Anna era uma das alunas de escola №2, alvejada pelas forças russas | foto @Roland Leon/Sunday Mirror |
As crianças ucranianas da região de Donbas “não conseguem imaginar a vida sem
tanques e armas”, reportagem sobre como o conflito promovido pela Rússia enfurece, ao
deixar as pessoas da área sem aquecimento, eletricidade ou água.
por:
Alan Selby, Sunday Mirror
(Grã-Bretanha)
De
pé nos escombros de sua escola, Anna, de 13 anos, lembra o dia em que as bombas
caíram: “Nós estávamos brincando fora quando o bombardeio começou. Nós tivemos
que correr para se [salvar]”.
Enquanto
ela fala, os amigos arriscam suas vidas por perto jogando futebol em alguns dos
campos mais minados do planeta.
Esta
não é a Síria, nem a Palestina. Esta é a guerra esquecida às portas da Europa [Ocidental],
que até agora custou a vida de 3.000 civis.
É
Krasnohorivka, a um quilómetro da linha de frente, onde a Rússia de Vladimir
Putin travou uma batalha de quatro anos ao longo da fronteira leste da Ucrânia.
Crianças desenham a guerra. O helicóptero nem sequer é militar, mas é fonte do medo. Foto @ Roland Leon/Sunday Mirror |
A
região de Donbas tornou-se famosa [na Grã-Bretanha] em 2012, quando sua
capital, Donetsk, recebeu a equipa / o time de futebol da Inglaterra para [aqui
fazer] dois jogos do Campeonato Europeu de futebol / da Eurocopa 2012.
No
final deste ano [2018], companhias aéreas de baixo custo começarão com voos de 19,99
libras para levar turistas do Reino Unido à Ucrânia em voos de três horas.
No
entanto, centenas de crianças já morreram ao longo desta linha de frente – e para
muitos dos 220 mil jovens que ainda estão apanhados no conflito de Putin, há
apenas um eco de uma infância normal.
“Antes
do conflito, este era um lugar feliz”, diz a diretora de Anna, Olena Mikhatska. “A
cidade era tão bonita. Você ouviria crianças rindo – a escola estava viva.
Agora o único som é o silêncio.
Silêncio,
isto é, mas para o constante cenário de combates entre tropas ucranianas e
rebeldes apoiados por russos.
Quando
os combates estavam mais fortes por aqui, mais da metade da população fugiu –
cerca de 13.500 pessoas. Vários milhares ainda estão para retornar. Por quatro
anos Krasnohorivka não teve gás ou eletricidade. No inverno, as temperaturas
podem cair para menos de 20ºC.
Na
semana passada [28/04/2018], a água potável para 600 mil pessoas na região foi
cortada após um ataque à estação de filtragem da cidade.
Morteiros
e mísseis Grad, como aqueles que destruíram a escola e o hospital, podem ser
ouvidos a quilómetros de distância.
A
Sra. Mikhatskaya disse: “Isso quebra meu coração, os danos a essas crianças
durarão a vida toda. O conflito os aprisionou”.
Edifícios destruídos pela guerra russo-ucraniana | foto @Roland Leon/Sunday Mirror |
[A
ONG] Save the Children, que oferece apoio para salvar vidas no local, diz que
um em cada quatro jovens sofre traumas psicológicos. Margaux Dessus, Gestora de
Desenvolvimento de Programas e de Qualidade, disse: “Há alguns meses, vimos um
caso de uma criança que pegou um artefato não detonado e tentou desmantelá-lo.
Ela perdeu as duas mãos. Temos visto crianças de 12 ou 13 anos de idade, tão
desesperadas que são forçadas a 'sexo de sobrevivência', prostituindo-se por
comida. Isso [acontece] às portas da Europa [Ocidental]”.
Mais
ao norte, outra aldeia fica diretamente na linha de frente. Sua localização
precisa deve ser mantida em segredo, pois os moradores temem represálias por
falarem. Dezenas de alunos devem cruzar a linha [da frente] aqui só para chegar
à escola. Esta, pelo menos, ainda está de pé - embora cercada por sacos de
areia depois de suas janelas terem sido destruídas anos atrás.
O
deputado local, Pavlo Stranadko diz que em 2015 a vila foi alvejada durante
três dias, perdendo um quarto dos seus edifícios.
Quando
o Sunday Mirror a visitou, seis obuses explodiram nas proximidades – ecoando
pela praça. Stranadko disse: “Nós temos uma piada – o lugar mais seguro é onde
estão os militares. Não está aqui”.
Cartazes
escolares dizem às crianças como evitar bombas e minas que não explodem.
Natália e Olexander Krasavchenko, o marido e pai deles morreu, pisando a mina terrestre. Foto @ Roland Leon/Sunday Mirror |
Natália
Krsavchenko ganha apenas [o equivalente às] 140 libras por mês como professora
aqui – um bom salário para a região. Ela contou como seu marido Sergei/Serhiy
foi morto por uma mina: “Ele estava apanhando a lenha com amigos. Pisou na mina
e eles assistiram ele à morrer. Eles não me deixariam ver seu corpo".
Análise
de especialistas: Professor Mark Galeotti de Instituto de Relações
Internacionais em Praga:
Esta
é uma guerra que Putin começou a tentar quebrar a resistência da Ucrânia, para
a fazer aceitar que era um estado fantoche russo.
É
uma guerra do império de Putin e só vai acabar quando ele quiser.
A
tragédia é que ninguém quer o próprio Donbas – a Rússia entrou [aqui] para
pressionar Kyiv. Ele [Putin] queria que o governo [ucraniano] percebesse que [Donbas]
fazia parte da esfera de influência russa.
Isso
não funcionou, mas a Rússia não pode recuar agora, já que iria parece uma
derrota. Putin não pode sair à menos que ele possa ter o momento de missão
cumprida. Ele poderia esmagar Ucrânia, mas goteja apenas tropas suficientes
para manter as coisas funcionando.
Nove
dias depois, quando sua família se reuniu para lamentar, um morteiro caiu no
quintal deles. Natalia disse: “Eu ouvi um estrondo, vi um flash através da
janela. Eu disse adeus a minha vida. Penso se teria sido melhor – mas eu tenho
que ficar forte por causa dos meus filhos”.
Seu
filho Olexander, de 15 anos, é endurecido pelos horrores. Ele disse:
“Acostumamo-nos à se esconder no porão. Mas agora eu posso perceber o quão
longe estão os armamentos, dependendo do seu som. Se sabemos que o bombardeio
não está tão próximo, continuamos jogando futebol”.
Em Avdiivka, uma das
vilas [da linha da frente] mais atingidas, metade dos 40.000 habitantes fugiram
e ruas inteiras foram destruídas. Irina Strelets, supervisora de um clube após-a-escola da Save the Children, disse: “Elas [crianças] desenham campos com
relva/grama e árvores. Mas ao lado das árvores estão os tanques. Elas não podem
imaginar a vida sem tanques e armas. A única coisa que a maioria delas se lembra é
a guerra”.
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