Os militares nazis e soviéticos como aliados em 1939 |
Após
a derrota na I G.M. o exército alemão, limitado às 10 divisões (7 de infantaria
e 3 de cavalaria), era proibido de possuir os tipos modernos de armamento,
nomeadamente os blindados e aviação. O nosso blogue já escreveu sobre a escola
secreta de Luftwaffe
na URSS, hoje falaremos sobre a escola secreta de blindados de Kazan (Panzerschule Kama).
O
«projeto Kama» (junção
do nome Kazan e do apelido Malbrandt), era a escola secreta alemã, situada na
URSS, nos arredores da cidade de Kazan, em violação grosseira do tratado de
Versalhes. A decisão da criação da escola surgiu como a consequência direta do Tratado de Rapallo
e
do acordo secreto assinado em Moscovo no dia 3 de outubro de 1926. A parte alemã
foi representada pelo chefe do grupo especial “Zentrale Moskau (Z.Mo.)” coronel
aviador Hermann von der Lieth-Thomsen,
do lado soviético o acordo foi assinado pelo chefe da IV Direção de Inteligência
do Estado-maior do RKKA, general Jānis Bērziņš.
A
parte soviética oferecia as instalações (as antigas casernas do 5º regimento de dragões de
Kargopol), os direitos de uso e aproveitamento do polígono de artilharia e dos
campos de tiro e de treino de Kazan. A parte alemã pagava o apetrechamento
(entre 1 à 2 milhões de marcos), fornecia os blindados, diversos outros
equipamentos e pessoal. A escola começou o seu funcionamento em junho de 1929,
os alemães a chamavam de “Kama”, os soviéticos de “Cursos técnicos de Osoaviakhim” (TEKO).
Os
blindados
O blindado pesado da I G.M. |
Após
a I G.M. os exércitos europeus consideravam que numa futura guerra precisariam os
três tipos de blindados: pesado (para romper as defesas posicionais); médio
(para funcionar na retaguarda inimiga) e leve (para acompanhar a infantaria).
Em 1926-28 as empresas alemãs Krupp, Rheinmetall AG e Daimler-Benz AG receberam
a tarefa secreta de criação e fabrico de protótipos do blindado “pesado” e
“médio”. Até 1935 este programa se mantinha em segredo, por isso o blindado
grande era chamado nos documentos primeiro de “Armeewagen 20” (“Vagão do exército
de 1920”), passando depois para “Großtraktor” (trator grande). O blindado “médio”
recebeu o nome de “Leichttraktor” (trator leve). Depois surgiram “Kleintraktor”
(trator pequeno), mais conhecido como “Panzerkampwagen I”, e “Mittlerer Traktor”
(trator médio).
As
empresas contratadas, produziram, cada uma, dois protótipos do “Großtraktor” do
aço leve, não blindado, mas com um canhão real de 75 mm na sua torre. Todos os “tratores”
foram levados à URSS em junho de 1929. Parecidos entre si visualmente, eram diferentes
na estrutura de transmissão, suspensão e motores. Embora alguns modelos usavam
os mesmos elementos (a torre, motor e transmissão).
Os
dois blindados de Daimler-Benz AG revelaram em Kazan as graves problemas com a
transmissão, percorrendo, ambos, apenas 66 km. Os blindados de Krupp, mudando a
transmissão, percorreram 299 km. O melhor resultado mostraram os blindados de Rheinmetall
AG, os dois somaram 1264 km. Todos os blindados tinham substituído as suas
transmissões e as lagartas.
Um
ano depois da chegada dos “tratores pesados”, vieram os leves: dois feitos pela
Krupp e dois pela Rheinmetall AG . O número geral de blindados chegou aos 10, o
que permitiu organizar os exercícios militares. No verão de 1932 estes exercícios
eram conjuntos com Exército Vermelho, o RKKA trouxe 15 blindados. Os alemães
tiveram oportunidade de conhecer em Kazan os blindados leves soviéticos MC-1 (T-18) e possivelmente T-27.
