segunda-feira, outubro 21, 2019

As estratégias e segredos da presença russa em África

Em setembro de 2019, o Departamento das Finanças dos EUA estendeu a sua lista de sanções contra os cidadãos e empresas que interferiram nas eleições americanas de 2016. Eram dois cidadãos russos, três empresas registadas nas Ilhas Seicheles e na República Checa e até um iate.

Os cidadãos, Denis Kuzmin e Igor Nesterov, as três empresas: AutolexTransport, BeratexGroup e LinburgIndustries (com os respetivos aviões) e o iate St. VitaminPleasureCraft são, de alguma forma, afiliados ao empresário russo Yevgeny Prigozhin, conhecido como «cozinheiro do Putin». De momento, Kremlin confia ao Prigozhin as missões delicadas da política externa russa, executadas em segredo e que usam elementos económicos, políticos e militares, para influenciar as lideranças e elites dos países terceiros.

Prigozhin é considerado como o dono da «fábrica dos trolls» em São Petersburgo, entidade que usa as redes sociais e outros meios modernos de comunicação para influenciar a opinião pública estrangeira em diversos pontos do globo.

A parte paramilitar da operações russas coordenadas pelo Prigozhin é efetuada pelas EMP russas, a mais conhecida das quais é o «Grupo Vagner», avistada no Leste da Ucrânia, na Síria, na República Centro-Africana e alguns outros países africanos.

Em agosto de 2019, o canal russo «Currenttime.tv» divulgou a sua investigação, em que apurou que os aviões Hawker 125-800B e Hawker 800XP (último com número M-VITO), que foram abrangidos pelas recentes sanções americanas são usados pelo Priogozhin e pertencem à empresa LinburgIndustries.

Pelos dados do centro russo de investigação Dossier Center, as estruturas próximas do Prigozhin funcionam atualmente em cerca de 13 países africanos. Essas estuturas empregam os consultores, analistas, especialista políticos e das operações secretas com intuito de expandir a influência política e económica russa em África.

Os seus maiores éxitos foram registados na RCA, Sudão e Madagáscar. A liderança desses países demonstra lealdade à Rússia, permitindo que lobistas de empresas públicas e privadas russas tenham acesso aos seus recursos naturais e aos mercados internos. Potencialmente, a Rússia também pode estar interessada nos mercados de armas. Afinal, o continente africano é abundante em conflitos e violência.

Na África, os russos precisam, em primeiro lugar, o acesso aos centros de poder. Na maioria das vezes a liderança política concentra em suas mãos os principais recursos do país, facilitando a questão da obtenção de licenças de mineração, compra de armamento e outras despesas significativas, provenientes do orçamento do estado. Portanto, os esforços de consultores e tecnólogos russos se concentram, principalmente, em campanhas eleitorais e outras formas de luta pelo poder.

Na RCA, o pessoal do Prigozhin foi se engajando no apetrechamento das forças armadas e da burocracia estatal, na luta contra os oponentes das autoridades, conseguindo o afastamento do ministro dos Negócios Estrangeiros / das Relações Exteriores (visto por eles como pró-França), estando na origem do lançamento de uma estação de rádio e de dois jornais.

As ações semelhantes foram desenvolvidos no Madagáscar, onde pessoal russo chegando à oferecer os seus serviços aos futuro presidente Andry Rajoelina, embora este já era apoiado pelos EUA e pela China.

No Sudão, eles ajudavam na criação e disseminação dos fake news: os opositores do regime eram chamados de «anti-islámicos», «pró-Israel» e até mesmo «pró-LGBT».

Em fevereiro de 2019, em Senegal, o presidente Macky Sall acusou a embaixada russa no país em financiamento do líder de oposição, Ousmane Sonko. Sall ganhou as eleições e Sonko ficou em 3º lugar.

Em cada caso concreto, a maneira de obtenção do controlo sobre a liderança política de um país africano é diferente. Mas o objetivo é sempre o mesmo, beneficiar a Rússia. Esse benefício pode ser político (por exemplo, voto útil nas sessões da Assembleia Geral da ONU), geopolítico (rivalidade com os EUA e com a China), mas na maioria das vezes é um ganho puramente materialista a extração de ouro, minerais, compra de matérias-primas aos preços baixos, venda de armamento obsoleto, participação em projetos financiados pelos governos nos campos da energia, transportes, comunicações, etc.

Para a Rússia, é mais fácil conseguir os seus interesses políticos e económicos nos países africanos governados pelos regimes autoritários corruptos, onde existem conflitos armados reais ou potenciais, onde o acesso dos investidores estrangeiros é limitado e os preços de energia, matérias-primas e mão-de-obra local são baixos. Para esse fim trabalham os consultores políticos e/ou instrutores policiais e militares, que chegam às capitais africanas como parte da expansão da cooperação russo-africana.

Centenas de lobistas de interesses do Kremlin trabalham em vários países africanos, e as estruturas de Prigozhin são apenas uma parte dos recursos russos dirigidos ao fortalecimento de sua presença em África.

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