A
guerra na Donbas está baixar de intensidade, os protestos dos apoiantes de Saakashvili
também diminuíram, o país visivelmente se acalmou. No entanto, em um pouco mais de um ano
decorrerão as eleições presidenciais, o seu resultado pode ser difícil de
prever.
A
situação da Ucrânia é descrita pelo blogueiro ucraniano Ihor Radysyuk, publicamos o seu
texto, sem omissões e na primeira pessoa.
Objetividade
e percepção
Ucrânia
vive um grande contraste entre objetividade e realidade. Objetividade — o país
está sendo construído como provavelmente nunca antes, desde o colapso da URSS.
Ao lado da minha casa no início da década de 1990, começaram a construir uma
escola e, abandonaram, após erguer os alicerces. Com [Petró] Poroshenko, a
escola está sendo terminada em tempo recorde. Somente nos últimos 3 meses, perto
da minha casa, foram construídas duas pontes para pedestres.
Desapareceu
a sensação de desesperança, que havia há 3 anos, quando a guerra com a Rússia
se sentia em todos os lados, quando trabalhávamos para quebrar, e tudo, de
certa forma era triste. Provavelmente muitos até já se esqueceram) As pessoas possuem
o dinheiro. Um grande número de pequenas mudanças, muitas das quais não
produzirão fruto imediatamente.
Os apoiantes de Saakashvili empurram, protegendo, ao mesmo tempo, um polícia ucraniano |
E
tudo isso, tendo em conta os grandes gastos com a guerra, pagamento da dívida
externa – com Poroshenko, Ucrânia, pela primeira vez na sua história começou a
reduzir a sua dívida externa e também acumulou o maior valor no Tesouro do que
em todos os anos anteriores. Esta é a realidade objetiva. Agora quanto à
realidade subjetiva. Perguntando a quase qualquer um – e todos dirão que tudo
está mau. Ucranianos, como é claro, dizem mal do qualquer poder, e Poroshenko não
é uma exceção. Quase todos vão dizer que tudo é mau/ruim, nada muda, e assim
por diante.
OAT,
Europa e sanções
OAT.
Não sei. E parece-me que ninguém realmente sabe. Todos os dias, nos dois
últimos anos é a mesma coisa – eles dispararam contra nós, nós respondemos. Do
nosso lado, foram feridas 3-5 pessoas. Aborrecida guerra posicional. De acordo
com os dados das Forças Armadas da Ucrânia (FAU), em 2017, foram mortos 198
soldados ucranianos. Com estes números, a imprensa tem preguiça de discutir o
tema, não há eventos marcantes.
A foto é do fim de 2015, nas vésperas da batalha de Debaltseve |
Parece-me
que a gripe matou mais [em 2017] do que essa guerra.
Alguém
dos militares me disse em Kyiv que as forças ucranianas minaram tanto espaço em
torno de Donbas (em caso de um ataque forte) que se eles [separatistas] se
renderem, provavelmente teremos que limpar o território das nossas próprias
minas durante anos. [Oleksandr] Turchinov se gabou que no ano passado [2017] apenas
recuperamos o território, e não perdemos nem um único metro quadrado.
Europa?
Também nada. Concederam o regime de isenção de vistos, e foi tudo. Talvez eu não
estou atento, trabalho muito, e não sigo muito [as notícias]. Mas sinceramente,
não vejo nada marcante, ou pelo menos eventos importantes. Um evento
importante é que os EUA finalmente forneceram as armas. Não tanto por causa das
próprias armas, quanto pelo facto. A Rússia é gradualmente estrangulada com
sanções e continuará sufocada por muitos anos. A mesma política é usada pela Ucrânia
– ganhar não através de um blitzkrieg, perdendo milhões de soldados, mas
devagar e corretamente. A perda de 198 soldados em todo ano de 2017 – acho que são
números muito pequenos.
