Yuri
Gagarin, primeiro homem no espaço, era dono de uma das viaturas mais exóticas
em toda a URSS: a arrojada Matra Djet V de cor azul celeste. O carro era uma oferta
do seu construtor francês e os camaradas do Bureau Político viam com maus olhos
a escolha “capitalista” do “cosmonauta soviético № 1”.
O
modelo Djet foi criado pela empresa “Automobiles Rene Bonnet”, que nasceu em
1961 da cisão da empresa “Deutsch et Bonnet (DB)”, criada em 1938 por René
Bonnet e Charles Deutsch. Os parceiros construíam as viaturas desportivas e os carros
para as corridas, tentaram participar na “Fórmula-1”.
Matra Djet V do Gagarin nas ruas de Moscovo |
Em
1961 Bonnet e Deutsch tiveram as suas divergências sobre uso dos motores,
Deutsch preferia Panhard e Bonnet escolheu Renault. Em 1962 Bonnet apresenta o
seu Djet — o primeiro sportcar em série com motor de potência média. Em 1965 a
empresa “Automobiles Rene Bonnet” foi comprada pela corporação aeroespacial Societe
General de Mechanique Aviation-Traction (Matra), fundada em 1946.
A
nova viatura era produzida e vendida sob a marca Matra-Bonnet e depois — Matra Sports.
Era
um carro leve com o quadro vertebral e o sistema progressivo de suspensão independente
e discos de travão em círculo. A carroçaria era feita de fibra de vidro,
assentada sobre a estrutura de aço. O motor com a caixa de velocidades virada para
trás se localizava atrás dos bancos do condutor e dos passageiros. As viaturas
eram equipadas com os motores Renault 8 de 65-70 cavalos (Djet I) ou na versão artilhada
com os motores Amedeo Gordini de 80 e 90 cavalos. As unidades desportivas
recebiam os motores Gordini de 80-100 cavalos. No entanto, o carro não poderia ser
chamado de muito rápido (embora era bastante elegante, possuindo o coeficiente
de aerodinâmica de 0,25).
O
modelo Matra Djet V, que encheu o olho de Gagarin no salão de aviação em Le
Bourget possuía o motor Renault de 70 cavalos e acelerava até 100 km/h em 13,2 segundos.
O modelo pesava apenas 600 kg, o que significa que a sua densidade de potência era igual aos 116 cavalos / tonelada. À título
de comparação “Porsche 911” da primeira geração com a densidade de potência de 126
cavalos/ton., ou “Lotus Elan” com a potência de 181 cavalos/ton., eram muito
mais rápidos. Ao mesmo tempo, Djet não era barato, custando 20.000 francos,
embora a viatura do Gagarin foi avaliada em 14.200 francos.
Gagarin
recebeu a sua oferta em 1965 mas usou a viatura poucas vezes. As razões disso são
várias: quer o descontentamento dos camaradas do Bureau Político pelo facto de
“cosmonauta soviético № 1” conduzir uma viatura exótica ocidental, quer as
dificuldades de garantir a sua manutenção. Além disso, os pneus de perfil altamente
profissional e bastante estreitos se dobravam nas curvas, o exigente e complexo
motor do “Renault”rosnava atrás dos bancos... Na maior parte do tempo, a
viatura estava estacionada no “Cidade das Estrelas” (o centro de preparação dos
cosmonautas soviéticos). Considera-se que a última viagem do Gagarin ao bordo
da sua Matra Djet foi efetuada no dia 2 de março de 1968 — foi o seu último dia
de estudos na academia da Força Aérea “Zhukovsky”, após disso cosmonauta passou
à trabalhar no “Centro de Preparação” de pilotos militares.
A viatura outrora pertencente ao Gagarin em fevereiro de 2007 |
Após
a morte do Gagarin no acidente de aviação em 27 de março de 1968, Matra Djet V ficou durante décadas estacionada na “Cidade de Estrelas”, desapareceu de vista
na década de 1990 e foi vendida em 2001 à um colecionador letão (ou lituano)
por, alegadamente, uma quantia módica de 1 milhão de dólares.
