domingo, março 16, 2025

Tragédia de Odessa de maio de 2014 no acórdão do TEDH

11 anos depois, o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH), analisou os eventos em Odessa em 2 de maio de 2014, estabelecendo dois fa(c)tos: a impotência do estado ucraniano e a malícia do estado russo, que propositalmente fez de tudo para organizar um massacre em massa em Odessa. 

Pela primeira vez temos uma decisão de um tribunal internacional que indica claramente o envolvimento da rússia na organização de confrontos e derramamento de sangue em Odessa. 

Vejamos os pontos mais importantes do acórdão: 

«334. O Tribunal já estabeleceu o sério envolvimento da federação russa nos eventos que levaram ao chamado “referendo” na Crimeia, bem como seu diverso apoio às formações separatistas no leste da Ucrânia. O Tribunal também levou em consideração a natureza muitas vezes oculta desse envolvimento». 

«336. Várias evidências de vídeo disponíveis publicamente confirmam que o movimento pró-rússia «Kulykove Pole» em Odessa se baseou fortemente em mensagens de desinformação e da propaganda agressivas e emocionais sobre o novo governo ucraniano e os apoiantes do Maydan, expressas pelas autoridades e pela mídia russas. (...) O tribunal acredita que tal desinformação e propaganda podem ter influenciado os trágicos eventos nesses casos. A este respeito, ele observa o seguinte fa(c)to indiscutível. Os confrontos de 2 de maio de 2014 em Odessa começaram com um ataque de um grupo de ativistas do movimento anti-Maydan à uma marcha de apoiantes da unidade ucraniana, sob o pretexto de que estes planeavam destruir o acampamento «Kulykove Pole», embora os apoiantes da unidade ucraniana não tenham se desviado da rota planeada e não tenham dado um único passo em direção ao «Kulykove Pole». 

Militantes pró-rússia em marcha: «Morte aos fascistas | Glória à Rus(sia)»

O Tribunal reconhece a responsabilidade da rússia na organização de protestos e na violência anti-ucraniana em Odessa. Afirma-se que a rússia incitou o ódio por meio de desinformação e da propaganda, e que os confrontos começaram com um militantes pró-russas e anti-Ucrânia atacando um grupo pró-Ucrânia, e não o contrário, como alega a propaganda russa. 

«337. O Tribunal também considera apropriado observar que, conforme estabelecido pelas autoridades ucranianas e confirmado, pelo menos até certo ponto, pelas declarações do Sr. Dmytriev (requerimento n.º 59339/17) e pelas provas em vídeo disponíveis publicamente, um dos oficiais superiores da polícia regional (ucraniana), o Sr. Fuchedzhi forneceu várias formas de apoio ao movimento anti-Maydan em Odessa ou pelo menos conspirou com ativistas anti-Maydan para organizar tumultos em massa. Além disso, embora a revolução de Maydan tenha levado a mudanças nas autoridades nacionais em alto nível, a composição da polícia, que já havia observado passivamente a violência contra apoiadores e jornalistas de Maydan, em particular em 19 de fevereiro de 2014, permaneceu a mesma. Nessas circunstâncias, o risco de confrontos violentos poderia surgir, em particular, de um possível conluio entre a polícia e ativistas do movimento anti-Maydan e, portanto, a capacidade do novo governo ucraniano de administrar esse risco foi significativamente limitada». 

Vice-chefe da polícia de Odessa Dmytro Fuchedzhi acompanhando os militantes anti-Ucrânia

Aqui, o Tribunal reconhece que o novo governo ucraniano, surgido após o Maydan não controlou totalmente a situação em Odessa, e a polícia local de Odessa não obedeceu à liderança do Ministério do Interior da Ucrânia, mas, em vez disso, conspirou com militantes pró-rússia e contribuiu para a violência. 

A decisão do tribunal menciona Dmytro Fuchedzhi. Em 2014 era o vice-chefe de polícia na região de Odessa. Em 2 de maio, ele apoiou abertamente militantes armados pró-rússia, chegando a participar de confrontos ao lado deles. Imediatamente após esses eventos, possivelmente no dia 6 de maio de 2014, ele fugiu para a rússia, participando no esforço de propaganda russa. Na rússia, ninguém o responsabilizou por sua ação ou a inação no dia 2 de maio. 

O tribunal entende que a culpa do governo ucraniano reside no seguinte: 

«343. O Governo (da Ucrãnia) não forneceu ao Tribunal quaisquer exemplos de quaisquer medidas operacionais preventivas ou de proteção tomadas. Pelo contrário, eles admitiram, citando os resultados de investigações internas, que as autoridades policiais ignoraram as informações disponíveis e os sinais de alerta relevantes e se prepararam para uma partida de futebol de rotina em 2 de maio de 2014. Não houve qualquer esforço para reforçar, quantitativa ou qualitativamente, a força policial que ali estava naquele dia para manter a ordem pública na cidade». 


