terça-feira, maio 01, 2018

A vida horrível de crianças crescendo presas na linha de frente da brutal guerra esquecida de Putin na Ucrânia

Anna era uma das alunas de escola №2, alvejada pelas forças russas | foto @Roland Leon/Sunday Mirror
As crianças ucranianas da região de Donbas “não conseguem imaginar a vida sem tanques e armas”, reportagem sobre como o conflito promovido pela Rússia enfurece, ao deixar as pessoas da área sem aquecimento, eletricidade ou água.

por: Alan Selby, Sunday Mirror (Grã-Bretanha)

De pé nos escombros de sua escola, Anna, de 13 anos, lembra o dia em que as bombas caíram: “Nós estávamos brincando fora quando o bombardeio começou. Nós tivemos que correr para se [salvar]”.

Enquanto ela fala, os amigos arriscam suas vidas por perto jogando futebol em alguns dos campos mais minados do planeta.

Esta não é a Síria, nem a Palestina. Esta é a guerra esquecida às portas da Europa [Ocidental], que até agora custou a vida de 3.000 civis.

É Krasnohorivka, a um quilómetro da linha de frente, onde a Rússia de Vladimir Putin travou uma batalha de quatro anos ao longo da fronteira leste da Ucrânia.
Crianças desenham a guerra. O helicóptero nem sequer é militar, mas é fonte do medo.
Foto @ Roland Leon/Sunday Mirror
A região de Donbas tornou-se famosa [na Grã-Bretanha] em 2012, quando sua capital, Donetsk, recebeu a equipa / o time de futebol da Inglaterra para [aqui fazer] dois jogos do Campeonato Europeu de futebol / da Eurocopa 2012.

No final deste ano [2018], companhias aéreas de baixo custo começarão com voos de 19,99 libras para levar turistas do Reino Unido à Ucrânia em voos de três horas.

No entanto, centenas de crianças já morreram ao longo desta linha de frente – e para muitos dos 220 mil jovens que ainda estão apanhados no conflito de Putin, há apenas um eco de uma infância normal.

“Antes do conflito, este era um lugar feliz”, diz a diretora de Anna, Olena Mikhatska. “A cidade era tão bonita. Você ouviria crianças rindo – a escola estava viva. Agora o único som é o silêncio.

Silêncio, isto é, mas para o constante cenário de combates entre tropas ucranianas e rebeldes apoiados por russos.

Quando os combates estavam mais fortes por aqui, mais da metade da população fugiu – cerca de 13.500 pessoas. Vários milhares ainda estão para retornar. Por quatro anos Krasnohorivka não teve gás ou eletricidade. No inverno, as temperaturas podem cair para menos de 20ºC.

Na semana passada [28/04/2018], a água potável para 600 mil pessoas na região foi cortada após um ataque à estação de filtragem da cidade.

Morteiros e mísseis Grad, como aqueles que destruíram a escola e o hospital, podem ser ouvidos a quilómetros de distância.

A Sra. Mikhatskaya disse: “Isso quebra meu coração, os danos a essas crianças durarão a vida toda. O conflito os aprisionou”.
Edifícios destruídos pela guerra russo-ucraniana | foto @Roland Leon/Sunday Mirror
[A ONG] Save the Children, que oferece apoio para salvar vidas no local, diz que um em cada quatro jovens sofre traumas psicológicos. Margaux Dessus, Gestora de Desenvolvimento de Programas e de Qualidade, disse: “Há alguns meses, vimos um caso de uma criança que pegou um artefato não detonado e tentou desmantelá-lo. Ela perdeu as duas mãos. Temos visto crianças de 12 ou 13 anos de idade, tão desesperadas que são forçadas a 'sexo de sobrevivência', prostituindo-se por comida. Isso [acontece] às portas da Europa [Ocidental]”.

Mais ao norte, outra aldeia fica diretamente na linha de frente. Sua localização precisa deve ser mantida em segredo, pois os moradores temem represálias por falarem. Dezenas de alunos devem cruzar a linha [da frente] aqui só para chegar à escola. Esta, pelo menos, ainda está de pé - embora cercada por sacos de areia depois de suas janelas terem sido destruídas anos atrás.

O deputado local, Pavlo Stranadko diz que em 2015 a vila foi alvejada durante três dias, perdendo um quarto dos seus edifícios.

Quando o Sunday Mirror a visitou, seis obuses explodiram nas proximidades  ecoando pela praça. Stranadko disse: “Nós temos uma piada – o lugar mais seguro é onde estão os militares. Não está aqui.

Cartazes escolares dizem às crianças como evitar bombas e minas que não explodem.
Natália e Olexander Krasavchenko, o marido e pai deles morreu, pisando a mina terrestre.
Foto @ Roland Leon/Sunday Mirror
Natália Krsavchenko ganha apenas [o equivalente às] 140 libras por mês como professora aqui – um bom salário para a região. Ela contou como seu marido Sergei/Serhiy foi morto por uma mina: “Ele estava apanhando a lenha com amigos. Pisou na mina e eles assistiram ele à morrer. Eles não me deixariam ver seu corpo".

Análise de especialistas: Professor Mark Galeotti de Instituto de Relações Internacionais em Praga:
Esta é uma guerra que Putin começou a tentar quebrar a resistência da Ucrânia, para a fazer aceitar que era um estado fantoche russo. 
É uma guerra do império de Putin e só vai acabar quando ele quiser.
A tragédia é que ninguém quer o próprio Donbas – a Rússia entrou [aqui] para pressionar Kyiv. Ele [Putin] queria que o governo [ucraniano] percebesse que [Donbas] fazia parte da esfera de influência russa.
Isso não funcionou, mas a Rússia não pode recuar agora, já que iria parece uma derrota. Putin não pode sair à menos que ele possa ter o momento de missão cumprida. Ele poderia esmagar Ucrânia, mas goteja apenas tropas suficientes para manter as coisas funcionando.

Nove dias depois, quando sua família se reuniu para lamentar, um morteiro caiu no quintal deles. Natalia disse: “Eu ouvi um estrondo, vi um flash através da janela. Eu disse adeus a minha vida. Penso se teria sido melhor – mas eu tenho que ficar forte por causa dos meus filhos”.

Seu filho Olexander, de 15 anos, é endurecido pelos horrores. Ele disse: “Acostumamo-nos à se esconder no porão. Mas agora eu posso perceber o quão longe estão os armamentos, dependendo do seu som. Se sabemos que o bombardeio não está tão próximo, continuamos jogando futebol”.

Em Avdiivka, uma das vilas [da linha da frente] mais atingidas, metade dos 40.000 habitantes fugiram e ruas inteiras foram destruídas. Irina Strelets, supervisora de um clube após-a-escola da Save the Children, disse: “Elas [crianças] desenham campos com relva/grama e árvores. Mas ao lado das árvores estão os tanques. Elas não podem imaginar a vida sem tanques e armas. A única coisa que a maioria delas se lembra é a guerra”.

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