Discotecas
sempre existiam na União Soviética, embora a palavra começou ser empregue desde
o início da década de 1980. O local servia de montra de status, onde os jovens mostravam
a sua melhor roupa e calçado, tentavam arranjar algum namoro, evitando o assédio
(elas) ou violência (eles).
As repressões em massa e as guerras das décadas de 1930-40, atingiram, primeiramente, os homens, as mulheres são obrigadas à dançar com outras mulheres |
Os militares soviéticos e ocidentais numa matiné soviética, década de 1940 |
As
matinés eram organizados em Casas e Palácios da Cultura, clubes desportivos, no
tempo quente nos parques públicos, sob o céu aberto. A entrada geralmente custava
50 copeque, para que os mais atrevidos não pulassem o murro sem pagar, este era
untado com óleo queimado. Além disso, nos locais estava presente a milícia de
segurança pública que zelava pela segurança do evento. Outro problema era a
violência, as meninas iam para a discoteca em grupos para evitar assédio (que
podia acabar mesmo em estupro), os rapazes iam obrigatoriamente em grupos, pois
não era nada raro os eventos acabarem em pancadaria, iniciada pelos rufias locais
contra os “forasteiros”, aldeia contra aldeia, bairro contra bairro. Não havia (e
nem podiam existir) os clubes e locais especializados só para dançar. Os homens e mulheres soviéticos deveriam construir o comunismo, danças eram toleradas, mas não mais
que isso.
O
filme soviético “Pequena Vera” (1988), filmado na atual cidade
ucraniana de Mariupol:
03.
No fim da década de 1970 nestas matinés tocavam as bandas (oficialmente
chamados de VIA: “conjunto vocal-instrumental”) que copiavam, de forma semiclandestina,
o pop-rock ocidental. A música ocidental não era bem-vinda na União Soviética,
várias bandas e cantores eram proibidos (por exemplo, Julio
Iglesias, ainda em 1985 era acusado na URSS de propagar o “neofascismo”!)
Como tal, os VIA, tocavam os ritmos ocidentais, por vezes até usavam os “looks”
bastante ocidentalizados, mas os seus textos eram ideologicamente próximos à
propaganda soviética (“te conheci num campo de flores, apaixonamo-nos e fomos
juntos trabalhar numa obra de construção civil”) ou, então, absolutamente
neutros (“por uma semana, até o dia dois, vou viajar à vila do sol”).
Década de 1970, mini está na moda |
Na
foto podemos ver o clássico conjunto musical (VIA) da década de 1970: cabelos
compridos à “The Beatles”, calças “boca-de-sino”, as golas de camisas colocadas
por cima das golas de casacos. Na URSS praticamente não existiam os instrumentos
musicais de boas marcas, tipo Fender ou Gibson (eram comprados pelos Estado
apenas para os artistas, pertencentes à elite musical soviética), por isso os
VIA locais usavam os instrumentos fabricados nos países socialistas, cmo Iolana
checoslovaca, Musima da RDA, as guitarras soviéticas, conhecidas no meio como
“pás”, “remos” e “lenha”. Os rapazes na foto em cima usam este tipo de instrumentos: o
baixista está com Orpheus búlgaro de quatro cordas, vocalista tem Ural-650 soviético, 2º guitarrista alguma coisa parecida com guitarra semi-acúsctica de
12 cordas, produzida em Leninegrado.
As
composições, mesmo as ideologicamente aprovadas, eram escritas pelos bons
compositores, o teor dos textos não se escutava muito por causa da má qualidade
do som, como tal, a música era consumida sem, realmente fazer grande diferença
em termos de propaganda.
Os
VIA tocavam nos matinés, nos restaurantes, ganhavam muito dinheiro nos casamentos,
onde em 2-3 dias de atuação recebiam 400-500 rublos (677-847 dólares ao câmbio
oficial da época), quase 6 salários mínimos, equivalente ao salário de um
professor catedrático numa universidade soviética.
A
discoteca na URSS, cidade de Ufa, maio de 1989:
04.
As discotecas propriamente ditas começaram surgir no início da década de 1980, algumas
fontes apontam Letónia como o local, onde foi aberta a primeira discoteca legal
na URSS. O que pode ser perfeitamente verdade, pois os Países Bálticos:
Letónia, Lituânia e Estónia sempre eram pioneiros de introdução dos conceitos
novos e liberais na sociedade cinzenta soviética.
