Aproxima-se mais um
aniversário do desaparecimento da União Soviética. Neste dia memorável é sempre
instrutivo recordar as coisas e os processos que morreram juntamente com o
“país de operários e camponeses”.
A União Soviética foi
um dos líderes mundiais em destruição da culinária como uma arte. O défice
permanente de produtos mais elementares, os roubos cósmicos nos locais de
“alimentação comum” (eufemismo soviético para as locais de venda de alimentos
confecionados, situados nas empresas, nos estabelecimentos de ensino, diversas cantinas
e afins), ajudaram a cimentar essa posição pouco honrosa. A falta da ordem,
consequência da ausência do proprietário, arrumou o assunto.
Frutas e legumes
frescos praticamente não se vendiam nas lojas fora da sua época. No outono,
inverno e primavera, nas lojas especializadas em venda de legumes era possível
comprar a batata, cenoura, beterraba, repolho, na sua maioria sujos, cheios da
terra, no parcial estado ligeiro de decomposição. Por vezes as mesmas lojas
vendiam o repolho picado, melões inteiros conservados em tambores de madeira e
maças, frescas ou também conservadas. Nas capitais das repúblicas soviéticas,
de vez em quando, se vendiam as laranjas gregas ou marroquinas. As bananas
apareceram em venda livre só na década de 1990.
Esparguete e macarrão muitas
vezes tinham a cor cinzenta, situando-se à anos-luz da original pasta italiana.
“Pelmeni” (ravioli) eram vendidos em caixas de cartolina, as peças facilmente se
“colavam”, transformando-se em massa única e pegajosa, para as separar era
preciso usar uma faca. Chamavam-se “Russos” e eram produzidos com um único
sabor em toda a URSS.
Leite e nata eram
vendidos em garrafas ou em pacotes triangulares que costumavam rebentar pelas
costuras ou pelo menos pingar, sujando a roupa ou outros produtos que a dona de
casa soviética teve a sorte de “apanhar” (eufemismo que significava comprar).
Peixe podia ser congelado,
era a carpa viva ou em conserva. O conceito de peixe fresco era totalmente
desconhecido, assim como as ostras, búzios, caranguejos, camarões ou polvo. A
lula era vendida de vez em quando.
Especiarias e temperos:
pimenta preta e malagueta, cravinho. Mais nada.
Chá e café: quase lixo,
os restos que sobravam após o melhor chá georgiano era exportado ao Ocidente,
pois o país precisava das divisas (que depois eram usadas para financiar os partidos
e organizações comunistas ou pelo menos anti – Ocidentais). Café instantâneo
soviético era simplesmente mau…
Almôndegas nas cantinas
eram feitas de pão, alho e mais pão. As nojentas sopas de
leite com aletria. Fígado que os cozinheiros sabiam transformar em pedra.
Cerveja aguada.
Carne nas lojas tinha
mais ossos do que a própria carne. Numa grande parte do território da Rússia
Soviética (região de Volga, Rússia Central), a carne não aparecia no comércio
estatal, as pessoas viajavam até Moscovo para comprar a mortadela. O único tipo
de mortadela vendido naquelas regiões e mesmo assim, muitíssimo raramente, custava
1,60 copeque por quilo e era conhecida na Ucrânia como “felicidade de cão” (ucranianos
a usavam para alimentar os seus cães e gatos).
Frangos: as pessoas
contavam as anedotas sobre os frangos azuis. Uma anedota típica descrevia o
ocidental crédulo que ficava deslumbrado com a suposta superioridade socialista
ao ver uma fila enorme que esperava pelos “frangos deitados fora” (calão
soviético que significava “em venda livre”). Depois de ver os frangos de perto ele
dizia: “No meu país também deitamos fora os frangos desta qualidade”.
Queijo se vendia apenas
dois, no máximo quatro tipos diferentes. A existência de Parmesão só era
conhecida através do cinema e da literatura.
Vinhos: mixórdia de 0,5
que custava 0,92 copeque e se chamava “vinho de frutos e bagos”. Portveine
“777”. Ninguém adivinhava que o verdadeiro Vinho de Porto é um vinho
espirituoso saboroso e nobre.
Pela felicidade dos
cozinheiros e adeptos de alimentos saborosos, este mal nos deixou para sempre!
Bónus
O blogueiro inbelousov,
farmeiro e dono de uma rede de supermercados recorda a sua própria juventude.
Cresci na província de
Kurgan. Pela primeira vez provei o chouriço em 1977 no Palácio dos Desportos na
cidade de Chelyabinsk, quando foi ver o circo de Moscovo. Até agora me lembro
os pedaços finíssimos colocados no pão. Bananas uma vez o pai trouxe de Leninegrado, em 1976. Tangerinas só apareciam nas prendas do Ano
Novo.
Em 1984 após a
graduação na escola militar foi servir no Extremo Oriente russo, na província
de Amur, aldeia Srednebelaya-2. A carne era vendida apenas aos portadores de
talões, cada pessoa tinha direito aos 500 gramas mensais. Eu e a minha esposa
tivemos o direito de 1 kg de carne. Na loja da guarnição se vendia a farinha,
ovos, pasta de tomate e “salada Jager”. Mais nada. Essa era a Rússia onde eu
vivia, este era o poder soviético para mim.
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