Como mudou a vida da Angola e dos angolanos desde 2017?
Desde a saída de José Eduardo dos Santos da presidência, a vida em Angola mudou de diversas maneiras, nem tudo para melhor, nem tudo para pior, nomeadamente:
O novo presidente, chegou com uma promessa forte de moralizar o Estado. No princípio houve afastamento de figuras ligadas ao antigo regime, incluindo familiares poderosos do ex-presidente, mas na verdade a luta contra a corrupção tem sido seletiva. Há casos de aliados menos visados e um sistema político que ainda favorece elites.
Institucionalmente, algumas mudanças ocorreram: por exemplo, a criação de uma agência reguladora para o setor petrolífero (ANPG), que reduz o poder quase absoluto da Sonangol, que antes acumulava funções de empresa estatal e regulador.
Há progresso visível em infraestrutura: estradas, aeroportos, e alguns projetos de grande escala têm avançado mas na sua maioria obras mal terminadas por conta dos constantes desvios de fundos públicos.
No entanto, a diversificação da economia tão anunciada penas midias nacionais e algumas internacionais andam lentamente. Ainda há uma dependência enorme do petróleo, e a transição para fontes de receita mais sustentáveis é lenta.
A queda das receitas do petróleo é um problema real: com menos dinheiro vindo do petróleo, o governo teve que aumentar a tributação sobre a população e como consequência a subida do custo de vida, o que levou muitos angolanos passam por situações de fome e pobreza extrema. Em alguns setores, o governo cortou subsídios ou reformou políticas que afetam o dia a dia da população, o que provocou protestos recentes (por exemplo, no aumento dos preços de combustíveis) e causou uma das maiores revoluções internas de Angola.
Esse descontentamento é especialmente forte entre os jovens, onde a maior parte enfrentam o desemprego elevado e poucas oportunidades, na verdade essas reformas não são traduzidas em melhoria real para a maioria do angolanos, apenas uma pequena minoria que constitui a elite partidária do MPLA.
Como ficou a vida de Angola no plano interno? Como avalias o estado da liberdade de imprensa e dos direitos humanos?
No plano interno, Angola vive um momento delicado: as instituições estão sob pressão para responder às aspirações democráticas e sociais de uma população cada vez mais consciente. Persistem tensões políticas e desafios em torno da liberdade de expressão e da participação cívica, o que torna o debate sobre os direitos humanos e o Estado de Direito ainda mais urgente.
A oposição e diversos sectores da sociedade civil enfrentam dificuldades no exercício pleno das suas liberdades, mas continuam a desempenhar um papel essencial na preservação do pluralismo político.
A imprensa, em muitos casos, opera em condições limitadas, o que fragiliza o acesso da população a informação imparcial — um pilar fundamental da democracia.
Diáspora angolana parece estar um bocado «adormecida», não achas»?
A Diáspora angolana, por sua vez, permanece quase ausente das políticas públicas nacionais, apesar de representar uma das forças mais valiosas para o desenvolvimento e a projeção de Angola no mundo. Essa ausência de proteção e de diálogo estruturado é um dos grandes desafios que o Congresso Mundial dos Angolanos busca enfrentar.
Em síntese, o nosso país encontra-se num cruzamento entre o medo e a esperança — e é precisamente por isso que precisamos de mais pontes diplomáticas, mais diálogo e mais humanidade.
Como dizia Agostinho Neto: «A luta continua” — mas que seja, hoje, uma luta pela verdade, pela justiça e pela dignidade de todos».
Como avalias as relações entre Angola e Ucrânia?
Angola e Ucrânia estabelecem relações diplomáticas desde meados dos anos 1990. Ucrânia já participou em missões de paz na Angola, por exemplo no contexto das Nações Unidas.
O governo de Angola nunca condenou publicamente a invasão russa à Ucrânia, uma posição que vai contra os princípios da Constituição nacional de Angola, e de vários instrumentos ligados ao direito internacional na qual Angola ratificou. Tem apresentado uma postura na arena internacional que demonstra a vontade (sem iniciativa) de uma solução pacífica para a invasão da rússia na Ucrânia.
O governo angolano nunca enviou nenhum representante oficial, para estar presente em qualquer actividade da Embaixada da Ucrânia em Angola, mostrando, por sua vez, o favoritismo e a grande influência russa, ainda sentida nas elites governantes angolanas.
Ficha técnica:
António Ambrósio é Presidente do Comité Executivo Internacional do Congresso Mundial dos Angolanos. É co-fundador e primeiro presidente da Associação Africana para os Estudantes de Ciências Sociais (AAECS), uma das maiores e mais promissoras organizações estudantis a nível de África. Também é um monitor comunitário da COPAC-ANGOLA, um dos instrumentos regionais da Rede de Alerta e Resposta da Coligação de Organizações da Sociedade Civil para a Paz e a Prevenção de Conflitos na África Central (COPAC).

Sem comentários:
Enviar um comentário