, pessoas simples, com as suas
fraquezas, com as suas dores, com as suas desilusões. E que precisam de ser tratados com compreensão e compaixão. Não sei até que ponto esta simpatia aproxima o fim da guerra. <…>
De qualquer forma, é um truque. Há um momento assim. [As personagens dizem]: porque é que é esta guerra, porque é que estamos nesta guerra? Mas ninguém
depõe as armas e abandone a guerra. Todos continuam a lutar, a matar ucranianos, se orgulhar, a regozijar-se com isso.
Mansky disse ainda que ele próprio filmou militares na Ucrânia durante um ano - com acreditação das Forças Armadas da Ucrânia e “permissão
pessoal do [ex-comandante-chefe das Forças Armadas Valery] Zaluzhny”. Na Rússia, queria fazer uma cena - mas o operador de câmara que o estava a fazer, segundo Mansky, foi imediatamente preso. “E
aqui a pessoa viaja, passa por todos os postos de controlo, tira fotografias, chega quatro vezes, passa sete meses na frente de combate, ganha logo o uniforme militar e recebe fornecimentos. Bem, pessoal... Quem é que
eles querem que considere idiotas aqui? Não sei. Definitivamente eu não sou.
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