Os
fãs da URSS adoram explicar a derrocada da União Soviética, socorrendo-se de
teorias de conspiração, baseadas nos supostos planos maléficos do Allen W.
Dulles ou Otto von Bismarck. Alternativamente, eis 4 razões verídicas, que realmente derrubaram o
primeiro país comunista do mundo.
1.
Derrocada da ideologia soviética
No
início da década de 1980, a ideologia soviética vivia o seu colapso final. A guerra
no Afeganistão parecia estranha e anacrónica – quando os rapazes de 18-20 anos,
calçando sapatilhas/tênis Adidas, tinham que morrer pelos chavões, bastante ultrapassados,
da propaganda bolchevique.
O
colapso do sistema soviético foi pré-programado na sua mitologia dogmática.
Como observaram corretamente os estudiosos do sistema soviético (Sam Harris,
Karl Popper ou Bertrand Russell), o sistema soviético tinha na URSS características
praticamente religiosas – havia “profetas” – Karl Marx, “messias” – Lenine e “apóstolos”
– os seus discípulos, reais ou imaginários. Todos os fieis do sistema comunista
acabariam no “paraíso” – comunismo, no caminho ao qual era necessário aniquilar
muitos inimigos (“infiéis” ou “hereges”). O sistema soviético também possuía
vários dogmas ideológicos e históricos, negar as quais era considerado um crime.
Nas
décadas de 1920-30, os camponeses e operários semianalfabetos ainda viam este
sistema como algo “científico”. Mas nas décadas de 1960 e 1970, cresceu uma
nova geração de cidadãos com uma visão muito mais ampla, que começou a
questionar o dogma soviético. Como resultado, a ideologia soviética dos anos
1970 foi alvo de piadas, nos anos 1980 – de artigos críticos dos dissidentes, e
em 1985 já ninguém acreditava que um dia chegaria o tal “comunismo”, onde todos
os bens seriam dados aos cidadãos de forma livre e “segundo às suas
necessidades”.
2.
Comparação com a vida no Ocidente
Até
às décadas de 1940-50 quase todas as informações sobre a vida fora da URSS eram
inacessíveis à maioria dos cidadãos, já nas décadas de 1970 e 1980, com o
crescimento da globalização e da difusão do rádio e da televisão, tornou-se
mais acessível a comparação. Em geral, engenheiros, médicos e trabalhadores
soviéticos conseguiam perceber que os seus colegas no “Ocidente decadente” viviam
de forma muito mais confortável e com muito mais decência do que eles próprios
na URSS.
"Glória ao trabalho": exemplo da típica propaganda monumental soviética |
Quando
um operário qualificado nos EUA vivia numa casa decente, possuía um carro
pessoal e podia viajar ao exterior, um trabalhador soviético, na melhor das
hipóteses, vivia, com sua família num reles apartamento T1, sobrevivendo com o salário
magro e de todo entretenimento possível tinha apenas hóquei na TV e cerveja /
vodca baratas na companhia de amigos.
3.
Aceitação de valores humanos universais
Se
analisarmos as obras de arte soviéticas das décadas de 1920-1940, verificaremos
que absoluta maioria estava completamente repleta de ideologia, militância e militarismo
soviéticos. Espiões, comboios/trens blindados, ataques de cavalaria,
metralhadoras, segredos militares: “incêndio em redor, vestígios na neve, e os
regimentos burgueses, tocando o tambor de cobre, marcham em guerra dos países
distantes”, escrevia Arkady Gaydar.
"Abaixo leninismo" |
Nas
décadas de 1970-1980, a situação mudou drasticamente. Outros tópicos,
humanistas e universais, começaram ser evocados na cultura. Os cartoons
soviéticos da mesma época, com raras exceções, contavam as histórias humanistas.
O famoso gato Leopoldo, para ser gentil, não precisava ser militante do PCUS. O
Pequeno Guaxinim, que sorria para seu reflexo no lago, não saberia quem era Lenine
e gotinha Kapitoshka, para ser feliz, seguramente não tinha que aprender os
princípios do marxismo-leninismo.
4.
Chegada da sociedade de informação
A
ditadura soviética de 1920-1950 se manteve na base do défice de informação. Os
cidadãos da URSS eram privados praticamente de todas as fontes de informação
independentes, e sobre todos os eventos que ocorriam no mundo, eram informados através
da propaganda soviética, baseada nos dogmas do marxismo-leninismo.
Com
o passar do tempo, esse bloqueio de informações tornou-se cada vez mais difícil
de manter. Cidadãos soviéticos começaram a viajar ao exterior, trazendo
histórias sobre como as coisas realmente estavam no Ocidente. Várias estações
de rádio ocidentais (e não só) ofereciam a interpretação não soviética e não
comunista do mundo – uma alternativa poderosa à mídia soviética dogmática. A sonegação da
informação pelo governo soviético, sobre as repressões das décadas de 1930-50, acidente
de Chornobyl ou a guerra no Afeganistão – teve o efeito de uma bomba informativa.
A
chegada da sociedade da informação, quando todos têm o direito de receber, divulgar
e interpretar livremente determinadas informações, tornou-se uma das principais
causas do colapso da URSS. O partido comunista soviético, com a sua
interpretação “unicamente correta” dos fa(c)tos e eventos, tornou-se um
atavismo risível e ridículo.
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