Frederico Carvalhão Gil em Kyiv na Ucrânia em julho de 2007 @Facebook |
O Ministério Público
(MP) do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) deduziu
acusação contra dois arguidos pela prática dos crimes de espionagem, violação
de segredo de Estado e de corrupção activa e passiva agravadas. Um dos arguidos
é Frederico Carvalhão Gil de nacionalidade portuguesa e funcionário do Serviço
de Informações de Segurança de Portugal (SIS) e o outro, de nacionalidade
russa, Sergey Nicolaevich Pozdnyakov, integra os quadros do Serviço de
Inteligência Externa (SVR) da federação russa.
Amadeu Guerra, o diretor do DCIAP @JORGE AMARAL / GLOBAL IMAGENS |
Foto @Facebook |
As provas recolhidas ao
longo do último ano permitiram confirmar, no entender dos investigadores, os
piores receios: o espião traiu Portugal vendendo ao inimigo russo informações
sobre a segurança nacional, a defesa da NATO e sobre as secretas portuguesas,
comprometendo estes sistemas e entidades. Tudo terá começado desde, pelo menos,
2011, com encontros em quase duas dezenas de países, e as informações de
Carvalhão eram consideradas de qualidade e bem pagas – uma média de 10 mil
euros por “pacote”. Era esse o valor que tinha com ele quando foi detido, em
Itália, quando se encontrava com o seu cúmplice da SVR. O material apreendido
ao agente russo, Sergey Pozdnyakov, ajudou também a sustentar a convicção dos
investigadores sobre a espionagem.
A dimensão do prejuízo
que pode ter causado à credibilidade do país e à própria segurança da NATO é
considerada “incalculável” e os investigadores estão cientes da dificuldade de
fazer a prova deste impacto em tribunal. Sabem o que têm em mãos: dezenas de
documentos com classificação de segurança de interesse para o governo russo,
valores apreendidos, contas bancárias passadas a pente fino, vigilâncias e
escutas. Sabem que Carvalhão Gil extraiu do SIS relatórios secretos, que não
podiam ter saído do serviço, e que os tinha em sua casa, violando o segredo de
Estado.
Entre eles, noticiou a
revista portuguesa Sábado,
relatórios sobre exercícios da NATO – foi representante do SIS em várias
reuniões de preparação destas operações que serviam para identificar vulnerabilidades
– expondo o sistema de defesa da Aliança Atlântica. Foram também encontrados na sua casa
e, possivelmente, na posse de Pozdnyakov, listas de funcionários e fontes das
secretas portuguesas, com respetivos contactos e perfis (Sic !), incluindo dos dirigentes
e ex-dirigentes. “Não há dúvidas sobre o interesse do SVR em tudo isto,
principalmente sobre a segurança da Aliança Atlântica. Conseguiram com esta
toupeira, de um país aliado da NATO, uma “porta” para espiar todos os
movimentos”, afirma uma fonte que acompanha o caso.
Frederico Carvalhão Gil possivelmente em Tbilissi na Geórgia @Facebook |
Ao ponto de constatarem
que falhas em operações de contra-espionagem, relacionadas com os serviços
russos em Portugal, se deveram mesmo a fugas de informação cujo autor só
poderia ter sido Carvalhão Gil.
O secretário-geral do
Sistema de Informações da República Portuguesa (SIRP) garantiu por isso, num
encontro com jornalistas, em junho de 2016 que “após um período de averiguações
internas, desencadeadas por terem sido detetados indícios de comprometimento de
atividade operacional na área da contra-espionagem, e do apoio prestado pela
cooperação internacional, recolheram-se elementos seguros sobre a realização de
encontros clandestinos no estrangeiro entre um funcionário do SIS e um outro de
um serviço de informações estrangeiro” (fonte).
Faça click para ler o documento da PGR (em PDF) |
No seu comunicado
oficial de 8 de junho de 2017, o Ministério
Público (PGR) de Portugal explica que de acordo com acusação, o arguido
funcionário do SIS foi recrutado pelo SVR para, a troco de pagamento de
quantias em dinheiro, prestar informações cobertas pelo segredo de Estado a que
acedia em razão das suas funções. Em causa, estão os documentos secretos
relacionados com a defesa da NATO, informações pessoais e profissionais de
agentes das secretas, incluindo altos dirigentes e dados sobre as capacidades
das polícias portuguesas e o seu plano de coordenação.
Segundo a PGR: “apurou-se,
em concreto, a realização de três encontros entre o arguido funcionário do SIS
e o oficial da SVR acusado. Tendo tido conhecimento antecipado dos planos de
realização de um encontro entre os dois, em Roma, no dia 21 de maio de 2016, o
MP, previamente, expediu Carta Rogatória às autoridades italianas, para
acompanharem a movimentação dos arguidos e confirmarem e vigiarem o encontro
dos então suspeitos. Para acompanharem a realização das diligências
deslocaram-se a Roma três elementos da Polícia Judiciária”.
Adianta ainda a PGR que
“na posse do oficial do SVR foi encontrado e apreendido, designadamente, um
documento manuscrito que lhe havia sido entregue pelo funcionário do SIS,
contendo informação que foi considerada protegida pelo segredo de Estado. Já ao
funcionário do SIS foram apreendidos diversos documentos e objetos bem como a
quantia de euro10.000,00 (dez mil euros), montante que lhe havia sido entregue
pelo oficial do SVR, como contrapartida das informações que indevidamente
recebera”.
Em junho de 2016, o
Tribunal de Recurso de Roma, tinha negado tanto a liberação do Pozdnyakov,
tanto a sua prisão domiciliar no “Centro de ciência e cultura russa”. Na
altura, a sua advogada, Tatiana Della Marra [falante de russo e próxima da
embaixada da Rússia em Roma], argumentava
que o espião russo tem o direito de imunidade “porque está na posse de um
passaporte diplomático, mesmo que este não foi credenciado junto às autoridades
italianas”, informava o diário italiano Repubblica.
Advogada Tatiana Della Marra @Iltirreno.gelocal.it |
As autoridades
portuguesas assinalam que as congéneres italianas [possivelmente pressionadas pelas contrapartes russas] libertaram
o espião russo, que não pode ser interrogado no âmbito do inquérito e é “desconhecido
o atual paradeiro”.
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