quarta-feira, julho 18, 2018

Porque as mulheres soviéticas envelheciam tão precocemente?

Nas fotos e nos filmes soviéticos é notável que as mulheres naqueles anos pareciam 10-15 ou mesmo 20 anos mais velhas do que a sua idade biológica e do que as suas pares hoje. A aparência da mulher soviética mostrava imediatamente e de forma inequívoca as verdadeiras prioridades da URSS, muito distantes do bem-estar dos seus próprios cidadãos.

Como os fãs da URSS imaginam as mulheres soviéticas

Os fãs e amantes da URSS imaginam as mulheres soviéticos parecidas com os desenhos do artista Valeriy Barykin – de corpos bonitos, com tudo no lugar, vestidas de forma elegante e sensual, com boa pele e dentes, sempre à sorrir e prontas para tudo. Muitos fãs da URSS partilham estes desenhos na rede social russa OK com legendas: “curte, se você se lembra como era bom viver na URSS!”
Na realidade o artista criou uma série de desenhos que de forma irónica copiavam o estilo americano “moças pin-up”, colocando as situações frívolas imaginárias nas decorações da era soviética. As mulheres soviéticas reais nunca se vestiam, nem se pareciam assim (nem União Soviética produzia este tipo de vestidos ou roupa interior), e toda a sua aparência e poses são copiadas de cartazes americanos desenhados para animar os soldados nos quartéis (daí o nome – “pin up”, coloque na parede), por isso todas as mulheres adotam as poses sexy e frívolas.

Como as mulheres soviéticas eram na realidade
Nina Khrusheva e Jackelin Kennedy
A foto em baixo mostra as duas personagens do drama romântico soviético “Maratona de Outono” (1979), atrizes soviéticas Marina Neelova e Natalia Gundareva – as mulheres soviéticos com aparência “acima da média soviética”, porque cuidavam da sua imagem e porque as suas actividades profissionais não eram demasiadamente pesadas (não trabalhavam na construção de estradas, na construção civil ou nas fábricas, não derrubavam as árvores na floresta, etc.).
Quantos anos você dá às atrizes na foto? Por uma questão de interesse, mostre a foto aos amigos e conhecidos e faça essa mesma pergunta. Na nossa experiência recebemos as seguintes respostas: “à de esquerda (Neelova) tem 52-54 anos, e à da direita (Gundareva) – 60 anos”. Realmente, o oval da cara, o contorno das pálpebras, rugas e cabelos dão a impressão dessa mesma idade das atrizes.

Na realidade das filmagens Neelyova tinha 32 anos e Gundareva – cerca de 30 anos. Hoje em dia no espaço pós-soviético as mulheres aos 30 anos parecem com jovens adolescentes – na URSS já eram “tias/titias encalhadas”, com os rostos caídos e olhares extintos.
É possível dizer que a culpa é das personagens e da maquilhagem, mas na realidade, quer Neelova e Gundareva, quer o resto das atrizes soviéticas, na sua maioria, não irradiavam a juventude. Basta se lembrar, por exemplo, da atriz Svetlana Nemoliaeva (na foto em cima) no filme Sluzhebnyy roman (1977), no momento das filmagens ela tinha 39 anos, mas parece ter cerca de 60, senão mais.

Porque as mulheres soviéticas envelheciam tão precocemente?
Nisso residia um complexo de razões, consistindo no próprio modo de vida e no modo de pensar de uma mulher soviética. Primeiro, ter uma boa aparência e cuidar de si na URSS era considerado como mau tone – uma mulher que tinha boa aparência era vista como a “mulher de vida fácil” ou como um “elemento não produtivo”. A mulher na União Soviética – tinha que trabalhar com os dormentes, recuperar as terras virgens, ou na pior das hipóteses – ser a mãe do soldado, o seu propósito é se matar para servir o Estado. Nos filmes soviéticos e em outros tipos de propaganda de todas as formas e maneiras possíveis eram ridicularizadas as mulheres de boa aparência, eram habituais anti-heróis, às contrapondo à uma simples e heróica Maria, que num casaco acolchoado, à noite, no frio de -30ºC vai trepando o poste de eletricidade de alta tensão para concertar o fio elétrico rompindo.
Como consequência dessa doutrina – na União Soviética não havia bons meios de cuidar dos cabelos, dentes e pele – as trabalhadoras da construção civil, recuperadores das terras virgens e maquinistas de gruas não deviam cuidar de si mesmas, precisavam é de trabalhar diariamente e sonhar com o comunismo. O país, que lançou o homem ao espaço, era incapaz de produzir os pensos higiénicos / absorventes femininos e creme para o rosto, e para os cuidados dentários vendia o pó abrasivo (Sic!) que desgastava totalmente os dentes até 35 anos, se não for antes.
As senhoras que escaparam do trabalho duro e mais ou menos se estabeleceram na vida (como as atrizes já citadas), mesmo assim não estavam protegidas da escravidão soviética diária – na União Soviética, acreditava-se que a mulher deve “puxar a família”, lavar e cozer para todos, preparar o pequeno-almoço, o almoço de três entradas e o jantar, seguir os assuntos escolares das crianças, levar as crianças para os clubes e secções desportivas, motivar e agradar, de todas as maneiras o seu marido (e muitas vezes aturar o seu alcoolismo) – exatamente assim viviam na União Soviética 85% (se não mais) mulheres.
Ainda é preciso acrescentar o peso diário de passar horas nas filas para fazer compras, escândalos e tensões, os maus alimentos – e você verá todas as razões pelas quais as mulheres soviéticas na faixa dos 30 anos pareciam com às de 50 ou mais velhas.

E situação agora?

Os fãs da URSS não se cansam de dizer que na União Soviética a taxa de natalidade era bem alta! Mas a taxa alta de natalidade é uma caraterística especial dos países menos desenvolvidos, onde não há meios de contracepção, e onde a maioria das crianças, nascidas desta forma, não são bem-vindas (o que coloca uma marca em toda a sua vida).

As mulheres modernas do espaço pós-soviético parecem 20 anos mais jovens do que as suas pares na URSS. A moça atual de trinta anos é uma menina, a atual dama de cinquenta, muitas vezes é tratada como “moça”. As suas pares na URSS já tinham costas curvadas, dentes de ouro, usavam os lenços de babushka e andavam em todo o lado com os cestos sobre rodas (no caso de acharem algum alimento à venda livre).

É um forte indicador de progresso – para saber a verdade sobre a vida em um determinado país se deve olhar para as suas mulheres e não ouvir as histórias sobre armas no espaço ou bombas nucleares – coisas que nada têm à ver com a vida de 99,99% da sua população.

Fotos: Internet | GettyImages | Texto: Maxim Mirovich

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