Entrevista publicada no Caderno Urbe no dia 30.03.2008 no "Jornal da Manhã" – Ponta Grossa, Paraná, Brasil
Ligado ao cinema há 12 anos, Guto Pasko, que dirigiu filmes como “Sociedade” (2004), “Antonina, Morretes e Paranaguá – Unidas pela História” (2005, co-director junto com Maria Fernanda Cordeiro), “Made in Ucrânia”(2006) e “Olhares” (2007, director assistente e produtor do filme, que será lançado neste ano), é hoje o presidente da AVEC (Associação de Cinema e Vídeo do Paraná). Para ele, apesar de todos os percalços, o cinema vive o seu melhor momento no Estado. Embora o mercado cinematográfico regional ainda seja restrito, "as coisas estão mudando". E para melhor. O resultado disso são 16 longas – metragens em processo de produção, finalização, exibição e lançamento. Acompanhe os principais trechos da entrevista realizada via e-mail:
JORNAL DA MANHÃ – Como está o mercado cinematográfico no Paraná?
GUTO PASKO - Diria que estamos vivendo o nosso melhor momento histórico. Actualmente existem 16 longas metragens no Estado em processo de produção, finalização, em exibição nas salas de cinema e circuitos alternativos ou em fase de lançamento. Sem dúvidas, uma marca expressiva para o audiovisual brasileiro, levando-se em consideração que estamos à margem do eixo tradicionalmente produtor. Longas –metragens como 'Estômago', de Marcos Jorge, e 'Brichos', de Paulo Munhoz, ganharam destaque no cenário nacional, sem considerar a boa safra de curtas – metragens, principalmente de jovens realizadores, como 'Satori Uso', de Rodrigo Grota, de Londrina, e 'Outubro', de Murilo Hauser, de Curitiba.
JM - Como é fazer cinema em um estado que não faz parte do tradicional circuito cinematográfico do país – Rio de Janeiro e São Paulo?
PASKO - Claro que ainda não é fácil, mas as coisas estão mudando. O Paraná tem ganhado grande destaque no cenário nacional através das produções recentes. O filme 'Estômago', de Marcos Jorge, certamente será um novo marco na história do nosso cinema pela projecção que alcançou após ganhar quatro prémios no Festival do Rio de Janeiro, que hoje é considerado o mais importante do País em termos de projecção para o mercado. Os prémios foram de melhor filme pelo voto popular, director e actor (para João Miguel) e prémio especial do júri para o actor Babu Santana. O longa – metragem estreia nos cinemas dias 11 de Abril. Outro filme importante do Paraná no ano passado foi 'Brichos', de Paulo Munhoz – o primeiro longa – metragem de animação do Estado. Essa visibilidade ajuda a provar que temos sim bons cineastas no Estado e isso contribui para a selecção de novos projectos.
PASKO - Claro que ainda não é fácil, mas as coisas estão mudando. O Paraná tem ganhado grande destaque no cenário nacional através das produções recentes. O filme 'Estômago', de Marcos Jorge, certamente será um novo marco na história do nosso cinema pela projecção que alcançou após ganhar quatro prémios no Festival do Rio de Janeiro, que hoje é considerado o mais importante do País em termos de projecção para o mercado. Os prémios foram de melhor filme pelo voto popular, director e actor (para João Miguel) e prémio especial do júri para o actor Babu Santana. O longa – metragem estreia nos cinemas dias 11 de Abril. Outro filme importante do Paraná no ano passado foi 'Brichos', de Paulo Munhoz – o primeiro longa – metragem de animação do Estado. Essa visibilidade ajuda a provar que temos sim bons cineastas no Estado e isso contribui para a selecção de novos projectos.
JM – Como você avalia o centenário do cinema paranaense?
PASKO - O cinema paranaense completou o seu centenário dia 15 de novembro de 2007. Annibal Requião foi o primeiro a filmar no Paraná em 1907. Depois vieram João B. Groff, Arthur Rogge, José Cleto, Hikoma Udihara e Vladimir Kozák, que até a década de 60 pontuaram a filmografia paranaense documentando o quotidiano da sociedade local. O primeiro longa – metragem de ficção do Paraná a ganhar destaque nacional foi 'Lance Maior', de Sylvio Back, produzido em 1968. Em 1975, Valêncio Xavier, outro importante nome do cinema paranaense, fundou a Cinemateca de Curitiba, que passou então a influenciar toda uma nova geração de cineastas, conhecidos hoje como 'Geração Cinemateca'. No início da década de 90 surgem núcleos de produção no interior no Estado, com destaque para Cascavel, Londrina e Maringá. Em 1992 foi fundada a AVEC (Associação de Cinema e Vídeo do Paraná), entidade que desde então tem sido fundamental para a consolidação do audiovisual paranaense e que teve papel de grande importância na articulação para que fosse criada em 1993 a Lei Municipal de Incentivo à Cultura de Curitiba, que foi uma das primeiras do Brasil e que tem desde então propiciado a produção regular em Curitiba, principalmente de curtas –metragens e documentários.
