Será que irá ser tapada
pelas comemorações falsas e de fachada, que reinam atualmente na Ucrânia no dia
9 de maio?
por: Vasyl Ilnytskiy, cidade
de Uzhhorod
Cerca de dez anos atrás,
os documentalistas ucranianos, liderados pelo realizador Serhiy Bukovskiy produziram
um importante filme chamado “Guerra – a conta ucraniana”. O filme
desmistificava a mitologia soviética da “Grande Guerra patriótica”, obrigava os
espetadores encarar a 2ª G.M., através dos destinos de milhões de pessoas
mortas e feridas, que passaram pelo inferno terrestre da guerra. Pois,
provavelmente, cada família ucraniana tem uma conta naquela guerra. A minha
também…
Após a ocupação da Ucrânia
dos Cárpatos pelo exército húngaro em março de 1939, milhares de ucranianos
fugindo das cadeias, miséria, hungarização forçada, mobilização compulsiva aos
trabalhos e depois ao exército húngaro, procuravam a salvação na URSS. O irmão
do meu pai, Mykhaylo Ilnytskiy, fugiu para URSS em 1940, para evitar a
mobilização à tropa húngara. Na URSS ele foi imediatamente preso e julgado pela
“travessia ilegal da fronteira”, morrendo em 1941 no campo de concentração soviético
de PechorLAG. A nossa família
foi informada sobre o seu destino triste apenas em 1990, durante a Perestroica
do Gorbachov. O sistema judicial, ainda soviético, reabilitou o meu tio e
devolveu-nos os seus pertences pessoais: documentos de identificação emitidos
pela Checoslováquia e Hungria, fotos e um bloco de notas rústico com os textos
de canções populares ucranianas, eslovacas, húngaros e inesperadamente, “A Internacional”…
No mesmo ano, o meu
pai, Ivan Ilnytskiy (nascido em 1916), e os tios, Pavlo Betsa (1914) e Mykhaylo
Voshepynets (1910) foram mobilizados ao exército real da Hungria. O pai,
digamos, teve sorte, enviado à unidade de artilheria, onde por não falar húngaro,
como a maioria dos ucranianos alistados, foi colocado como condutor dos cavalos
que transportavam os canhões. A sua unidade entrou em combates em março de 1945,
o meu pai foi ferido por algum soldado da 3ª Frente ucraniana do Exército
vermelho. Passando 3 anos na guerra, ele nunca teve o direito de se chamar
veterano, pois vestia uniforme do exército “alheio”.
Já os tios tiveram
menos sorte. Foram colocados nas fileiras do 2º Exército húngaro que na batalha
de Estalinegrado perdeu cerca de 150.000 homens (85% dos seus efetivos), entre
prisioneiros, feridos e mortos. Os tios se entregaram aos soviéticos na
primeira oportunidade, nenhum deles queria morrer pelo país alheio. Mas nem no
pesadelo mais assustador eles imaginavam o inferno que os esperava.
Primeiro, foi a longa marcha
de pé entre frio terrível e as cuspidelas e insultos da população local, depois
as torturas pelo frio e fome no campo de prisioneiros da guerra. Após apenas
alguns meses no campo soviético, o tio Mykhaylo Voshepynets, aos seus 33 anos,
pesava cerca de 30 kg. Ao seu lado, diariamente morriam centenas dos seus camaradas,
italianos, croatas, húngaros, ucranianos. O tio sobreviveu graças aos seus
conhecimentos parcos da língua russa, ele trabalhou na equipa que sepultava os
mortos, recebendo alguma alimentação extra pelo trabalho.
A salvação da morte
certa veio na possibilidade de se alistar na Legião
Checoslovaca, que foi formada em 1942 e após uma curta formação militar, colocada
em combate contra as tropas alemães de elite nas batalhas pelo Kharkiv (aldeia de
Sokolove), Kyiv,
Bila Tserkva e Korsun-Shevchenkovsky.
Os “legionários”
sobreviventes sonhavam em libertar a sua terra dos ocupantes, levar a liberdade
às suas famílias. Mas Estaline não pretendia que os soldados experientes, tendo
a cidadania estrangeira pudessem interferir nos seus planos sobre o futuro dos
Cárpatos. A Legião Checoslovaca foi lançada num ataque frontal contra os alemães
na passagem de Dukliany,
onde em 80 dias de combates o Exército vermelho perdeu cerca de 150.000
efetivos.
Feridos por balas e
estilhaços, sofrendo as contusões, mas extremamente felizes por estarem vivos,
voltavam os ucranianos da Transcarpátia para casa. Mas quando eles, conjuntamente
com os seus camaradas limpavam a Europa do nazismo, na sua casa um novo país
criava o novo sistema repressivo.
Pelo Calvário da 2ª
G.M., alistados nos diversos exércitos, em ambas partes da frente, passaram
dezenas de milhares dos meus conterrâneos da Transcarpátia. Uma minoria teve
sorte e não foi sepultada em valas comuns nas terras longínquas, ou
simplesmente conseguiu sair com a vida dos campos de concentração soviéticos e
nazis. Agora, entre nos, os verdadeiros veteranos são pouquíssimos, pois os
seus regimentos e divisões já muito tempo que se pacificaram nos seus. Nestes
dias de maio, vamos os recordar e oraremos por eles. Pelos que morreram em
combate, sucumbiram mais tarde aos ferimentos, ou vivia durante anos, segurando
a dor, causada pela guerra. Os recordaremos sem a falsidade ou celebrações refinadas
de fachada. Talvez assim, cada conta pessoal nossa, daquela guerra, será paga,
pelo menos parcialmente.
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