domingo, dezembro 04, 2016

A saúde e educação da Cuba pré-castrista *

Os apoiantes do ditador cubano oferecem ao Fidel Castro uma espécie de absolvição histórica: “a ditadura [...] melhorou as condições de saúde e educação na ilha caribenha”. O mito da ditadura benigna emerge, em outras formulações similares, refletindo um consenso dos que, ao menos, recusam-se a elogiar fuzilamentos sumários ou o encarceramento de dissidentes.

por: Demétrio Magnoli, doutor em geografia humana pela USP, colunista do jornal Folha de São Paulo

Temo estragar a festa contando um segredo de Polichinelo: a Cuba pré-castrista exibia indicadores de saúde e educação tão notáveis quanto os atuais. Fulgêncio Batista dominou a política cubana durante um quarto de século, até a revolução de 1959. Em 1937, no seu segundo ano de poder, instituiu o salário mínimo e a jornada de oito horas, antes do Brasil (1940) e de qualquer país latino-americano.

No início da segunda década da “era Batista”, em 1955, a taxa de mortalidade infantil em Cuba (33,4 por mil) era a segunda menor na América Latina. O embargo económico dos EUA contra Batista (sim, Batista!) começou em 1957. Naquele ano, a taxa de mortalidade infantil cubana (32 por mil) estava entre as 13 mais baixas do mundo, perto da canadense (31) e menor que as da França (34), Alemanha (36) e Japão (40).
Atualmente, segue baixa, mas já não está entre as 25 menores do mundo. No mesmo ano, Cuba aparecia como o país latino-americano com maior número de médicos per capita (um por 957) e a maior quantidade de calorias ingeridas por habitante (2.870). Enquanto promovia centenas de execuções sumárias, o regime castrista conduziu campanhas de alfabetização rural tão inúteis quanto o Mobral de Emilio Médici.

Como no Brasil, o analfabetismo reduziu-se quase à insignificância pelo efeito inercial da universalização do ensino básico. Mas Cuba partiu de patamar invejável: as taxas de alfabetização de 1956, quando os guerrilheiros chegaram à Sierra Maestra, colocavam a ilha na segunda posição na América Latina (76,4%), bem à frente da Colômbia (62%) e do Brasil (49%).

Todas essas estatísticas estão na série da anuários demográficos publicados pela ONU entre 1948 e 1959, hoje disponíveis na internet. O jornalismo prefere ignorá-las, repercutindo a cartilha de propaganda castrista. Batista fugiu para a República Dominicana no Ano Novo de 1959. Se, na época, a Folha aplicasse o critério que usa para Fidel, teria escrito que a ditadura de Batista “é reconhecida por ter melhorado as condições de saúde e educação na ilha caribenha”. Por sorte, não o fez: Cuba não foi salva por Fidel nem pelo tirano que o precedeu.
Médicos cubanos realizaram a primeira anestesia com éter em terras latino-americanas (1847), identificaram o agente transmissor da febre amarela (1881) e inauguraram a pioneira máquina de raio-X da América Latina (1907). Antes de Batista, em 1931, a taxa de mortalidade geral cubana (10,2 por mil) era menor que a dos EUA (11,1). Governos têm importância menor que a “história profunda”.

Nos tempos coloniais, Cuba foi a “joia da coroa” espanhola no Caribe, um dos mais dinâmicos centros hispano-americanos, atraindo uma numerosa elite económica e intelectual. A excelente faculdade de Medicina de Havana, os hospitais e as escolas do país nasceram no mesmo solo cosmopolita que produziu José Martí, apóstolo da independência, a Constituição democrática de 1940 e o Partido Ortodoxo, berço original do grupo revolucionário liderado por Fidel.

Dia e noite já se sucediam em Cuba antes do triunfo final da guerrilha castrista, na Batalha de Santa Clara. Frei Betto dirá que a presciente ONU falsificou preventivamente as estatísticas colhidas na era pré-revolucionária para presentear o imperialismo ianque com torpes argumentos anticastristas. Apesar dele, os malditos anuários teimam em narrar uma história inconveniente (@fonte pública; fonte apenas para os assinantesl).

Hasta siempre, Comandante!

* O título do artigo e o 1º parágrafo introdutório foram modificados pelo nosso blogue.

Ver como era Cuba antes do Castro:

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