VIA à tocar num parque público, década de 1980 |
"Moradores de Tomsk! Celebraremos de forma digna o 100º aniversário do Lenine!" (atual cidade russa de Tomsk, 1970) |
Os
bons disc jockey usavam as consolas de realizadores de som (como “Eletrônica” da
série PM) – o som era possível reproduzir quer em colunas gerais à pensar no
público, quer em fones de ouvido (este canal no controlo era assinalado como “telefones
estéreo”). Além disso, o controlo permitia iniciar as músicas, uma após a
outra, quase sem as pausas, usando o controlo de volume – uma função muito útil.
A
mesa do disc jockey na década de 1980:
05.
Uma foto muito boa da mesa do disc jockey bem cotado da época. Podemos ver dois
gravadores de bobinas (algo como “Saturn”, “Astra” ou “Mayak”), na mesa à
direita dois gravadores de cacete, algo como “Vilma-102 estéreo" — na
altura chamados de “gravador-extra”. Não se sabe o que está na mala na cadeira,
possivelmente o comando de luz, a chamada “música-luz”.
As
colunas em ângulo (de dois tipos, do campo próximo e mais afastado) – eram
usadas para que disc jockey poderia ouvir o som que tocava na sala. No pescoço
do disc jockey estão os fones de ouvido (os tais “telefones estéreo”). Amizade
com disc jockey era muito importante, receber um cumprimento do aniversário ou
conseguir que toquem a música predileta era visto como algo quase celestial.
06.
A mesa do disc jockey muito mais simples — provavelmente a discoteca estudantil.
07.
A música tocada era uma mistrura de
rock-pop ocidental com os cantores oficiais soviéticos, casos de Alla Pugacheva
ou Veleriy Leontiev. Com início da Perestroika, a censura soviética foi
afrouxando gradualmente e então as discotecas começaram tocar quase totalmente
as composições ocidentais: ABBA, Modern Talking, CC-Catch, Boney M., Dschinghis
Khan (em 1985 na URSS ainda era considerado como veículo de propaganda de “nacionalismo
e anticomunismo”), Eruption, Bad Boys Blue, Sandra, Ottawan, Arabesque,
cantores italianos Toto Cutugno e Adriano Celentano. Nos últimos anos da
existência da URSS se tornam populares as bandas como Depeche Mode, Pet Shop Boys,
Erasure.
Dschinghis Khan, “Moskau” (1979):
O
programa musical era formado por 4-5 músicas rápidas e depois seguia um “slow”,
durante qual era possível convidar à dança uma menina que caísse no olho ao
passar as músicas rápidas. O “slow” era novamente seguido pelas composições rápidas.
Quase obrigatoriamente existia a “dança branca”, em que as meninas podiam
convidar os rapazes.
08.
“Slow” numa discoteca na escola, década de 1980:
09.
O dress code. Quer os rapazes, quer as meninas queriam mostrar-se da melhor
maneira possível, por isso vestiam tudo do melhor que tinham. Quando discoteca era
organizada pela juventude comunista Komsomol, então não eram bem vistos os cabelos
longos em homens, as roupas ocidentais de moda e geralmente o look considerado “hippie”.
Por vezes, na entrada estavam os responsáveis que mediam o cumprimento dos cabelos
dos rapazes e a largura das suas calças. Quem tiver o cabelo demasiadamente cumprido
ou calças demasiadamente largas para os padrões soviéticos, não eram permitidos
à entrar. No entanto, com início da Perestroika essas limitações, se não
desapareceram completamente, diminuíram bastante.
Década de 1970 |
Início da década de 1980 (moda de outono-inverno) |
Fim da década de 1980 |
"Entrada de JEANS ao local dançante é PROIBIDA!" |
11.
Atualmente, as discotecas como uma forma especial de recreação praticamente
desapareceram, as pessoas dançam em clubes profissionais, com o equipamento e programa
de entretenimento apropriado. “Os matinés dançantes” ainda sobrevivem em algum
interior profundo, em forma parecida como na foto (na foto em baixo: a discoteca algures na Rússia,
década de 2010):
Fotos Internet | Texto @Maxim Mirovich | @Ucrânia
em África
Bónus
Início
da década de 1990, algures na Ásia Central pós-soviética. Os
homens e mulheres dançam sem tirar os seus goros de pele (senão os podem roubar);
hit dos hits de momento “American Boy” (1991):
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