Outra conquista importante do cinema paranaense foi o Prémio Estadual de Cinema e Vídeo em 2004, projecto de lei idealizado pela AVEC e SIAPAR (Sindicato da Indústria Audiovisual do Paraná), que neste momento está caminhando para sua terceira edição e prevê anualmente um concurso para a produção de um longa – metragem em 35mm com o valor de R$ 1 milhão e mais três tele – filmes com o valor de R$ 180 mil para cada um. Somente este prémio possibilitou nas duas primeiras edições a produção de oito longas – metragens, uma vez que os tele – filmes acabaram se tornando longas – metragens digitais, entre eles o documentário 'Made in Ucrânia – Os Ucranianos no Paraná', do qual sou o produtor e director.
Outra conquista importante do cinema paranaense foi o Prémio Estadual de Cinema e Vídeo em 2004, projecto de lei idealizado pela AVEC e SIAPAR (Sindicato da Indústria Audiovisual do Paraná), que neste momento está caminhando para sua terceira edição e prevê anualmente um concurso para a produção de um longa – metragem em 35mm com o valor de R$ 1 milhão e mais três tele – filmes com o valor de R$ 180 mil para cada um. Somente este prémio possibilitou nas duas primeiras edições a produção de oito longas – metragens, uma vez que os tele – filmes acabaram se tornando longas – metragens digitais, entre eles o documentário 'Made in Ucrânia – Os Ucranianos no Paraná', do qual sou o produtor e director.
JM – Existe um 'estilo paranaense' de cinema?
PASKO – Pesquisadores e realizadores afirmam que o cinema paranaense não conseguiu ainda uma identidade própria e a sua principal riqueza talvez esteja justamente na sua diversidade. Particularmente acho que o cinema paranaense explorou até agora muito pouco das suas raízes, como a vasta quantidade de imigrantes que compõem o nosso Estado, o que faz jus a sermos chamados de "terra de todas as gentes". O meu último filme, 'Made in Ucrânia – Os Ucranianos no Paraná', vai nessa direcção, de mostrar um pouco das raízes históricas do Paraná. Conhecemos e exploramos muito pouco cinematograficamente também as nossas paisagens naturais, como a dos Campos Gerais, que são belíssimas. Portanto, acho que nossos próprios temas foram pouco abordados nas telas, com uma ou outra excepção como os índios, os japoneses e os poloneses que já foram trabalhados por realizadores locais. O cinema gaúcho, por exemplo, conseguiu imprimir as suas raízes muito bem nas telas. Certamente eles são muito mais 'bairristas' e apegados aos seus valores regionais que nós paranaenses, que até pela diversidade, fica difícil de saber o que ou quem é. Um importante filme que foi lançado neste ano pelo cineasta Geraldo Pioli é 'Belarmino e Gabriela', que trata da história de vida desta que foi a mais importante dupla caipira ou de música de raiz do Paraná e este belo documentário tem tido uma grande repercussão junto ao público paranaense porque existe uma identificação muito forte. Quando falo que temos que retractar mais nossas próprias raízes, falo disso.
Acho que só iremos ter um estilo ou identidade própria, quando pusermos mais a nossa própria cara nas telas. Como diz o cineasta Paulo Munhoz, "temos que assumir de vez o nosso sotaque". Mas isso tudo é um processo. Até então também as condições de produção cinematográfica no Estado eram muito adversas. Com o novo momento que estamos passando e se mantivermos isso em ascensão, acredito que ainda irá surgir um 'estilo paranaense' de cinema.
JM – Qual a possibilidade de se fazer cinema fora dos tradicionais meios de obtenção de recursos, ou seja, sem dinheiro governamental?