Em
1932-33 as relações calorosas entre as partes azedaram. Os alemães pediram o
acesso aos blindados americanos e britânicos comprados pela URSS, mas o seu
pedido foi negado pela parte soviética. Os soviéticos desconfiavam que os
alemães não lhes apresentam os blindados mais modernos, nomeadamente criados na
base do modelo ligeiro sueco Stridsvagn L-5.
O blindado ligeiro sueco Landsverk L-5 (Stridsvagn L-5) |
A
chegada do Hitler ao poder e o fim da necessidade de esconder o seu programa de
armamento, ditou o encerramento da escola. A sua evacuação começou em 20 de julho
de 1933 e até o dia 6 de setembro de 1933 todos os alemães deixaram a cidade de
Kazan. A parte soviética ficou com diversos equipamentos, no valor de cerca de
1 milhão de rublos, pelos quais pagou à parte alemã 250.000 marcos.
O
pessoal
Nos
quatro anos do seu funcionamento a escola “Kama” formou ente 30 à 40 cadetes
alemães e não menos de 65 soviéticos. Na sua maioria, os pupilos alemães eram
oficiais com idades compreendidos entre 30 à 40 anos, possuindo, geralmente, o
patente do 1º tenente. A “Kama” formava os futuros formadores do futuro Wehrmacht.
O
historiador russo Sergey Gorlov descreve o programa da escola de seguinte
maneira:
O
currículo escolar da escola de Kazan incluía o curso teórico, parte aplicativa
e a formação técnica. No âmbito do curso teórico, os alunos estudavam os tipos
de tanques e a sua estrutura geral, a construção de motores, tipos de armamento e das munições, as táticas de
combate de forças blindadas e questões de interoperabilidade, especialmente a logística
no campo de batalha. A parte aplicada incluía a condução de blindados no terreno
liso e acidentado, em condições climatéricas diversas (de dia, de noite, com ou
sem faróis, dentro da fumaça), ultrapassando os rios e riachos pelo seu leito,
a condução dos exercícios de tiro e realização de tiros com fogo real,
aperfeiçoamento das operações como parte de unidades (até a companhia), interação
com outros ramos das forças armadas, questões de comando em combate e em
marcha. Nas aulas práticas os participantes praticavam a manutenção e reparação
de blindados.
A
escola “Kama” formou cerca de 30 cadetes, a experiência prática também foi
adquirida pelos instrutores alemães. Quem eram estas pessoas? Na literatura militar alemã aparecem
duas listas. A primeira é citada pelo general Walther Nehring no seu
livro fundamental “Die
Geschichte deutschen Panzerwaffe 1916 1945” dedicado à história dos
blindados alemães. A segunda lista aparece no livro “Wunsdorf” do Hans-Georg Kampe. Se
juntar as duas e acrescentar os três diretores da escola: Wilhelm
Malbrandt, Ludwig von Radlmaier e Josef Harpe, podemos obter uma lista
bastante completa dos militares alemães, de uma ou de outra maneira
relacionados com a escola “Kama”:
Na
foto que se segue (como afirmam os amigos da história da II G.M. reunidos no
fórum Axishistory.com),
podemos ver o primeiro grupo de liderança do Kraftfahrlehrkommando Zossen em 01.11.1933
(fonte@: H. Scheibert “Das war Guderian”, Podzun-Pallas, o.J.). O nome de código
Kraftfahrlehrkommando Zossen (Comando automóvel de treino Zossen), era usado
pelo Wehrmacht para designar a primeira unidade semiclandestina de blindados do
Reichswehr, formada em novembro de 1933.
Era
previsto que a nova unidade terá o tamanho do regimento, possuindo 4 blindados pesados
e 4 leves, todos trazidos da URSS e 5 blindados protótipos na base do chassi do
Panzerkampfwagen I.
