“a máquina de fazer espanhóis” é o título do novo romance do nosso grande amigo, valter_hugo_mãe, o quarto, depois de «o apocalipse dos trabalhadores» (2008), «o remorso de baltazar serapião» (2006) e «o nosso reino» (2004).
O protagonista do novo romance chama-se António Silva, um homem de 84 anos derrotado pela morte da mulher e que acredita tanto em Deus como no Peter Pan.
À partida, o leitor incauto poderá pensar que não lhe interessa a história de um velho triste, depositado pelos filhos no «lar da feliz idade» e que quer também ele desistir da vida por achar que ela não existe para além do amor. Mas depressa mudará de ideias: as peripécias do senhor Silva e dos companheiros também de apelido Silva que com ele contracenam ao longo das quase 300 páginas do livro (editado pela Objectiva, com a chancela Alfaguara, ISBN 9789896720162), são tão profundamente trágicas, expondo as suas fragilidades de velhos, como lúcidas e, a espaços, hilariantes mesmo.
valter hugo mãe: «Eu usei a literatura para perceber o que é que faltou ao meu pai, no que respeita aos sentimentos ou à aventura da idade e, ao mesmo tempo, através desse exercício, para efabular acerca de alguma coisa que eu não tenho a garantia de poder vir a experimentar. E por isso, fica experimentada desta forma, não factualmente mas por intensificação dos sentimentos».
Assim foram surgindo, às vezes para surpresa do autor, os companheiros do senhor Silva nesta aventura da última fase da vida, uma data de Silvas, a começar pelo Silva da Europa – o tal que defende, num dos seus discursos incendiários, que Portugal é uma máquina de fazer espanhóis, porque todos os portugueses lamentaram já uma vez ou outra o facto de serem independentes e desejaram que Espanha os reconquistasse «desta vez para sempre e para salários melhores».
Mas temos ainda o senhor Pereira (que tem o Silva lá pelo meio do nome), o Anísio (da Silva) Franco – que é uma pessoa real e que, tal, como no livro, é o curador do Museu Nacional de Arte Antiga, só que «é bastante mais novo, tem quarenta e tal anos», explicou o escritor – e o Esteves que, além de se chamar também Silva, é o Esteves sem metafísica do poema Tabacaria de Fernando Pessoa, que valter hugo mãe achou «irresistível» incluir na história.
«É, são todos Silva. Eu não sou Silva, por acaso, mas somos todos um bocadinho Silva. Isso, depois, já é o delírio da ficção, que permite que generalizemos alguns tiques e que achei interessante. A generalização do nome alude à questão da igualdade e é um bocado uma provocação para que entendamos que, enquanto cidadãos, enquanto portugueses, nos devemos encarar assim, como iguais, e partir desse pressuposto para algo melhor, mas para algo melhor para todos».
Lusa / SOL:
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