Um homem
robusto, na casa dos cinquenta, com a face absolutamente pálida e olhos
vermelhos, fixadas num único ponto, estava sentado de joelhos, junto ao corpo
coberto com o lençol ensanguentado, incapaz de levantá-lo.
por:
Sergei Loiko,
fotógrafo e jornalista
Ele
vestia a jaqueta de inverno da polícia, de cor azul-escura, sem as insígnias,
com uma gola de pele. O seu cabelo, cortado muito rente, ainda não tinha fios grisalhos.
Finalmente,
ele levantou a ponta do lençol, imediatamente reconheceu o seu filho, e,
novamente, cobriu o seu rosto. Depois virou o seu olhar ao lado, onde estavam estendidos
mais onze corpos, também cobertos com os lençóis manchados de sangue. Em alguns
lençóis, ao nível das faces, estavam colocados uns papelinhos, nos quais algo era
escrito com um marcador vermelho.
No
meio deste vermelho todo havia uma grande mancha azul – o capacete militar,
pintado de azul. Por dentro e por fora o capacete fora manchado de sangue, e do
lado esquerdo, ao nível do templo, era visível marcadamente um buraco, resultante
da perfuração de bala.
Ustym
Holodnyuk, de 19 anos, estudante da cidade de Zbarazh da região de Ternopil no
oeste da Ucrânia, deveria se encontrar com o seu pai, às 11h00 de manha na rua
Zhovtneva. Eles combinaram isso às 9h00.
Ustym
foi um dos defensores da Maydan, desde o novembro [de 2014]. Eles combinaram com
o pai, que este o levará à casa para descansar. As próximas duas horas, até o
encontro com o pai, Ustyn não sobreviveu.
“Eu
lhe disse: “Fique lá com cuidado, não arriscas, temos que ir para casa”, conta
o pai. “Ele se riu e respondeu: “Pai, não se preocupe! Eu tenho um capacete
mágico da ONU, e nada me vai acontecer”. – Estas eram as últimas palavras que
ouvi dele”.
Volodymyr,
o pai do Ustym levanta o seu capacete no chão e olha longamente para o sangue ainda
fresco de seu filho, dentro e fora do capacete, o leva até ao rosto, como se
estivesse tentando ouvir o cheiro e o calor de seu filho, tentando dizer algo,
mas as suas palavras se cortam nas palavras “o capacete azul”, ele cai sobre uma
cadeira, abaixa a cabeça e os enormes ombros estremecem.
Ex-policia,
que toda a sua vida serviu fielmente ao seu país, ele está tentando abafar o
ataque súbito, que desconhecia até agora. Ele quase consegue...
Ustym,
tal como outros onze, deitados agora ao seu lado na recepção do hotel “Ucrânia”,
[em Kyiv], transformado em um necrotério temporário, não tinham as chances de sobreviver,
diz a médica-chefe da clínica móvel da autodefesa da Maydan, Olha Bogomolets.
“O
franco-atirador ou franco-atiradores trabalharam profissionalmente”, diz ela. –“Todos
os ferimentos foram no coração ou na cabeça. Todos morreram atingidos por balas
de calibre 7,62 mm [a carabina de precisão Dragunov – SVD]. Atiraram para matar”.
Como
cidadão, o pai apoiava Ustym no seu desejo de estar na Maydan, conta Volodymyr.
Como o pai, estava se opondo.
“Eu
não sei se Yanukovych deveria ficar na minha frente de joelhos, mas eu sei certamente
que ele tem que se sentar na frente de um tribunal internacional por aquilo que
ele fez com o meu país e com o meu filho”, diz o pai.
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