domingo, dezembro 28, 2025

A guerra colonial soviética no Afeganistão: as etapas de uma derrocada

Batalhões muçulmanos soviéticos no Afeganistão. Foto de arquivo

A guerra soviética no Afeganistão começou em abril de 1978. Inicialmente, a URSS negou seu envolvimento, e a guerra foi travada por batalhões muçulmanos soviéticos. A data oficial de início da guerra só veio à tona muito mais tarde, com a lei russa «Sobre Veteranos» de 2023. 

Em 24 de junho de 1979, foi criado o Batalhão Muçulmano das forças especiais do GRU do Estado-Maior Geral das Forças Armadas da URSS; seis meses depois, a unidade invadiria a residência do presidente do Afeganistão. O batalhão foi composto por naturais das repúblicas soviéticas da Ásia Central (uzbeques, tadjiques, casaques, quirguizes, turcomanos) que tinham traços físicos semelhantes aos afegãos. A ideia provinha da doutrina do KGB, chamada «maskirovka», disseminar a presença soviética no Afeganistão, ajudar a negar as suas evidências, se salvando do uso de militares, fisicamente parecidos com a população local. 

Em 12 de dezembro de 1979, numa reunião do Bureau Político da PCUS, o governo real da URSS, foi tomada a decisão final sobre invasão soviética em grande escala do Afeganistão. O KGB, o Ministério dos Negócios Estrangeiros / das Relações Exteriores e os representantes do complexo militar-industrial se manifestaram ao favor. O Estado-Maior Geral das forças armadas e os conselheiros militares apresentaram argumentos desfavoráveis. 

Em 25 de dezembro de 1979, tropas soviéticas desembarcaram em Cabul. Oficialmente, o objetivo era «guardar o aeroporto». Um dos aviões caiu nas montanhas. Os soviéticos nunca removeram os corpos. Apenas em 2005, o Ministério da Defesa russo lançou, no local do acidente, à partir do ár, uma placa com os nomes das vítimas. 

Em 27 de dezembro de 1979, Musbat do GRU, usando os uniformes do exército afegão e a unidade «Alfa» do KGB, atacaram a residência do chefe de Estado do Afeganistão (Operação Shtorm-333). Mataram o chefe de Estado, Hafizullah Amin (o homem que convidou os soviéticos ao Afeganistão), uma parte de sua família e centenas de guardas. O chefe de Estado assassinado foi declarado o «agente da CIA», e um novo chefe de Estado afegão, Babrak Karmal, foi trazido de Moscovo/ou. 

O novo chefe de Estado declarou a «revolução de militares patriotas afegãos» e solicitou o envio de tropas soviéticas, que «pela coincidência» realizavam exercícios na fronteira afegã naquele momento. Os militares soviéticos foram indotrinados pela propaganda militar especial de que «se não fossem nós [soviéticos], as tropas da OTAN estariam lá quatro horas depois!» 

2/17/83-Nova Iorque: Esses quatro desertores soviéticos sentados foram entrevistados pela ABC-News numa base rebelde muçulmana no sudeste do Afeganistão. Um dos soldados explicou a sua entrega: “eu não quero matar mulheres e crianças”. Eles disseram que a moral nos regimentos soviéticos é baixa e descreveram a existência de armas químicas, repetidamente negadas por Moscovo. @ABC News 20/20

Em 14 de janeiro de 1980, a Assembleia Geral da ONU adotou uma resolução condenando a invasão. Sanções foram impostas à URSS. Armas chinesas e europeias começaram a ser fornecidas aos mujahidins. Essas medidas aumentaram o custo da agressão, mas não impediram a guerra. 

Em junho de 1982, começaram em Genebra as negociações «para a resolução da situação no Afeganistão». Líder soviético Leonid Brejnev morreu em novembro de 1982. O seu sucessor, ex-chefe do KGB, Yuri Andropov morreu em fevereiro de 1984. O sucessor deste, Konstantin Chernenko morreu em março de 1985. A escalada do conflito só aumentou durante esses anos. 

Em meados da década de 1980, os preços do petróleo começaram a cair. Os mujahidins receberam mísseis Stinger, o que limitou a logística aérea soviética e a capacidade de bombardear a resistência afegã impunemente. O uso generalista de minas limitou a logística terrestre. O custo da continuação da guerra aumentou. 

A propaganda visual anti-soviética afegã 

Em abril de 1988, um acordo sobre a retirada das tropas soviéticas foi assinado em Genebra. Afeganistão e Paquistão eram as partes signatárias, e a URSS tornou-se a garantidora do acordo. A retirada das tropas terminou oficialmente em 15 de fevereiro de 1989. Restaram apenas alguns «assessores». 

O contingente soviético do sudeste do Afeganistão estava sendo retirado através do estreito túnel de Salang. Representantes soviéticos iniciaram negociações de cessar-fogo com Ahmad Shah Massoud, que controlava aquela região, durante a retirada. Ahmad Shah Massoud cumpriu a sua parte do acordo. Enquanto isso, o comando soviético lançava projéteis termobáricos sobre as aldeias vizinhas. 

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A guerra russo-ucraniana começou em abril-maio de 2014. Inicialmente, o Kremlin negou seu envolvimento, alegando que a guerra era travada por «mineiros de Donbas». A data oficial de início da guerra foi definida pela lei russa «Sobre Veteranos», aprovada em 2023. 

Em 24 de fevereiro de 2022, os paraquedistas russos tentaram ocupar o aeródromo de Hostomel. O Kremlin declarou que «tropas ucranianas patrióticas derrubarão o regime criminoso». Yanukovych foi levado, às pressas, para Minsk. Os exercícios na fronteira se transformaram numa agressão russa.

A guerra colonial soviética no Afeganistão durou nove anos

  • A URSS perdeu aproximadamente 15.000 homens (14.427 exército, 576 KGB, 28 polícia), mais de 400 desapareceram em combate ou se tornaram POW;
  • Cerca de 60.000 foram perdidos pelas forças afegãs pró-soviéticas;
  • Os mujahidines perderam aproximadamente de 75.000 à 90.000 homens. 

O Ocidente lutou no Afeganistão por 20 anos

  • O exército dos EUA perdeu 2.459 militares mortos;
  • CIA, EMP´s perderam cerca de 3.900 contratados;
  • Aliados dos EUA (NATO/OTAN): perderam aproximadamente 1.150 mortos, ou seja, o Ocidente perdeu cerca de 7.500 homens — metade das perdas soviéticas, e em um período duas vezes maior.
  • As forças governamentais afegãs sofreram aproximadamente 66.000 baixas.
  • Perdas dos mujahidin: de 51.000 à 53.000, sem muita precisão.

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