sexta-feira, março 19, 2010

Carta Aberta aos Eurodeputados Portugueses do Parlamento Europeu

ASSOCIAÇÃO DOS UCRÂNIANOS EM PORTUGAL
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17/03/2010

Carta Aberta aos Eurodeputados Portugueses do Parlamento Europeu

Exmos. Srs. Eurodeputados,

É hoje em dia consensual que o projecto europeu tem contribuído de forma decisiva para a estabilidade económica e social do Velho Continente e para a promoção da liberdade e igualdade dos cidadãos da Europa. Os seus representantes democraticamente eleitos consideram como principal objectivo da União Europeia garantir o bem-estar e a salvaguarda dos direitos dos cidadãos, sendo por isso, e com base nas lições da História, repudiada qualquer forma de discriminação (racial, étnica, religiosa, etc.). No entanto, isso não significa a negação do património histórico e cultural dos povos da Europa; pelo contrário, a preservação das culturas nacionais e das línguas oficiais e o respeito pelo passado histórico constituem alguns dos pré-requisitos essenciais para a adesão à UE.
A propósito de passado histórico importa lembrar que a Ucrânia nunca teve quaisquer ambições expansionistas, sendo, em contrapartida, o campo de batalha de imperialismos rivais, com a consequente perda da soberania e da identidade nacional. Durante a 2.ª Guerra Mundial, na sequência da agressão nazi e soviética, a Ucrânia perdeu cerca de 7,5 milhões de habitantes e aproximadamente 2 milhões de ucranianos foram deportados como mão-de-obra escrava para a Alemanha.
Por outro lado, foi também palco de tragédias totalitárias, sendo disso exemplo a Grande Fome de 1932-1933 (o Holodomor) – qualificada pelo Parlamento Europeu de “crime horrendo contra o povo ucraniano e contra a humanidade”– na qual morreram cerca de 7 milhões de ucranianos em resultado da fome provocada pela ditadura estalinista. Nessa ocasião, a Organização dos Nacionalistas Ucranianos (OUN), dirigida por Stepan Bandera, foi obrigada a recorrer à única linguagem entendida por um regime totalitário e que poderia despertar a atenção da comunidade internacional: a da força. Em 22 de Outubro de 1933, o cônsul soviético em Lviv foi morto por um militante da OUN como retaliação pelos milhões de ucranianos dizimados no genocídio.
Esse facto ganha maior sentido se recordarmos que noutros momentos dramáticos do século XX, houve a necessidade de cometer actos semelhantes. Por exemplo, entre 1920-1922, militantes da Federação Revolucionária Arménia mataram vários dirigentes turcos, em resposta ao genocídio arménio; em 27 de Maio de 1942, agentes checoslovacos dos serviços secretos britânicos assassinaram o dirigente nazi Reinhard Heydrich, responsável pela política de terror na Boémia – Morávia e um dos principais mentores do genocídio da população judaica.
Ainda relativamente ao passado histórico, o Parlamento Europeu aprovou, em 25 de Fevereiro de 2010, uma resolução sobre a actual situação na Ucrânia, declarando que:

«20. Deplora profundamente a decisão do Presidente ucraniano cessante, Viktor Iouchtchenko, de conceder a título póstumo a Stepan Bandera, dirigente da Organização dos Nacionalista Ucranianos (OUN) que colaborou com a Alemanha nazi, o título de "herói nacional da Ucrânia"; espera que os novos dirigentes ucranianos reconsiderem este tipo de decisão e reafirmem o seu compromisso em favor dos valores europeus.»

Nesta deliberação, o Parlamento Europeu arroga-se do direito de indicar aos Ucranianos como devem interpretar a sua própria História. Além do mais, qual é a base desta decisão? Porventura existe alguma sentença emitida por um tribunal internacional que condene Stepan Bandera e o Exército Insurgente Ucraniano (UPA) por colaboração com a Alemanha nazi? Terá sido efectuada uma minuciosa investigação histórica sobre o movimento independentista ucraniano?
É importante perceber que Stepan Bandera simboliza, de forma indiscutível e trágica, a luta pela independência ucraniana, finalmente alcançada em 1991, sendo a figura inspiradora de sucessivas gerações de combatentes pela liberdade, e, simultaneamente, o alvo do ódio de todos aqueles que têm desígnios imperialistas relativamente à Ucrânia.
A 30 de Junho de 1941, na sequência da invasão alemã da União Soviética, a OUN proclamou a restauração da independência da Ucrânia. Este acto representou um claro desafio aos planos raciais e expansionistas de Hitler, o qual, por sua vez, pretendia converter a Europa de Leste num imenso império germânico. Por isso, as autoridades alemãs exigiram que os líderes da OUN abdicassem do seu objectivo, e perante a recusa, desencadearam uma campanha de violenta repressão, obrigando o movimento independentista a passar à clandestinidade e ao combate contra as duas potências ocupantes da Ucrânia: os soviéticos e os nazis.
Em Julho de 1941, Stepan Bandera foi preso e enviado para o campo de concentração de Sachsenhausen, aí permanecendo até Outubro de 1944. Dois dos seus irmãos foram deportados para o campo de extermínio de Auschwitz, acabando por ser brutalmente assassinados. Na ravina de Babi Yar, além de milhares de judeus, foram também chacinados centenas de militantes da OUN. O próprio Stepan Bandera conheceu um fim igualmente trágico, quando em 1959 faleceu em Munique, vítima de um agente secreto do KGB.
Por ocasião do Julgamento de Nuremberga de 1945 foi revelada um documento secreto do Einsatzkommando C/5, com data de 25 de Novembro de 1941, que invalida qualquer argumento acerca da alegada cumplicidade de Bandera e da OUN com os nazis:
«Está provado que o movimento de Bandera prepara uma revolta no Reichskommissariat, cujo objectivo é criar uma Ucrânia independente. Todos os membros do movimento de Bandera devem ser imediatamente presos e, depois de um interrogatório exaustivo, secretamente aniquilados como bandidos
Na verdade, aquilo que se verificou foi a resistência corajosa e determinada do movimento independentista contra a violência praticada pelas potências totalitárias que pretendiam condenar a nação ucraniana.à escravatura e ao extermínio .
Nós, Ucranianos que viemos para Portugal em busca de trabalho e de uma vida melhor, temo-nos empenhado em contribuir para o progresso e bem-estar do país de acolhimento. Muitos de nós escolheram Portugal como a sua segunda pátria, adquirindo, por isso, cada vez maior visibilidade e relevância a nossa integração cívica.
Assim, na dupla qualidade de Ucranianos e de Concidadãos Portugueses apelamos à revogação do ponto 20 da Resolução do Parlamento Europeu de 25 de Fevereiro de 2010, no qual se acusa infundadamente o Herói Nacional da Ucrânia de colaborar com a tirania nazi. É um imperativo moral reconhecer Stepan Bandera como uma figura cimeira, não só da história da Ucrânia, mas também do combate universal pela liberdade e dignidade humana.

Com os nossos melhores cumprimentos,

Presidente da Associação dos ucranianos em Portugal - Pavlo Sadokha
Presidente da Associação dos ucranianos em Portugal “Sobor” – Oleg Hutsko
Presidente da Associação dos ucranianos Algarve – Natalia Dmytruk

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