Mikheil Saakashvili numa manif dos seus apoiantes |
Nos
últimos seis meses, o Kremlin, como se poderia ter observado, tentou abanar Ucrânia
por dentro. Não funcionou. Eu estava na Maydan, quando decorriam os eventos com
Mikheil [Saakashvili] – na verdade, quase ninguém o apoia. E aqueles que
estavam lá, provavelmente, era a maior [parte da] espinha dorsal de todos os seus
apoiantes.
Coisas
boas e coisas más
Coisas
más – recentemente visitei a província: Zaporizhia e Dnipro. Como se eu
entrasse em uma outra dimensão – tudo é preenchido com anúncios publicitários sobre
a oferta do trabalho na Polónia. Com todos com quem falei, acreditam que todos
roubam, tudo é mau/ruim e não acreditam em nenhuma autoridade.
Coisas
boas – duas vezes usei [o sistema de viagens à UE] sem o visto. Na primeira
viagem, eles perguntaram apenas o propósito da visita e carimbaram [o
passaporte]. Na segunda viagem, até tinham a preguiça de fazer qualquer perguntada,
apenas levaram/pegaram o passaporte, carimbaram e disseram Next!
Aqui
em geral ... creio que está tudo na mesma. Penso que os resultados devem ser contabilizados
daqui à um ano, mais próximos ao fim da presidência do Poroshenko.
«Por
dois lados de barricada»
Honestamente,
há mais um contraste – entre aquilo que os ucranianos consideram realmente importante
e o que os nossos vizinhos acham que é importante. Fora da Ucrânia dão atenção
especial aos “problemas de língua”. Os ucranianos nunca pensaram nisso – porque
o problema nunca existiu na realidade. Os de fora dão muita atenção à todos os [movimentos]
“anti-Maydan”, ou aos outros “Maydanes que derrubarão Poroshenko”. Em Kyiv, o
que parece, ninguém se importa com isso.
O
que é realmente importante é a sujidade de transporte público na cidade, “as
marshrutkas”, e a resposta à questão: quem finalmente irá limpar a estação de metro
“Kharkivska” – por algum motivo, os “vizinhos” não estão interessados nisso =))
Nacionalismo
e pensões
As
boas notícias foram aumentos significativos das pensões (não apenas um pequeno aumento,
mas provavelmente o mais notável em todo o período da pós-Independência),
salários dos trabalhadores do estado, e assim por diante. E o mais importante,
estão mudando globalmente os princípios internos de funcionamento [do Estado].
Estou certo de que daqui aos 5-10 anos Ucrânia será completamente diferente.
Creio
que há menos nacionalismo. Na minha opinião, o nacionalismo florescente, no bom
sentido – era a defensiva reação natural das pessoas à agressão externa, eu me
lembro claramente em 2013-2014. Agora ... de alguma forma, as manifestações
externas [do nacionalismo] diminuíram. Eu acho que isso se deve à uma
prolongada guerra posicional e muito trabalho feito dentro do país. No entanto,
nada passou sem deixar rasto: as pessoas começaram a amar muito mais o seu próprio
país.
O
que aconteceu com os emigrantes económicos
A
orientação ao Ocidente apenas se intensificou. Quando recentemente os meus
amigos procuravam por uma coisa grande e rara, então, além do OLX ucraniano, de
uma forma natural procuram no OLX polaco/polonês e em outros locais. Se lá é mais
barato – o que impede viajar, levar/pegar, trazer para Kyiv? Até recentemente,
parece-me, que os seus cérebros não funcionavam dessa maneira.
Continuo
a observar os amigos emigrantes económicos, que até o ano de 2013, todos os
anos, iam para Moscovo no período de verão para trabalhar nas obras. Todos são
do interior da Ucrânia ocidental. Até o momento, de todos eles, apenas alguns
viajaram [para Rússia] neste ano e, voltando, disseram que viajaram pela última
vez – simplesmente deixou de ser lucrativo. O resto, como eu vejo, quase todos,
se reorientaram para trabalhar na Ucrânia – um deles abriu uma oficina/produtora,
outros investiram no setor de serviços, outros simplesmente trabalham nos empregos
formais.
