Numa
série de três episódios que contam sobre o trabalho dos fixers (aranjadores), Al Jazeera
falou com uma profissional que cobre a guerra russo-ucraniana no leste da
Ucrânia.
por:
Amira Abujbara, Aljazeera
English
Para
os fixers, as notícias são muitas vezes pessoais. Eles são residentes locais,
às também vezes são jornalistas, que servem como guias para correspondentes
estrangeiros.
Equipados
com conhecimentos locais íntimos, encontram histórias, asseguram entrevistas e
traduzem para correspondentes que podem ter pouca experiência do país do qual
estão fazer as suas reportagens. Muito depois de os correspondentes terem ido
embora, os fixers permanecem nas suas comunidades.
Se
eles fossem associados à uma história controversa, as consequências podem ser
severas – desde perseguição da opinião pública, prisão ou mesmo pior –
independentemente, de o fixer tiver (ou não) alguma influência sobre como a
história foi contada.
Em
2017, os 450 fixers e repórteres dos 70 países foram perguntados sobre o seu relacionamento
com os jornalistas, no decorrer de uma pesquisa do Global Reporting Centre.
A
maioria dos fixers disse que se sentiram que eles eram frequentemente ou sempre
usados para obter orientação logística; muitos disseram acreditar que sua
confiança tinha sido violada – alguns em termos de conteúdo editorial, para
outros em assuntos financeiros. Muitos disseram que raramente receberam crédito
por uma história e um pequeno número disse que eles – ou os seus parentes –
foram colocados em posição prejudicial,
no futuro.
Mas
a possibilidade de ajudar a moldar a maneira como seus países estão
representados na imprensa/mídia internacional pode ser uma atração poderosa,
mesmo que isso signifique arriscar suas vidas.
Na
primeira reportagem de uma série de três partes dedicada aos fixers, uma
ucraniana fala sobre sua vida na linha da frente.
Desde
a [Revolução de Dignidade / movimento Maydan] de 2014, Kateryna M., trabalhou com a BBC, Reuters, Al Jazeera
e outros meios de comunicação social para cobrir [a guerra russo-ucraniana] no
leste da Ucrânia.
Kateryna Malofeyeva (29) | foto @Roger Waleson |
Não
tenho medo de bombardeamentos, não tenho medo de balas. Tenho medo dos seres humanos,
porque neste conflito você nunca sabe quem são seus amigos e quem são seus
inimigos.
Foi
muito fácil no início do conflito [ser um fixer] porque ambos os lados estavam
normalmente interessados em mostrar-lhe as coisas, eles queriam puxá-lo ao
seu lado. Mas, mais tarde, uma vez que o conflito começou a se desenvolver, os
serviços de segurança começaram a operar.
Os
serviços de segurança podem considerar você como um espião, eles podem
verificar seu telefone, verificar seus documentos, eles podem entrar na sua
casa. Este é o ponto em que todas as organizações de mídia normalmente já estão
ausentes, eles vêm cá por duas semanas, fazem as suas reportagens e você fica
sozinha.
Os
fixers são algumas das pessoas mais vulneráveis neste conflito. Conheço
muitas pessoas [de ambos os lados] ameaçadas ou detidas ou interrogadas.
Emocionalmente é muito difícil.
Como
fixer você sente uma responsabilidade para com seus jornalistas, porque você
conhece a área melhor do que eles. Às vezes, eles não entendem a situação. Eu
sempre confiei no meu sentido do perigo. Eu confio na minha intuição, então eu
sabia quando era perigoso e quando não era, se devíamos ir ou se não
deveríamos.
Tudo
é feito na base da confiança pura. Você não possui nenhum seguro. Durante o meu
primeiro ano, trabalhei sem um colete de prova de bala, sem equipamentos de
segurança, sem kit médico, porque mesmo os meios de comunicação muito
conhecidas não os forneciam.
A
taxa diária normal para um fixer é entre 100 dólares e, ao máximo de 200-200
euros diários. Antes eu pensei que este era um dinheiro muito bom, mas agora já
não [por causa de] aumento de custos e despesas de vida.
Conheço
alguns jornalistas que começaram como fixers e acreditam em mim, 80% da
história depende do fixer. O que é interessante é que você nunca é mencionado
como contribuinte da matéria. Você ajuda os jornalistas a fazer grandes
histórias, e você nunca obtém vantagens pelo seu trabalho. Talvez você não seja
mencionado por razões de segurança. Mas as organizações de imprensa/mídia devem
ajudar aos fixers com algum tipo de treino.
As dicas de segurança por Michelle Shephard (na foto) foto @ijnet.org |
Ser
uma mulher na linha de frente é bastante fácil, porque [você pode] imaginar
soldados que ficam na linha de frente por seis meses sem ver uma mulher. Eles
sempre querem oferecer-lhe os [presentes], eles sempre querem mostrar-lhe
coisas porque precisam de mulheres. Às vezes, nos pontos de controlo você não sabe
o que esperar, pode haver um sujeito bêbado com uma arma, e ser uma mulher
fixer ajuda porque basta apenas sorrir para eles e o nível de raiva diminui.
Eu
não fui diretamente [sexualmente] assediada. Havia algumas coisas
meio-nojentas, como quando um tipo começou a cheirar o meu cabelo e disse: “eu
não cheirei uma mulher por seis meses, posso cheirar você?” Mas eu diria que
aquilo não era um assédio.
Ontem
falei com uma garota de 10 anos. Eu perguntei: “Como você estuda, você vai para
a escola?”
Ela
me respondeu: “Eu estava sentada à mesa e fazendo a lição de casa e de repente
houve uma explosão e as janelas tremeram e a porta foi aberta pela onda de
explosão”.
Você
pensa “oh, meu Deus, ela é um anjo completo”, e não sabe como ajudá-la. É uma
situação irreal. E foi assim durante anos. E eles dizem que o conflito está
congelado, mas não está congelado. Posso confirmar que não está congelado.
Esta entrevista foi
editada [pela Aljazeera]
para maior clareza e duração e traduzida ao português por @Ucrânia em África.
1 comentário:
Essa serie e boa?
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