A
produção das Matra Djet foi parada em 1967, um ano antes da morte do Gagarin. Em
quatro anos foram fabricados entre 2000 à 1000 unidades. Graças às suas linhas
vanguardistas, para a época, o carro aparece em pelo menos três filmes: dois franceses
“Masculin, féminin: 15 faits précis” (1966) e “Joë Caligula – Du suif chez les dabes”
(1966) e o franco-italiano “L'Homme qui trahit la mafia” (1967).
...
e as ofertas socialistas
Em
1961, através de uma deliberação secreta do Conselho dos Ministros da URSS, o
estado soviético ofereceu ao seu “cosmonauta № 1” quase tudo, desde o apartamento
T3 até seis pares de cuecas. Os irmãos e irmã do Gagarin receberam a quantia de
1000 rublos cada (1695 dólares ao câmbio oficial da época).
O
que choca não é a lista das ofertas, mas é o facto do que o primeiro homem no
espaço recebeu não o dinheiro, que depois poderia gastar onde e como entender,
mas oferta em géneros (!), através da deliberação secreta (!) do mais alto órgão do
poder estatal soviético.
A
deliberação do Conselho dos Ministros da URSS sobre as ofertas ao Yu. A.
Gagarin
18 de
abril de 1961
SECRETAMENTE
1.
Reconhecer necessário oferecer, em nome do Governo da URSS, ao primeiro
cosmonauta soviético major Yuri Gagarin e aos membros da sua família uma
viatura “Volga”, uma casa, mobiliário e equipamentos em conformidade com o
anexo.
Cobrir
as despesas relacionadas através do fundo de reserva do Conselho de Ministros
da URSS.
2.
Instruir o Ministério da Defesa da URSS (camarada Malinowski) para alocar ao major
Gagarin Yu. A. o apartamento T3 no local do seu serviço.
O
Presidente do Conselho de Ministros da URSS
N.
Khrushchov
Adenda
à Deliberação do Conselho dos Ministros da URSS de 18 de abril de 1961 № 1037rs
1.
A mobília do quarto de dormir, da sala de jantar, do quarto infantil, do escritório,
da cozinha
2.
O automóvel “Volga” [Gaz-24]
3.
TV “Rubin”
4.
Radiola “Lux”
5.
Máquina de lavar roupa
6.
Geleira/geladeira
7.
Aspirador
8.
Tapeçaria
9.
Piano
10.
Roupa de cama – 6 jogos
11.
Cobertores – 2 peças
Equipamentos
para Yu. A. Gagarin
1.
Paletó demi-temporada
2.
Paletó leve de verão
3.
Gabardina
4.
Fato – 2 unidades (claro e escuro)
5.
Sapatos – 2 pares (pretos e claros)
6.
Camisas brancas – 6 pares
7.
Chapéu – 2 unidades
8.
Meias – 6 pares
9.
Roupa interior de seda – 6 pares
10.
Cuecas, camisetas – 6 pares
11.
Lencinhos – 12 peças
12.
Gravatas – 6 peças
13.
Luvas – 1 par
14.
Maquina de barbear elétrica – 1 unidade
15.
Dois conjuntos de uniforme militar (cerimonial e do dia-a-dia)
16.
Malas – 2 unidades.
Aos
dois irmãos e irmã do camarada Gagarin – 1000 rublos cada um.
Gestor
dos assuntos [económicos] do Conselho de Ministros da URSS
G. Stepanov
O
documento também lista os “equipamentos” para a esposa, os filhos, pai e mãe do
Gagarin. A radiola e alguns outros presentes ainda estão preservados na casa da
viúva do Gagarin – Valentina, no seu apartamento na “Cidade das Estrelas”.
Fonte @ IstPravda.com.ua
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