Sob atento olhar do Lenine os separatistas distribuam os doces roubados |
O artigo do jornalista do Washingtonpost.com, Griff Witte, ilustra perfeitamente
a psique dos moradores de Donetsk e explica as dificuldades que Ucrânia sente de momento, para vencer os separatistas e terroristas nesta parcela do seu território, que
infelizmente, para já, se transforma numa espécie de Somália faminta.
Donetsk, Ucrânia – o conflito no leste da Ucrânia tem sido travado nos
últimos dias com balas, bombas e morteiros. Mas domingo, as armas de escolha
foram chocolate, caramelo e lima-limão.
O que começou como um golpe publicitário separatista terminou em uma raiva,
tornou-se uma confusão pegajosa.
Primeiro, o golpe de relações públicas: o “governo” rebelde (separatista) organizou
uma reunião para as crianças na Praça Lenine de Donetsk para destacar, o que
chamam, de ataques indiscriminados do exército ucraniano contra os civis. Sob o
céu ensolarado, mães e pais ocorreram à praça, com as crianças à tiracolo, para
ouvir oradores bradarem contra a “junta sanguinária de Kiev”.
No final, houve uma surpresa especial: uma van branca parou e militantes em
camuflados verdes saltaram fora. Mas ao invés de seus espingardas de assalto
habituais, os militantes levavam doces. Caixas cinzentas grandes de doces que
eles disseram terem sido saqueadas de um armazém local (ver METRO).
Distribuição dos doces previamente saqueados |
As crianças gritaram de alegria. Os pais correram para reclamarem a sua
parte. Houve aplausos quando crianças felizes saiam, carregando os sacos de
doces, embrulhados em plásticos azuis, amarelos e vermelhos. Parecia que a república popular de Donetsk, como aqui é conhecido o movimento separatista,
tinha ganhado uma vitória de suma importância na batalha pelos corações e
mentes.
Mas, na Ucrânia nos dias de hoje, mesmo o doce é político.
Alguns na multidão perceberam que os doces foram feitos pela Roshen, a
empresa propriedade do magnata ucraniano conhecido como o Rei Chocolate, Petró
Poroshenko. Ele tornou-se o presidente do país, eleito no mês passado, em uma
votação esmagadora, mas os partidários dos rebeldes aqui o culpam pela
violência que tomou a conta do sudeste do país.
O clima se transformou em um flash de exultante à furioso. O Carnaval
tornou-se uma turba.
“É uma provocação!”, começaram gritar alguns entre a multidão.
“Os doces são envenenados!”, berravam outros.
“Não aos doces sangrentos!”, grunhiam eles.
Ataque aos doces "sangrentos" |
Instalou-se o empurra-empurra geral. As mães chutavam as caixas, pisavam os
doce com os pés e gritavam para os militantes. Os militantes gritavam em
resposta.
“Queríamos dar doces para as crianças! Só isso! Que diferença faz de onde
vieram?”, berrou um dos militantes exasperados.
Mas já era tarde demais. A multidão tinha se transformado. Os militantes
saltaram para a sua van. Acelerando de lá para fora, quando um dos pais
atirou-lhe com um saco de doces.
Argumentos filosóficos eclodiram sobre se rejeitar os doces tinha sido a
coisa certa a fazer. “Nós fumávamos os cigarros alemães durante a Segunda Guerra
Mundial. Qual é a diferença?”, perguntou um homem gentil de cabelos grisalhos e
dentes de ouro.
Desargumentação filosófica local |
“Poroshenko não pode tentar matar-nos e alimentar-nos ao mesmo tempo!”,
respondeu uma mulher em uma blusa com imagem de tigre, quebrando as caixas em
pequenos pedaços de papelão.
As embalagens coloridas voaram com a brisa. O caramelo agarrou-se ao
pavimento quente. Sob o olhar atento de Vladimir Ilyich Lenin, que paira sobre
esta praça em granito preto, foram os trabalhadores (municipais) que ficaram
para limpar toda a desordem deixada.
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