sábado, junho 28, 2025

Morreu o poeta e dissidente ucraniano Ihor Kalynets

Foto: Facebook do historiador Volodymyr Vyatrovych

Morreu o poeta e dissidente ucraniano Ihor Kalynets, que pertencia a geração «dos 1960», foi a vítima da onda de repressões comunistas da era Brejnev, que visava a russificação total da sociedade ucraniana à partir de 1972. 

Em maio de 1971, o KGB da Ucrânia soviética envia um enforme, dedicado ao poeta, formalmente endereçado ao CC do PC da Ucrânia, de facto, à atenção do 1º secretário do PC da Ucrânia, Petró Shelest. No documento o líder comunista é informado, que em 1970, em Bruxelas, foi publicada uma colectânea poética do poeta ucraniano, que em 1968 as suas poesias foram publicadas no Ocidente e que o poeta se recusou à «condenar os nacionalistas ucranianos». 

18.05.1971, KGB ao CC do PC(U) / declassificado pelo SBU em 2013


Basicamente, o KGB, acusa Kalynets de escrever a poesia fora dos canones do «realismo socialista» e de ser uma «personalidade nacionalista», que se recusa à exortar a «realidade soviética». 

A coletánea poética do Ihor Kalynets, publicada em Bruxelas, 1970

Petró Shelest (1908 — 1996) foi um político soviético ucraniano, que serviu como 1º secretário do Partido Comunista da Ucrânia de 1965 até a sua remoção em 1972. Ideologicamente, um moderado e socialmente, um comunista nacional, ele supervisionou a liberalização generalizada da sociedade ucraniana como parte do movimento de «degelo» de Khrushchev, que levou ao aumento da visibilidade da língua e da cultura ucranianas na vida pública. 

Ao mesmo tempo, no decorrer do liderança de Shelest, ocorreram na Ucrânia duas grandes ondas de prisões de dissidentes: a primeira ocorreu em agosto-setembro de 1965 (24 pessoas presas), e a segunda em janeiro-abril de 1972 (73 pessoas presas). Mesmo assim, ainda em novembro de 1969, Leonid Brezhnev, ao receber o Shelest no Kremlin, expressou a sua insatisfação com os «fatos existentes do nacionalismo [ucraniano] na república». Em 10 de maio de 1972, Shelest foi demitido do cargo de Primeiro Secretário do CC do PC(U) «em conexão com sua transferência para outro cargo» — foi nomeado como Vice-Presidente do Conselho de Ministros da URSS (posiação na qual trabalhou menos de um ano). O lugar do 1º secretário do PC da Ucrânia foi ocupado por um comunista pró-Moscovo da linha dura, Volodymyr Shcherbytsky, que desfez muitas das reformas de Shelest e supervisionou a russificação massiva da sociedade ucraniana.

A imagem mostra um dos episódios do famoso Presépio de Natal de 1972, preparado por iniciativa de artista plástica e dissidente Olena Antoniv para arrecadar fundos para apoiar os dissidentes ucranianos presos entre 1965 e 1967. 45 pessoas participaram no Presépio tradicional, e 250 rublos (cerca de 424 dólares, ao câmbio oficial soviético) foram arrecadados; alguns dias depois, 19 pessoas (11 em Kyiv e 8 em Lviv) — participantes do Presépio — foram presas por desafio e desobediência às autoridades, iniciando assim a segunda onda de prisões de dissidentes ucranianos. Em primeiro plano: à esquerda, a ceramista Maria Savka; ao centro, o poeta Ihor Kalynets. 

Ihor Kalynets e jornalista e dissidente Yaroslav Kendzior (com a estrela Natalina)

Durante as buscas o KGB apreendia os livros, materiais dactilografados, samvydav ucraniano e samizdat russo, apontamentos, máquinas de escrever, rádios, bobinas com as gravações, etc. Os detidos eram ameaçados com o fuzilamento, torturas físicas, repressões contra os amigos e familiares. Largamente foi usado o sistema soviético de psiquiatria punitiva, as pessoas que dificilmente poderiam ser acusados judicialmente, eram compulsivamente internadas em hospitais psiquiátricos especiais. Também se praticavam os despedimentos laborais e expulsões dos estabelecimentos de ensino. 

Ler mais: O perigo de celebrar o Natal 

A maioria dos detidos e presos foi condenada às penas entre 5 à 7 anos dos campos de concentração em regime fechado, mais três anos de exílio. No total, em 1972 na Ucrânia foram presos 89 dissidentes (55 deles naturais da Ucrânia Ocidental). Como escreveu a estudiosa do movimento dissidente da URSS, Lyudmila Alexeyeva: “As prisões pareciam como a parte de um plano mais largo de eliminação de identidade nacional dos ucranianos”. 

Agradecimentos:

  • Arquivo Estatal Setorial do SBU
  • Centro de História Urbana de Lviv
  • Historiador ucraniano Eduard Andrusenko
  • Maria Hryciv, a investigadora do Museu Nacional das Vítimas dos Regimes de Ocupação Cadeia na Lonckoho.

Sem comentários: