segunda-feira, janeiro 06, 2020

A ninfeta do Polanski partiu

A historiadora Oksana Boruszenko faleceu. Professora reformada/aposentada da Universidade Federal do Paraná, doutora nota 10 em Munique, cidadã honorária do Canadá e, naturalmente, de Curitiba, ucraniana de berço e brasileira de espírito.


Dois folclores cercam esta mulher que é uma remanescente da Torre de Babel. O primeiro registra que ela falava as línguas mortas, as moribundas e as exóticas de quebra. O segundo folclore que acompanhava Oksana Boruszenko vem de suas origens. Com os pais ucranianos e nascida em Varsóvia (Polónia/Polônia) por mero acidente geográfico (ali estava o hospital mais próximo), diz a lenda que Oksana foi a primeira ninfeta do cineasta Roman Polanski, porque dormiram no mesmo quarto. “É daí que vem o folclore”, explicou essa cidadã do mundo, curitibana de raro bom-humor: “Moramos durante 5 meses com a família Polanski, dividimos apartamento, com fraldas e tudo o mais, minha irmã era recém-nascida. Essa história de dizer que sou a primeira ninfeta do Polanski foi criada pelo jornalista Aramis Millarch. Encontrei Polanski anos mais tarde (1975), em Nova York, numa manifestação de artistas ucranianos. Foi ele, pelo sobrenome, que me reconheceu. Nessa manifestação estavam John Derek, Debbie Reynolds, Kim Novak, todos ucranianos”.

“La Boruszenko” só foi reencontrar Polanski três anos depois, em Paris. Ele esteve no Brasil, num Carnaval, mas eles dessa vez não se encontraram, só falaram por telefone.

A “primeira ninfeta de Polanski” já não lembrava mais quantas vezes atravessou o Atlântico. Mas da primeira vez não tinha como esquecer: “A guerra nos pegou na fronteira com a Checoslováquia, onde meu pai trabalhava na fábrica de porcelanas Rosenthal. Com o fim da guerra, passamos para a zona de ocupação americana para podermos emigrar. Primeiro pensamos na Tunísia. Depois tentamos o Canadá, mas não fomos aceites no exame médico pelas manchas no pulmão de minha irmã Larissa (pianista [ucraniano-brasileira]). Eram restos de pneumonia, não tuberculose. Como o Brasil aceitava toda e qualquer manchinha, cá estamos. Viemos num porão de navio (de nome Campana) depois fomos despejados na Ilha das Flores (Rio de Janeiro), tomamos um trem e desabamos em Marechal Mallet (PR)”.

Conhecer o apartamento de Oksana em Curitiba foi conhecer o mundo de uma mulher confortável e feliz. É uma casa de bonecas (sem qualquer alusão a Ibsen), onde recebia os amigos para o “borscht” (sopa de beterrabas), quando mostrava os objetos, tapetes e quadros ucranianos da decoração, quando desfilava sua coleção de sombrinhas: Oksana as odeia, mas carrega pelo menos meia dúzia a cada viagem, para dar de presente às amigas de Curitiba, esta cidade sua maior paixão.
Oksana Boruszenko com a camisa bordada e condecoração ucraniana Condessa Olga
@Facebook da Oksana Boruszenko
Doutora Oksana Boruszenko já foi menina entre dois mundos, pouco à vontade em qualquer deles. Deixou nosso convívio como cidadã de dois mundos e do universo, com a universalidade que lhe conferiram a rara cultura e um grande coração. Onde cabiam muito mais amigos, pra cá e pra lá do oceano, que os 50 pares de sapatos que gostaria de usar ao mesmo tempo, se possível fosse ser a centopeia da sua fantasia”.

Blogueiro: doi muito, ver partir a gente do calibre da Dra. Oksana Boruszenko, gente que já “não se fabrica”, gente, que se vingou, contra tudo e contra todos, neste novo e maravilhoso mundo novo, que para ela e sua família se tornou o Brasil...

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