PASKO – É muito complicado. Ainda dependemos do Estado para poder produzir cinema no Brasil. Se não fossem as Leis de Incentivo e os Editais Públicos para a produção, não teríamos filmes no Brasil. Um exemplo clássico recente é a era Collor, que ao acabar com qualquer tipo de financiamento do Estado, tivemos apenas dois filmes produzidos no período e hoje são cerca de 50 por ano. Eu particularmente defendo que temos que criar mecanismos de auto sustentabilidade para os nossos filmes porque senão nunca chegaremos a uma indústria cinematográfica de fato, onde a própria actividade alimenta toda a cadeia. Quando você está começando, como é o meu caso e de tantos outros, é sempre ainda mais difícil. A maioria das minhas produções foi até agora de uma forma independente, ou seja, sem grana de incentivo ou quase sem grana de incentivo fiscal. O 'Sociedade', meu primeiro longa – metragem de ficção, por exemplo, foi quase um acto de insanidade. É um longa – metragem digital, produzido sem nenhum centavo de patrocínios. Até hoje não sei como eu consegui convencer e reunir um bando de malucos que entraram na minha ideia. Todo mundo trabalhou de graça no filme. Consegui duas câmaras emprestadas e editei na ilha de um amigo, que passou então a trabalhar comigo logo na sequência. A equipe técnica e elenco era totalmente iniciante, com excepção do director de Fotografia, que foi o 'mestre' Euclides Fantin, com a sua generosidade de sempre, que topou o desafio e literalmente teve que fazer milagre com os equipamentos de iluminação que consegui disponibilizar para ele, ou seja, apenas três mini-bruts. O elenco é composto por 47 actores todos eles iniciantes, o que compromete também algumas cenas em termos de interpretação, mas era o que eu tinha na mão... Enfim, foi uma grande escola para todos nós, principalmente para mim, que nunca tive outra escolha a não ser aprender fazendo. Quando a gente está começando, é muito difícil também conseguir levantar recursos via editais públicos e/ou leis de incentivo, porque não basta apenas aprovar o projecto na Lei Municipal ou Rouanet, é preciso depois captar essa grana no mercado junto às empresas e ninguém vai por dinheiro em um filme de alguém que ninguém conhece ou ouviu falar minimamente. Não tem jeito: CURRICULO DE CINEASTA É FILME. Então, tive que começar a fazer filmes para poder dizer que também era ou pretendia ser cineasta para poder de alguma forma me inserir no mercado. E o 'Sociedade' me possibilitou isso, de dar a cara para bater na praça e dizer... estou aqui! Mas certamente não repetiria isso.
PASKO – É muito complicado. Ainda dependemos do Estado para poder produzir cinema no Brasil. Se não fossem as Leis de Incentivo e os Editais Públicos para a produção, não teríamos filmes no Brasil. Um exemplo clássico recente é a era Collor, que ao acabar com qualquer tipo de financiamento do Estado, tivemos apenas dois filmes produzidos no período e hoje são cerca de 50 por ano. Eu particularmente defendo que temos que criar mecanismos de auto sustentabilidade para os nossos filmes porque senão nunca chegaremos a uma indústria cinematográfica de fato, onde a própria actividade alimenta toda a cadeia. Quando você está começando, como é o meu caso e de tantos outros, é sempre ainda mais difícil. A maioria das minhas produções foi até agora de uma forma independente, ou seja, sem grana de incentivo ou quase sem grana de incentivo fiscal. O 'Sociedade', meu primeiro longa – metragem de ficção, por exemplo, foi quase um acto de insanidade. É um longa – metragem digital, produzido sem nenhum centavo de patrocínios. Até hoje não sei como eu consegui convencer e reunir um bando de malucos que entraram na minha ideia. Todo mundo trabalhou de graça no filme. Consegui duas câmaras emprestadas e editei na ilha de um amigo, que passou então a trabalhar comigo logo na sequência. A equipe técnica e elenco era totalmente iniciante, com excepção do director de Fotografia, que foi o 'mestre' Euclides Fantin, com a sua generosidade de sempre, que topou o desafio e literalmente teve que fazer milagre com os equipamentos de iluminação que consegui disponibilizar para ele, ou seja, apenas três mini-bruts. O elenco é composto por 47 actores todos eles iniciantes, o que compromete também algumas cenas em termos de interpretação, mas era o que eu tinha na mão... Enfim, foi uma grande escola para todos nós, principalmente para mim, que nunca tive outra escolha a não ser aprender fazendo. Quando a gente está começando, é muito difícil também conseguir levantar recursos via editais públicos e/ou leis de incentivo, porque não basta apenas aprovar o projecto na Lei Municipal ou Rouanet, é preciso depois captar essa grana no mercado junto às empresas e ninguém vai por dinheiro em um filme de alguém que ninguém conhece ou ouviu falar minimamente. Não tem jeito: CURRICULO DE CINEASTA É FILME. Então, tive que começar a fazer filmes para poder dizer que também era ou pretendia ser cineasta para poder de alguma forma me inserir no mercado. E o 'Sociedade' me possibilitou isso, de dar a cara para bater na praça e dizer... estou aqui! Mas certamente não repetiria isso.
JM – De que forma a produção estadual se insere/tem participação na produção nacional?
PASKO - Como já falamos acima, hoje ela se insere com o volume de produção interna que estamos tendo e com a projecção que os filmes estão tendo no mercado. Actualmente já viramos referência no mercado nacional, nos aproximando ou até ultrapassando estados historicamente importantes na produção, como a Bahia, Pernambuco, Distrito Federal e Rio Grande do Sul.
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