Outra
observação: à Rússia, muitas vezes, viajavam de forma sazonal – ganhavam dinheiro
– voltavam para casa, em família – investiram aqui. Ou seja, a grande maioria
não ia para lá ficar. Da mesma forma, agora eles falam sobre “o senhor polacos/polonês”.
Se em 2014 muitos conhecidos tinham a mentalidade de “temos que ir embora” –
agora, parece-me, isso já não existe. É claro, sempre há pessoas que se mudam
para algum outro lugar, estou falar do “comportamento médio”.
À
Polónia, mesmo quando vão, é para o trabalho sazonal e depois voltam para casa.
Hábitos
e cultura
Sim!
O que aconteceu exatamente no decorrer do ano passado é um aumento notável da [produção]
da música, da cultura e dos livros ucranianos em língua ucraniana (até
recentemente, quase não havia livros infantis normais em ucraniano, tinha que
comprar em língua russa), pela primeira vez começamos produzir os filmes e
cartoons em ucraniano. Até recentemente, todas as máquinas / electrodomésticos
eram vendidos com manuais e todas as instruções em russo (para que o fabricante
gastaria dinheiro em localização, se “eles entenderão”? Assim podiam vender os bens
criados para o mercado russo) – agora, novamente, de forma subjetiva, a quantidade
de bens localizados aumentou visivelmente. Além disso, os itens são fabricados para
o mercado da UE, e localizados para Ucrânia, e não para a CEI, como era dantes.
A
cultura ucraniana floresce. Este é um facto que este ano se tornou notável para
muitos. Estamos aguardando alguns anos para ver os primeiros resultados.
É
incrível ver como mudam os hábitos das pessoas em pouco tempo. Muitos amigos
neste ano celebraram o Natal em 25 de dezembro, em grande escala. Parece-me que
não haverá mais forças para o dia 7 de janeiro. Usando a minha bola de cristal
prevejo que na próxima década, o Natal principal na Ucrânia será 25 de dezembro
e o dia 7 de janeiro será algo como o dia 13 de janeiro (“o velho ano novo”). Uma espécie de anacronismo.
Hoje,
alguns não concordarão comigo, mas estou pronto para apostar e voltar à essa
questão daqui à 10 anos)). Agora tenho certeza: se introduzir o alfabeto latino
paralelamente com o alfabeto cirílico, então, no máximo de uma geração, Ucrânia
mudará suavemente e naturalmente ao alfabeto latino.
Eleições e Rússia
É
muito interessante que haverá daqui à um ano nas eleições. Eu quero acreditar
que Poroshenko vencerá (apesar de haver muitas reclamações/reivindicações), mas
parece que o populismo está muito presente no nosso povo e pode vencer um populista
voraz que promete formas supostamente simples de resolver os problemas
complexos.
Além
disso, parece-me que o resultado das novas eleições pode determinar a dita
“província”, onde não há “nenhuma mudança, tudo é mau/ruim, devolvem nos a
mortadela [ao preço soviético de] 2,50 [rublos]”.
Bem,
acho que já disse que aos ucranianos se tornou profundamente indiferente o que
está se passando na Rússia. Se não disse, então digo novamente – profundamente
indiferente.
Eu
nem sei quais músicas são lá populares, e nem quero saber. E apenas alguns anos
atrás, todos vivíamos na mesma lixeira cultural. Se algo acontecesse, todos
sabiam. Você se lembra de como [Alexey] Navalny era convidado para a TV ucraniana?
Agora é profundamente indiferente. E isso, na minha opinião, é ótimo)))
Ganhamos
a guerra na Donbas — é apenas uma questão de tempo. A integração europeia da
Ucrânia também é uma questão de futuro próximo. Além de outras questões.
Tudo
ficará bem))
Fotos:
GettyImages | Texto: Ihor Radysyuk
| Original: blogue do Maxim
Mirovich
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