quinta-feira, maio 17, 2012

Que estado foi construído na Ucrânia


Tal como alguns anos atras, durante a Revolução Laranja, a Ucrânia está novamente no centro da atenção da imprensa mundial. As perguntas dos jornalistas ocidentais são tipificadas: estado de saúde da Yulia Tymoshenko, porque ela foi vítima da violência, boicote do Euro-2012.

por: Vitali Portnikov

Um dos jornais britânicos com uma certa perplexidade nota que Yanukovych, que gastou centenas de milhões de dólares para a preparação do campeonato e reconstrução do estádio Olímpico em Kyiv, onde será realizado o final do campeonato, se arrisca em ficar sozinho na tribuna VIP. Os políticos e jornalistas ocidentais absolutamente honestamente não entendem: porque a situação com Tymoshenko foi levada à violência, ao absurdo, exatamente nas vésperas do campeonato e da Cimeira dos países da Europa Central, preparada em Kyiv como um dos acontecimentos internacionais mais importantes do ano. Porque o poder que se deveria preocupar com o prestígio internacional, pois isso significa o turismo, investimento, dinheiro, preferiu estreitar a imagem da Ucrânia até a célula prisional na colônia de Kachanivska?

Mas existe a lógica nestes acontecimentos, é a lógica do próprio processo das transformações ucranianas. Aqueles que acham que após a subida ao poder, Viktor Yanukovych tenta transformar a Ucrânia em uma espécie da Rússia do Putin ou da Belarus do Lukashenka e por isso tão decididamente “limpa” os adversários, estão errados. Yanukovych não é Lukashenka ou Putin, tal como a Ucrânia não é Rússia ou Belarus.

Lukashenka começou criar o seu regime à partir de zero, agora, após as sanções da Europa sabemos com surpresa que no país existem uns certos “financeiros presidenciais”, quase oligarcas, mas controlados em absoluto pelo Lukashenka. Belarus é um país do autoritarismo da nomenclatura, baseado na tradição soviética, e este estado só é possível criar apenas usufruindo da mentalidade e da economia soviéticas. Putin chegou ao poder no país onde as posições dos oligarcas eram fortes, e por isso eles, juntamente com os burocratas próximos, ditavam as regras do jogo. Estes oligarcas não desapareceram, para se entender com eles e ocupar o seu lugar no poder, Putin adotou uma série de passos e medidas que determinaram a face da Rússia como autocracia da oligarquia e da nomenclatura. Assim era a Ucrânia durante a cadência do Leonid Kuchma e maioritariamente continuava assim sob Viktor Yuschenko.

Yanukovych tenta construir no país uma novidade para o espaço pós-soviético, o regime já aprovado na província de Donetsk, o regime da simbiose entre a criminalidade organizada e a nomenclatura. Neste regime podem existir os oligarcas e os burocratas, mas as regras do jogo são diferentes: você já nunca conseguirá entender onde começa a criminalidade e acaba o estado. A fronteira que é possível sentir na Rússia e na Belarus, não foi simplesmente ultrapassada, foi aniquilada. Neste sentido, Ucrânia do Yanukovych é um estado absolutamente novo no espaço pós-soviético e por isso ninguém compreende as suas regras do jogo.

Porque estas regras não existem. Existe a vontade da primeira pessoa, que não se baseia nos cálculos, mas é dominada pelas vontades instantâneas, emoções e visões da vida. Essa vontade pode ser influenciada pelo velho amigo, filho, anacoreta da Lavra ou do mosteiro de Afone (dois últimos até mais do que o amigo e filho). Mas essa influência nunca será baseada nos pensamentos sobre o futuro e nunca será politicamente viável. Mais, mesmo o dia de hoje será definido não pela realidade, mas pela visão da realidade. É por isso que quaisquer ações do poder são monstruosamente deformados e caricatos.

Não faz o sentido de procurar as razões da transferência forçada da Yulia Tymoshenko da cadeia para hospital e depois de volta para a prisão – essa foi a vontade superior. Não faz o sentido de procurar as razões da prisão e da condenação da Tymoshenko, foi a vontade. Não faz o sentido de procurar a racionalidade na vontade de encarcerar Tymoshenko exatamente pelos acordos do gás, o que ofendeu Putin, foi a vontade. Não faz o sentido de procurar a lógica em todos os subsequentes passos do poder ucraniano, não a haverá.

A lógica dos processos está na sua falta da lógica. O estado criminal e da nomenclatura não se pode desenvolver de uma maneira diferente, pois o poder vive pelas suas próprias regras do jogo e não pela lógica política ou social. Estas regras negam o racional, pois ao contrário não garantiriam a sobrevivência dos titulares. Estas regras negam a moralidade, senão se deveria sofrer com a consciência, algo que eles não possuem. Essas regras negam a estratégia, pois morra você hoje, mas eu amanha.

A Ucrânia hoje é um local privilegiado para os estudiosos do autoritarismo, que tomou as formas absolutamente especiais de opereta grotesca, parece que descritas nas velhas comédias soviéticas, do tipo “Casamento em Malinovka”. Só que os cidadãos do país não estão ver a piada nisso, pois uma coisa é assistir a opereta na TV e outra coisa se transformar em convidados e serventes da mesma. Ouvir os discursos do chefão, pagar as propinas ao seu lugar-tenente e esperar que o bandido que se tornou o chefe das polícias te defenderá dos outros bandidos. Nos já aprendemos que a tragédia sempre se repete em forma de farsa, agora sabemos ainda que farsa sempre se repete em forma da tragédia…

Fonte:

Ver “Casamento em Malinovka”, 92 min

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