Os
apoiantes do ditador cubano oferecem ao Fidel Castro uma espécie de absolvição
histórica: “a ditadura [...] melhorou as condições de saúde e educação na ilha
caribenha”. O mito da ditadura benigna emerge, em outras formulações similares,
refletindo um consenso dos que, ao menos, recusam-se a elogiar fuzilamentos
sumários ou o encarceramento de dissidentes.
por:
Demétrio Magnoli, doutor em geografia humana pela USP, colunista do
jornal Folha de São Paulo
Temo
estragar a festa contando um segredo de Polichinelo: a Cuba pré-castrista exibia
indicadores de saúde e educação tão notáveis quanto os atuais. Fulgêncio
Batista dominou a política cubana durante um quarto de século, até a revolução
de 1959. Em 1937, no seu segundo ano de poder, instituiu o salário mínimo e a
jornada de oito horas, antes do Brasil (1940) e de qualquer país
latino-americano.
No
início da segunda década da “era Batista”, em 1955, a taxa de mortalidade
infantil em Cuba (33,4 por mil) era a segunda menor na América Latina. O
embargo económico dos EUA contra Batista (sim, Batista!) começou em 1957.
Naquele ano, a taxa de mortalidade infantil cubana (32 por mil) estava entre as
13 mais baixas do mundo, perto da canadense (31) e menor que as da França (34),
Alemanha (36) e Japão (40).
Atualmente,
segue baixa, mas já não está entre as 25 menores do mundo. No mesmo ano, Cuba
aparecia como o país latino-americano com maior número de médicos per capita
(um por 957) e a maior quantidade de calorias ingeridas por habitante (2.870).
Enquanto promovia centenas de execuções sumárias, o regime castrista conduziu
campanhas de alfabetização rural tão inúteis quanto o Mobral de Emilio Médici.
Como
no Brasil, o analfabetismo reduziu-se quase à insignificância pelo efeito
inercial da universalização do ensino básico. Mas Cuba partiu de patamar
invejável: as taxas de alfabetização de 1956, quando os guerrilheiros chegaram
à Sierra Maestra, colocavam a ilha na segunda posição na América Latina
(76,4%), bem à frente da Colômbia (62%) e do Brasil (49%).
Todas
essas estatísticas estão na série da anuários demográficos publicados pela ONU
entre 1948 e 1959, hoje disponíveis na internet. O jornalismo prefere
ignorá-las, repercutindo a cartilha de propaganda castrista. Batista fugiu para
a República Dominicana no Ano Novo de 1959. Se, na época, a Folha aplicasse o
critério que usa para Fidel, teria escrito que a ditadura de Batista “é
reconhecida por ter melhorado as condições de saúde e educação na ilha
caribenha”. Por sorte, não o fez: Cuba não foi salva por Fidel nem pelo tirano
que o precedeu.
Médicos
cubanos realizaram a primeira anestesia com éter em terras latino-americanas
(1847), identificaram o agente transmissor da febre amarela (1881) e
inauguraram a pioneira máquina de raio-X da América Latina (1907). Antes de
Batista, em 1931, a taxa de mortalidade geral cubana (10,2 por mil) era menor
que a dos EUA (11,1). Governos têm importância menor que a “história profunda”.
Nos
tempos coloniais, Cuba foi a “joia da coroa” espanhola no Caribe, um dos mais
dinâmicos centros hispano-americanos, atraindo uma numerosa elite económica e
intelectual. A excelente faculdade de Medicina de Havana, os hospitais e as
escolas do país nasceram no mesmo solo cosmopolita que produziu José Martí,
apóstolo da independência, a Constituição democrática de 1940 e o Partido
Ortodoxo, berço original do grupo revolucionário liderado por Fidel.
Dia
e noite já se sucediam em Cuba antes do triunfo final da guerrilha castrista,
na Batalha de Santa Clara. Frei Betto dirá que a presciente ONU falsificou
preventivamente as estatísticas colhidas na era pré-revolucionária para
presentear o imperialismo ianque com torpes argumentos anticastristas. Apesar
dele, os malditos anuários teimam em narrar uma história inconveniente (@fonte
pública; fonte
apenas para os assinantesl).
Hasta
siempre, Comandante!
*
O título do artigo e o 1º parágrafo introdutório foram modificados pelo nosso
blogue.
Ver
como era Cuba antes do Castro:
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