domingo, outubro 12, 2025

«O último judeu em Vinnytsya»: os alemães e o Holocausto

Foto: Metropol

A famosa foto histórica «O último judeu de Vinnytsya» na realidade foi tirada na cidade ucraniana de Berdychiv. O executado continua anónimo, o executor é alemão, professor de línguas estrangeiras e de educação física, nascido na fronteira da Alemanha com a Holanda. 

Segundo o The Guardian, o estudo foi publicado na prestigiada revista científica Zeitschrift für Geschichtswissenschaft (Revista de Estudos Históricos). Observa-se que a foto, tirada na Ucrânia, foi conhecida — erradamente — como «O Último Judeu em Vinnytsya» e permaneceu envolta em mistério durante décadas. 

A foto original

O historiador alemão Jürgen Matthäus descobriu que a execução foi levada a cabo pelas unidade de SS a 28 de julho de 1941 na cidadela da cidade ucraniana de Berdychiv e que o homem que apontava a pistola à um judeu congelado à beira de um poço era Jakobus Onnen, um professor de francês, inglês e educação física, nascido em 1906 na aldeia alemã de Tichelwarf, perto da fronteira com a Holanda. Aderiu às unidades SA em 1931, entrou nas fileiras das SS um ano depois, ao partido nazi antes de Hitler chegar ao poder em 1933 e serviu na Frente Oriental durante a guerra. 

Onnen, vinha de uma família instruída e, na juventude, gostava de «viajar e aprender línguas», disse Matthäus. «Depois foi enviado para o Leste, e obviamente está aqui», disse. «A motivação é uma das questões mais difíceis. A razão pela qual se apresenta desta forma, penso eu, é para causar uma boa impressão». 

Soldado Onnen nunca passou de uma patente relativamente baixa e foi morto em combate em agosto de 1943. 

«A participação em tais assassinatos era tida como uma coisa certa à fazer e não lhe dava nenhum 'ponto' extra por participar nestas unidades assassinas», disse Matthäus. 

Foto: Metropol

Disse ser «bastante provável» que a foto da execução de Berdychiv, da qual sobreviveram várias impressões, tenha sido tirada por um outro soldado, e observou que tais imagens eram consideradas uma espécie de «troféus» de assassinatos de civis em massa. 

Os membros do «Einsatzgruppe C», uma das várias unidades móveis destacadas nos territórios recém-ocupados da URSS, estavam a limpar a região de «judeus e guerrilheiros» alguns dias antes da visita de Adolf Hitler. 

Os voluntários do Bellingcat, o uso da inteligência artificial e os dados históricos da época, incluindo a correspondência, ajudaram a estabelecer o local dos eventos. Jürgen Matthäus foi também contactado por um leitor que afirmou que o atirador poderia ter sido o tio da sua mulher. Os seus familiares destruíram as cartas de Onnen da Frente Leste na década de 1990. Mas continham fotografias dele, que os voluntários do Bellingcat puderam utilizar na análise de inteligência artificial. 

Foto: Metropol

Matthäus descreve um «processo gradual» — uma combinação de trabalho tradicional de arquivo, descobertas fortuitas, contribuições de colegas e envolvimento inovador de voluntários do grupo de jornalismo de investigação Bellingcat. «Pelo que ouvi de especialistas técnicos, a correspondência que o algoritmo produz é extremamente elevada», diz Matthäus. 

Resultados preliminares, divulgados no ano passado, permitiram-lhe identificar a data, o local e a unidade envolvida na execução em massa que chamou a atenção dos meios de comunicação alemães. 

O projeto de Matthäus também envolve a procura da identidade da vítima numa fotografia de Berdychiv. Para isso, o historiador está a colaborar com o seu colega ucraniano Andriy Magaletsky, utilizando registos de arquivos soviéticos de comunidades locais. 

Esta investigação também esclarece uma série de outras questões: por exemplo, porque é que um dos nazis estava tão ansioso por registar este crime em foto e porque é que o atirador posa de forma tão pomposa. O historiador observou que os numerosos testemunhos visuais e escritos enviados para casa pelos soldados alemães refutam o mito de que a população da Alemanha não tinha conhecimento do Holocausto, o genocídio judaico perpetrado em seu nome. 

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Bónus. Um ponto importante foi apontado pelo internauta ucraniano Viacheslav Pikhur, que comentou a foto de seguinte maneira:

De facto, para as pessoas normais, esta foto antiga é muito cínica e, ao mesmo tempo, instrutiva. [...] Preste atenção não apenas à vítima e ao carrasco repugnante. Um bando de alemães elegantes, com uniformes diferentes, com as mãos nos bolsos, observam curiosamente o assassinato de um civil e posam. O comentário diz que o carrasco alemão é um antigo professor. Sim. Na foto, todos aqueles soldados alemães já foram pessoas comuns, tiveram famílias, trabalharam, criaram filhos. Mas... Muito rapidamente, Hitler, Goebbels, Himmler... e o sistema que criaram transformaram-nos em assassinos a sangue frio e criminosos de guerra, que mais tarde se tornaram vítimas. O mesmo está a acontecer agora com os russos.

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