Na foto, os pupilos da “Kama” são marcados com a cor vermelha, os restantes
oficias com a amarela. Como é possível constatar metade do primeiro comando dos futuros exércitos de blindados do 3º Reich era formado na URSS.
Com
a chegada de novos blindados, comando Zossen cresceu até o verdadeiro regimento,
o que originou a formação da segunda unidade de blindados, Kraftfahrlehrkommando
Ohrdruf. Os cadetes e formadores da escola “Kama” receberam as diversas posições
do comando nestas duas unidades, quer ao nível do campo, quer ao nível dos seus
estados-maiores.
As
carreiras
Durante
a II G.M. o maior posto alcançado pelo pupilo da escola “Kama” foi do coronel-general
Josef Harpe que comandava um grupo de exércitos. Outros subiram até os
comandantes das divisões: Richard Koll (1. Pz.Div., 1/1944 – 2/1944); Ewald Kraeber
(23. Pz.Div., 10/1943 – 7/1944); Theodor Kretschmer (17. Pz.Div., 2/1945 – 5/1945);
Friedrich Kühn (15. Pz.Div. 11/1940 – 3/1941, 14. Pz.Div. 3/1941 – 6/1942) e Viktor
Linnarz (26 Pz.Div. 3/1945 – 5/1945). Além disso, Hubert Lendle se transferiu
para infantaria e acabou a guerra como comandante da 221ª Divisão de segurança;
Hermann Hiller se juntou ao Luftwaffe, entre 1936 e 1941 ele comandava diversas
unidades de defesa antiaérea.
Alguns
formandos e formadores da “Kama” morreram em combate, comandando os regimentos
ou batalhões de blindados: Herbert Baumgart em 1939 na Polónia; Friedrich Stephan,
em 1941 em África e Wilhelm Teege, em 1942 também em África.
Diversos
formandos e formadores da “Kama” foram diretores das escolas de blindados no 3º
Reich. A escola alemã
mais antiga de Wunsdorf em vários
momentos foi dirigida pelo Ludwig von Radlmaier (1937-38), Friedrich Kühn
(1938-39), Josef Harpe (março-maio de 1940), Ewald Kraeber (janeiro-novembro de
1943). A Escola de artilharia de blindados de Putlos foi encabeçada pelo Herbert
Baumgart (1934-38), Ewald Kraeber (1938-42), Hans vоn Köppen (1943), Hans Bonatz (desde maio
de 1943). Paul Görbig comandava o polígono de blindados em 1939-43. E por
último, Ernst Volckheim, praticamente único que possuía a experiência de
combates de tanques ainda na I G.M., durante a II G.M. comandava o 40ª Batalhão
de blindados do Wehrmacht na Noruega.
A
espada nazi foi forjada na URSS?
Em
1933 os formandos e formadores da escola “Kama” eram únicos especialistas do Reichswehr
com a experiência em blindados modernos. E a sua experiência foi usada em larga
escala para a formação da primeira geração massificada dos oficiais de
blindados do 3º Reich.
O texto
é da autoria do blogueiro Grzegorz Brzęczyszczykiewicz.
O nosso blogue publica a sua versão curta.
Blogueiro:
O general alemão, Heinz Guderian,
não estive na “Kama” nem como formador, nem como formando, como as vezes se
afirma erradamente. Embora realmente, general passou pela Kazan, numa única ocasião no verão de 1932, quando efetuou uma inspeção naquela escola. Também em 1939 ele era o representante máximo na parada
conjunta nazi-soviética na cidade de Brest-Litovsk. Na foto em cima, Guderian e o
comandante da brigada soviética (Kombrig), Semyon Krivoshein em 22/09/1939. Nas fotos em baixo, a camaradagem aliada dos soldados e oficiais soviéticos e alemães em 1939, antes, durante e depois da famosa parada conjunta de Brest-Litovsk.
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