Durante longo período da ocupação soviética da Ucrânia, a bandeira nacional ucraniana era proibida e a sua posse ou exposição pública era sentenciada com a pena de morte ou a prisão nos campos de concentração.
por: Andriy Kvyatkovskiy *
Na Ucrânia o Dia da Bandeira Nacional é celebrado duas vezes, no dia 24 de Julho apenas em Kyiv (por ocasião do içamento da bandeira nacional na Câmara Municipal de Kyiv em 1990) e no dia 23 de Agosto, festa nacional estabelecida pelo Decreto presidencial de 2004 (o içamento da bandeira nacional no parlamento ucraniano em 1991). Mas nem sempre foi assim...
Em 1958 na aldeia de Verbytsya no distrito de Khodoriv na província de Lviv foi criado um grupo clandestino que içava as bandeiras nacionais e divulgava os folhetos anti-soviéticos. Em 1962 (durante a “primavera” de Khrushev!), o líder do grupo, Fedir Protsiv foi sentenciado à morte, outros 6 resistentes receberam as penas de prisão entre 8 à 15 anos.
Em Novembro de 1961 na aldeia de Vytvytsya na província de Ternopil, o miliciano soviético Mykhaylo Dyak içou a bandeira ucraniana. Ele não foi descoberto e serviu de inspiração para a criação da Frente Nacional Ucraniana, organização clandestina activa até 1967.
No dia 1 de Maio de 1966 dois jovens operários ucranianos, o serralheiro Georgiy Moscalenko e trabalhador da construção civil, Viktor Kuksa trocaram a bandeira soviética vermelha pela bandeira ucraniana no edifício do Instituto da Economia Popular de Kyiv (onde desde os anos 1960 estudavam os bolseiros da África lusófona). A bandeira ucraniana continha tryzub e as letras do Hino nacional ucraniano (também proibido na URSS). Quase um ano o grupo especial do KGB procurou pelos autores do acto corajoso, no fim eles foram sentenciados à 2 e 3 anos da prisão nos campos de concentração em Mordóvia. A procuradoria geral da Ucrânia já independente dificultou o processo de reabilitação do Georgiy Moscalenko e Viktor Kuksa, mas acabou por ceder perante a pressão da sociedade civil.
Para comemorar o 55° aniversário da proclamação da República Popular da Ucrânia Ocidental (ZUNR), na noite de 22 de Janeiro de 1973 na vila de Chortkiv, província de Ternopil, foram içadas 4 bandeiras nacionais e espalhados diversos folhetos. O povo repetia a frase do guarda do cinema local, onde foi hasteada uma das bandeiras: “Á noite olho – a vossa bandeira, de manha vejo – a nossa bandeira”. A acção era da autoria dos 9 jovens activistas da aldeia vizinha de Rosokhach, quase todos eles foram presos e enviados aos campos de concentração da Mordóvia.
O aposentado ucraniano Borys Zakharovych Nebesnyuk também tem uma história ímpar. O seu pai era camponês, em 1958 passou um ano na prisão pelo roubo de um saco de feno no kolkhoz. Tio – Vasyl Nebesnyuk foi membro da OUN desde década 1930, comandava uma unidade do UPA e morreu em combate em 1948.
Em 1964 Borys Nebesnyuk foi graduado pela escola de enfermagem de Kharkiv e enviado ao kolkhoz para ajudar na lavoura de repolho na província de Dnipropetrovsk (prática comum na URSS). Na escola de enfermagem, ele fazia parte de um grupo patriótico clandestino de 11 estudantes, chefiado pelo professor Hryhoriy Pysarenko. Professor Pysarenko pertencia à uma família ucraniana patriótica, alegadamente, ele manteve os contactos directos com os dissidentes ucranianos em Kyiv.
Juntamente com Nebesnyuk, foram enviados ao kolkhoz mais dois membros do grupo, Vasyl Osadchuk e Dmytro Sobolyuk, ambos tiveram os familiares a lutar no UPA. Nas vésperas do aniversário do golpe comunista de 1917, celebrado anualmente no dia 7 de Novembro, eles decidiram trocar a bandeira vermelha do clube local pela bandeira ucraniana. Compraram quatro camisas checoslovacas de nylon, duas azuis e duas amarelas, pediram sua amiga local, Zina, para fazer a bandeira. A rapariga não sabia o que fazia, disseram que era a bandeira estudantil. Zina não foi descoberta, ninguém do grupo denunciou-a. Os nossos “bandeirantes” nem sabiam direito a ordem da colocação das faixas na bandeira, que ficou “amarela e azul”, em vez de azul e amarela.
Quando a bandeira foi hasteada, o chefe do comité local do partido comunista avisou o KGB. Dois rapazes foram presos imediatamente, Borys Nebesnyuk fugiu, mas também foi rapidamente detido. A investigação se desenrolou em Kharkiv, ninguém denunciou os restantes colegas do grupo clandestino. O julgamento público decorreu no recinto da fábrica Malyshev em Abril de 1965. Os estudantes locais eram obrigados assistir o julgamento e gritar “Fu-zi-lar! Fu-zi-lar! Ban-deris-tas!”
Primeiramente, a sua sentença era de apenas 2 anos da cadeia, ao abrigo do artigo 140 do código penal ucraniano (“Roubo”), foram acusados de roubar as camisas compradas legalmente. Apenas dois meses antes do fim da pena foi feito o novo julgamento, eles foram acusados ao abrigo do artigo 142, parte 3 (“Roubo à mão armada que causou danos físicos severos”). Foram sentenciados à pena capital, que após apelação ao procurador – geral da URSS foi comutada para 15 anos da cadeia, mais 5 anos de degredo. Desta vez os amigos foram separados e Borys Nebesnyuk desconhece o seu destino. Ele cumpriu a pena em Kharkiv, em 1967, por ocasião do 50° aniversário do poder soviético foram lhe “perdoados” 4 anos, em 1970 (100° aniversario do nascimento do Lenin) “perdoaram” lhe dois anos do degredo. Também foram contabilizados dois anos da primeira pena. Assim Borys Nebesnyuk saiu em liberdade em 1972.
Viveu o degredo na república autónoma russa de Komi. Só em 1975 voltou para Ucrânia sem direito de viver nas grandes cidades (a regra do “101° quilómetro”). Trabalhou na construção civil. Aposentado desde 2006, a sua pensão é de 287 UAH (36 USD). Não foi reabilitado, pois era condenado pelos artigos “criminais”. A prática soviética e ucraniana determinava que os dossiers dos casos criminais (diferentemente dos casos políticos), eram guardados nos arquivos do Ministério do Interior durante um certo período de anos, depois eram destruídos. No caso do nosso “bandeirante”, desde a sua detenção já decorreram 47 anos...
Fonte:
* Sobre o autor: jornalista, editor do jornal ucraniano lendário “Post-Postup”, co-autor do livro “Cemitério de Lychakiv” (ISBN 9667188280).
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