Os militantes pró-russos armados, protegidos, muitas vezes, pela polícia de Odessa

«344. O Tribunal também não tem conhecimento de quaisquer esforços significativos por parte das autoridades ucranianas para impedir os confrontos depois de terem sido ou devessem ter sido avisados ​​da sua inevitabilidade em 2 de maio de 2014. Embora a polícia tenha monitorado a reunião de ativistas anti-Maydan desde o início, quando o número desses ativistas cresceu para aproximadamente de 300 e eles começaram a se mover na direção da marcha da unidade (da Ucrânia), a presença policial aumentou de dez para quarenta policiais, que estavam simplesmente escoltando os manifestantes anti-Maydan». 

O Tribunal está dizendo que o comando regional da polícia de Odessa ignorou todos os avisos de que confrontos sérios eram possíveis na cidade e não impediu que os militantes pró-russos anti-Ucrânia decidissem atacar apoiantes da Ucrânia. O tribunal culpa o governo ucraniano por isso, embora a decisão do Tribunal afirma, acima, que a polícia local, estava, na verdade, em conluio com ativistas pró-rússia, agindo nos seus interesses, e não respeitando ao governo ucraniano central. 



Polícia de Odessa e os militantes anti-Ucrânia usam as mesmas faixas vermelhas

«346. No geral, embora a capacidade das autoridades ucranianas de impedir os confrontos violentos que ocorreram em Odessa em 2 de maio de 2014 tenha sido indubitavelmente limitada pela natureza da ameaça e pela situação com a polícia local no momento relevante, não foi demonstrado ao Tribunal que eles fizeram tudo o que poderia ser razoavelmente esperado deles». 

Aqui, TEDH não estabeleça qualquer intenção maliciosa por parte do governo da Ucrânia, simplesmente diz que as autoridades ucranianas não exerceram vigilância suficiente e não previram tal curso de eventos. Ainda hoje não está muito claro o que o governo ucraniano controlava em Odessa em maio de 2014. Na mesma época em Donetsk o governo central já não controlava mais nada. O poder da autoridade do estado ucraniano entrou momentaneamente em colapso. 

«348. O Tribunal observa que a passividade da polícia durante os confrontos é um fa(c)to estabelecido, confirmado por um grande conjunto de evidências incontestáveis. De fato, a polícia permaneceu passiva quanto ativistas anti-Maydan se aproximavam e atacavam a marcha da unidade (da Ucrânia) sem motivo aparente. A polícia também não respondeu ao primeiro ferimento fatal de bala infligido a um apoiante da unidade territorial (da Ucrânia), filho do Sr. Ivanov e da Sra. Ivanova (Ihor Ivanov, a primeira vítima mortal ucraniana do dia 2.05.2014). Além disso, um ativista pró-rússia foi visto atirando em apoiantes da unidade (da Ucrânia) enquanto estava ao lado da polícia e, mais tarde, fugiu do local no mesmo carro que um policial regional de alta patente. Além disso, alguns policiais usavam fita vermelha nos braços, semelhante à usada por alguns manifestantes anti-Maydan». 

Cidadão ucraniano e russo étncio, Ihor Ivanov foi a primeira vítima ucraniana do dia 2.05.2014

O Tribunal confirma mais uma vez que os militantes pró-rússia atacaram primeiro os apoiantes da Ucrânia e que a primeira vítima foi um apoiante da Ucrânia, e que o seu assassino foi levado do local e escondido pela polícia regional. Ou seja, foi oficialmente confirmado que a violência e os assassinatos foram provocados pelo lado pró-russo, e a polícia local os ajudou nisso. 

«349. Na opinião do Tribunal, a falha da polícia em demonstrar qualquer tentativa significativa de deter a onda inicial de violência dirigida contra os manifestantes da unidade (da Ucrânia), juntamente com sinais claros de um possível conluio entre a polícia e ativistas anti-Maydan, foi uma das razões, se não a principal, para a onda de violência retaliatória quando os apoiantes furiosos do Maydan decidiram se vingar». 

O Tribunal chama a inação da polícia de Odessa, que permitiu os confrontos, de razão principal para a dura reação dos apoiantes da Ucrânia. Mas o responsável por isso, Dmytro Fuchedzhi, se encontra na rússia. A rússia não só não o responsabilizou por isso, como também o encobriu. 

O que se segue é uma descrição dos eventos à volta do Edifício dos Sindicatos. Aqui novamente o tribunal diz diretamente que a razão para o grande número de vítimas foi a inação dos bombeiros, que eram então liderados por Volodymyr Bodelan e que este, durante 40 minutos se atrasou para dar a ordem de apagar o fogo. Volodymyr Bodelan hoje é cidadão da rússia e mais tarde fugiu para lá. 


Telhado da Casa dos Sindicatos: os militantes pró-russos atiram os cocketeis Molotoff
aos apoiantes da Ucrânia

Os separatistas armados disparam das janelas da Casa dos Sindicatos de Odessa. Em resposta, coquetéis molotov são atirados contra eles. Houve uma batalha campal, em que os separatistas pró-russos pretendiam realizar um massacre dos ucranianos. Contando com a possibilidade de atacar, impunemente os apoiantes desarmados da Ucrânia, como o fizeram alguns dias antes em Donetsk.

