Investigação
revela o conteúdo de um encontro onde italianos e russos negoceiam
financiamento de milhões. Estas conversas colam a Rússia ainda mais aos
movimentos populistas europeus.
por:
Diogo Lopes, Observador.pt
Lega,
o partido italiano de extrema-direita que tem Matteo Salvini como líder, terá
procurado dezenas de milhões de euros de financiamento junto de investidores
russos. Após vários meses de suspeitas, a aparente confirmação surge através da
Buzzfeed
News, que teve acesso à gravação de um encontro secreto onde colaboradores
do atual vice-primeiro-ministro italiano negoceiam o suposto financiamento que,
tudo indica, seria feito através da compra e venda de petróleo.
A
gravação desta reunião dura pouco mais de uma hora e é a mais recente (e
sólida) prova das ligações entre os movimentos populistas de extrema-direita e
Moscovo. A prestigiada newsmagazine italiana L’Espresso
já tinha lançado esta história, a 21 de fevereiro de 2019, mas só agora foram
divulgados os áudios da suposta reunião.
De
acordo com o BuzzFeed (jornais como o italiano la Reppublica, por exemplo,
também já reportaram a história, entretanto), o acordo envolveria uma
petrolífera russa com três milhões de toneladas métricas de petróleo
(aproximadamente 22 milhões de barris de petróleo) para vender à energética
italiana Eni ao longo de um ano e em troca de 1.3 mil milhões de euros.
Intermediários venderiam, comprariam e desviariam o dinheiro que iria para aos
cofres do partido italiano, isto graças a um desconto a ser aplicado na
transação.
“É
muito simples”, ouve-se um italiano a dizer nas gravações divulgadas pelo
Buzzfeed News. “O planeamento feito pelos nossos tipos da política fala de um
desconto de 4%, que equivale a 250 000 [toneladas métricas; equivalente a cerca
de 2 milhões de barris de petróleo] mais 250 000 por mês, durante um ano — isto
consegue financiar uma campanha.” Ou seja, a Eni acordava comprar petróleo à
dita empresa russa (o artigo da Buzzfeed News fala na possibilidade de ser a
Rosneft e/ou a Lukoil) que aceitava fazer o tal desconto, eventualmente não
declarado. O dinheiro saíria da Eni, ela receberia a matéria prima a um preço
mais barato, a petrolífera da Rússia recebia o montante negociado menos o tal
desconto, uns 58 milhões de euros. Essa quantia ficava, portanto, nas mãos de
intermediários que tinham como única missão redirecionar o dinheiro para os
cofres do partido de Salvini.
A
dada altura da gravação um dos italianos comenta que “vão ter problemas com a
AM [regras anti-lavagem de dinheiro]” mas para Gianluca Savoini, braço direito
de Salvini e um dos homens identificados nas gravações, a única coisa que
interessava era a vontade de “mudar a Europa”. Aliás: “É preciso criar uma nova
Europa que esteja mais próxima da Rússia, como costumava estar, porque queremos
manter a nossa soberania.”
Na
semana passada Savoini participou num jantar do governo russo, em Moscovo, onde
esteve com Vladimir Putin. Salvini, por sua vez, não esteve nem nesse jantar de
Estado nem na tal reunião onde se discutiu o esquema do petróleo. Ainda não se
sabe ao certo se o esquema chegou a ir em frente ou se a Lega recebeu algum
financiamento russo — tanto Salvini como Savoini recusaram comentar as
alegações da Buzzfeed.
O
mesmo site noticioso afirmou que não foi capaz de identificar os russos que
participaram nesse encontro secreto que decorreu no histórico hotel Metropol,
em Moscovo (onde foi feito o esboço da primeira Constituição soviética).
A
Lega negou repetidamente as acusações de ter recebido dinheiro de financiadores
estrangeiros, algo que seria uma quebra da lei eleitoral italiana. Contudo,
Salvini já foi franco àcerca do seu apoio ao governo russo: depois das eleições
europeias posou para uma fotografia com uma imagem de Vladimir Putin bem
visível na estante que estava atrás dele.
A
ter existido de facto este financiamento, não seria o primeiro caso de um
partido da extrema-direita a aceitar dinheiro da Rússia. Marine Le Pen, por
exemplo, recebeu empréstimos no valor de 11 milhões de euros provenientes de
bancos russos, em 2014.
O
financiador principal da campanha pelo Brexit, Arron Banks, também já foi
acusado de fazer acordos de compra e venda de ouro e diamantes com a embaixada
russa, de forma a financiar o referendo de 2016. Está a ser investigado,
inclusive, pela National Crime Agency britânica, apesar de negar de forma
veemente todas as acusações.
Também
na Áustria, o partido de extrema-direita de Heinz-Christian Strache, o FPO,
abdicou do cargo, depois de ser filmado a discutir um acordo segundo o qual
contratos públicos eram usados como moeda de troca para receber apoio da Rússia
na sua campanha eleitoral.
Blogueiro:
no seu livro “Processo de Moscovo”, o dissidente soviético Vladimir
Bukovsky descreveu um esquema absolutamente semelhante usado na década de
1970 pelo KGB para financiar o PC italiano.
1 comentário:
Mas temos que ter cautela sobre as mídias, aqui no Brasil as mídias tem muitos jornalistas a favor do Foro de São Paulo.
Mas se realmente esse Salvini e Marine le Pen estão patrocinados por Moscou, acho que a Europa está sem saída já que estão subordinados a interesses russos.
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