Danylo Shumuk |
Estudando a história
dos movimentos de libertação da Ucrânia, OUN e UPA, os historiadores muitas vezes
se baseiam nos depoimentos que não deveriam originar as dúvidas sobre a sua
autenticidade. Mas realidade é diferente. As matérias factológicas necessitam de
uma verificação detalhada, principalmente as memórias dos combatentes da luta
de libertação nacional.
por: Ruslan Zabiliy,
diretor do Museu Memorial das vítimas dos regimes da ocupação “Cadeia na
Lonckoho” (Lviv)
Em 1974, em Paris,
foram publicadas as memórias do Danylo Shumuk, “Za shidnym obriem” (Além do
horizonte oriental), que brevemente se tornaram bastante conhecidas e
controversas.
capa dos memórias do Danylo Shumuk |
Danylo Shumuk nasceu na
Volyn em 1914. Foi adepto das ideias comunistas, filiado na juventude comunista
(Komsomol) e no Partido Comunista da Ucrânia Ocidental (KPZU). Em 1933, pelas
atividades comunistas a 2ª república polaca o condena aos 5 anos e 4 meses de
prisão efetiva. Desde a ocupação da Ucrânia Ocidental pela URSS em 1939, faz
parte da elite comunista, serve no Exército Vermelho, participa na guerra
soviética-nazi, é aprisionado pelos alemães, foge e em 1943 adere ao Exército
Insurgente Ucraniano (UPA).
Preso pelo NKVD em
1944, é condenado à pena capital, substituída pelos 20 anos de campos de
concentração. Já no GULAG participa na revolta de Norilsk (1953), reabilitado e
libertado em 1956. Mas em 1957 é novamente preso pela recusa de colaborar com
KGB, resultante em nova pena de 10 anos. Libertado em 1967 e pela 3ª vez preso
em 1972 pela escrita das suas memórias e distribuição da “literatura
antissoviética”. Em 1987 é finalmente liberado e emigra para Canadá. Volta à Ucrânia em
2002, vive no leste do país, onde morre em 2006. Ao título póstumo é condecorado
com a ordem “Pela Coragem do 1º grau”, passou 42 anos da sua vida nas cadeias e
campos de concentração soviéticas.
***
Durante a minha estadia
em Vilnius (Lituânia), tive a oportunidade de trabalhar nos arquivos do KGB da
Lituânia, onde consultei os documentos publicados nas “Obras da Escola superior
do KGB”. Na coletânea №43, encontrei o artigo do V. M. Shyschenko, intitulado “Sobre
a questão de termos e métodos de decomposição das organizações antissoviéticas
emigrantes”. O artigo descreve como KGB usou as memórias do Danylo Shumuk:
coletânea da escola superior do KGB |
“Por exemplo, para a publicação
no estrangeiro foi enviado, pelo canal controlado, o livro do antigo condenado
Danylo Shumuk, que em 1942-1945 era um dos líderes da estrutura dirigente
distrital da OUN.
No manuscrito foram colocadas
os dados de desinformação sobre a crueldade dos membros do serviço de segurança
(SB da OUN), sobre o fanatismo e limitação dos líderes, sobre as carnificinas
sangrentas dos seguidores da ONN-R (pró Stepan Bandera) sobre os da OUN-M
(pró-coronel Andriy Melnyk).
O livro […] originou as
desavenças entre os nacionalistas estrangeiros”.
Ou seja, no dia 15 de
janeiro de 1972, durante a detenção, KGB apreendeu as memórias do Danylo
Shumuk, estas, eventualmente, foram “trabalhadas” e “redigidas” pelo
“Departamento operativo-técnico” (OTO) e enviados para o estrangeiro pelo
“canal controlado”. Assim o manuscrito chegou à editora ucraniana Smoloskyp, que se tornou a vítima da
ação operativa do KGB.
O KGB tinha criado um
engenho explosivo de ação retardada que funciona até os dias de hoje. Funciona
nas guerras informativas em redor da memória nacional ucraniana. Quantos
engenhos semelhantes são desconhecidos por enquanto?
O problema da discussão
atual sobre a memória nacional, crimes do regime comunista, lustração, heróis,
criminosos, secretismo e revelação de segredos se prende à questão de sabermos
muito pouco e muito superficialmente sobre o nosso passado. A verdade sobre o
passado é a única maneira de curar as feridas do totalitarismo.
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