«358. De acordo com os regulamentos em curso, cuja adequação não é contestada, o serviço de socorro tinha a obrigação de enviar dois carros de bombeiros para o «Kulykove Pole» assim que os primeiros telefonemas sobre as tendas em chamas foram recebidos, às 19h31. Após que a situação se deteriorou com um incêndio no Edifício dos Sindicatos, os esforços necessários de combate a incêndio deveriam envolver a mobilização de seis camiões/nhões de bombeiros, escadas de incêndio, mangueiras e uma máquina de ventilação. Entretanto, nada foi feito por aproximadamente quarenta minutos após os primeiros telefonemas para o centro de controlo/e, apesar de inúmeras testemunhas continuarem ligando para os serviços de emergência; seu chefe, o Sr. Bodelan, estava presente no local e observou pessoalmente os eventos, e o corpo de bombeiros estava a apenas 6 minutos de distância. A única razão para o atraso foi a instrução dada por Bodelan aos seus subordinados para não fazerem nada sem a sua ordem expressa». 

O Tribunal estabeleceu que o cidadão russo Volodymyr Bodelan literalmente ordenou aos seus subordinados para não apagassem o incêndio no qual dezenas de apoiadores russos morreram queimados. Mais tarde, ele se mudou para a Crimeia ocupada e depois para rússia, após 2022 recebu a posição oficial do representante do território ucraniano temporatiamente ocupado de Kherson em Moscovo/ou. Por que razão a rússia nomeou o responsável pelas mortes em massa para um alto cargo? É lógico supor que esta seja a recompensa por tais ações. Aparentemente, sua tarefa incluía organizar um massacre sangrento, espécie de casus belli, que ele ajudou a encenar com sucesso. 

Adiante, o Tribunal reivindica que as autoridades ucranianas não prenderem nenhum responsável e permitiram que os organizadores do derramamento de sangue escapassem para a rússia. Isso é verdade. 

«396. Apesar das evidências fotográficas e de vídeo disponíveis publicamente mostrando um ativista anti-Maydan parecido com o Sr. Budko (Vitaly “Bootsman” Budko) disparando uma espingarda automática / um rifle automático contra apoiadores da unidade (da Ucrânia), estando lado a lado com a polícia, sem qualquer reação desta última, as autoridades nacionais levaram mais de dois anos para iniciar um processo criminal contra o Sr. Budko, e mais de sete anos para iniciar um processo criminal contra o Sr. Ivakhnenko, um dos policiais em questão. Nenhuma explicação, muito menos uma desculpa, foi dada para esses atrasos. Como nenhuma medida preventiva foi aplicada ao Sr. Budko e ele desapareceu, a investigação foi encerrada em outubro de 2016. Quanto ao processo criminal do Sr. Ivakhnenko, ele terminou com sua liberação de responsabilidade criminal devido ao término do prazo de prescrição de dez anos. 


Militante pró-russo «Bootsman» Budko armado com AKSM dispara contra os ucranianos

«397. Ao mesmo tempo, a investigação criminal de outro policial, o Sr. Fuchedzhi, que estava diretamente envolvido no processo de tomada de decisão antes e durante os eventos, tenha resultado em uma condenação, o atraso inicial de aproximadamente duas semanas na obtenção de um mandado de prisão permitiu que ele fugisse do país». 

Na verdade, Fuchedzhi e os outros culpados foram simplesmente autorizados a escapar da Ucrânia. Eles não foram presos, embora devessem ter sido presos imediatamente. Processos criminais contra eles foram abertos com vários anos de atraso. 

«403. Embora nunca tenha sido negado que o Sr. Bodelan, ex-chefe da Diretoria Principal do Serviço de Emergência do Estado na região de Odessa, fosse responsável pelo atraso no envio de camiões/nhões de bombeiros para «Kulykove Pole», uma investigação criminal sobre ele só foi iniciada em 1 de março de 2016. Enquanto isso, ele continuou seu serviço no cargo acima mencionado até o término de seu contrato em setembro de 2014. Na ausência de qualquer relato de suspeita de crime contra, ele acabou fugindo do país.» 

Mais uma vez, ninguém tocou no agente e colaborador russo Bodelan, que atualmente trabalha na administração russa de ocupação nos territórios ocupados da Ucrânia, por 2 anos, ninguém o tocou, e ele calmamente deixou Ucrânia rumo à rússia. As alegações do Tribunal contra Ucrânia agora consistem literalmente no fa(c)to de que as autoridades ucranianas não detiveram um cidadão russo que deliberadamente fez de tudo para garantir a morte de várias pessoas. 

Em geral, o TEDH estabelece dois fatos: a impotência do estado ucraniano e a malícia do estado russo, que propositalmente fez de tudo para organizar um massacre em massa em Odessa.

Militante pró-russo Eduard Ayrapetyan, em maio de 2014 e na TV russa

Ucrânia agora será obrigada à pagar aos parentes daqueles que morreram devido à impotência. Mas a decisão judicial pode claramente ser atirada nas caras dos propagandistas russos, porque é um documento oficial que afirma claramente quem começou tudo e quem exatamente queria derramar a sangue dos ucranianos em Odessa.

Análise detalhada da autoria do @Denys Kazansky

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