domingo, novembro 13, 2016

Diário da ucraniana que sobreviveu cativeiro e tortura terroristas

A ativista ucraniana Anna Huz manteve o seu “Diário de uma [mulher] de Donetsk / uma hutsul” desde maio de 2014 como a «maneira de não enlouquecer e repensar os acontecimentos no país», escreveu ela própria no prefácio do livro apresentado ao público em Kyiv.

Em 2013 Anna foi uma das pessoas que apoiaram ativamente o movimento de Euromaydan de Donetsk, como diversos outros moradores da Donbas ela teve que deixar os territórios ocupados. Hoje mora em Kyiv. «Se voltar serás fuzilada», — disseram-lhe «amavelmente» em Makiivka, quando ela saia do prédio, onde foi torturada durante seis dias.

«Irás me comer a tua bandeira ucraniana

Em maio de 2014 Anna visitou Donetsk por um curtíssimo período de tempo, visitando a sua filha menor que vivia com a avó, acreditando que os terroristas tem mais o que fazer do que perseguir os ativistas do Euromaydan. Estava enganado e entrou “na cave”, o eufemismo para as masmorras dos terroristas, usadas para deter e torturar os seus oponentes políticos, reais ou imaginários.

O seu apartamento foi invadido pelos terroristas na manha de 27 de maio de 2014. Além de prende-la, juntamente com o namorado, os terroristas carregaram tudo que acharam de valor: notebook, câmara, telemóveis, cartões de crédito e panfletos «Pela Ucrânia unida». Com as palavras: «Vocês não sabem que as bandeiras ucranianas são proibidas no território da «dnr»?" — os terroristas armados arrancaram a bandeira ucraniana da parede e a embrulharam na cabeça da Anna.

Os dois foram levados a cidade de Makiivka, onde ela passou 6 dias numa das caves, o que resultou em diversas cicatrizes e um dedo partido.
«Vou te matar! Cortar aos bocados! Vais me comer essa tua bandeira ucraniana!» — gritava um dos carrascos. Ele brandia a faca na minha cara, batendo nos joelhos com as algemas, – conta Anna. — Depois espetou a faca no meu joelho e a virou. Fiz o mesmo com a outra perna. O terrorista ameaçava com o estupro coletivo, corria para fora, voltava e tudo começava de novo. Os outros quatro comparsas observavam a cena, como no teatro. No final, ele disse: É hora de acabar contigo, dobre a cabeça – e fez uma corte no pescoço. 

A refém ensanguentada foi levada até o primeiro piso, onde outros terroristas armados explicaram: se Anna quer sobreviver, deve «confessar» tudo e ajudar atrair aos territórios ocupados outros ativistas e jornalistas.

Me espancavam até sangrar, cortavam o rosto e as mãos, depois chamavam a enfermeira para tratar as feridas, – continua Anna. — Enfermeira, as escondidas me fez a injeção de anestésico. Em seguida, os terroristas mandaram me a lavar o chão. Com as ligaduras ensanguentadas nas mãos, eu lavava o corredor, depois o interior da viatura que trazia para a base os “milicianos” mortos...

O comandante dos terroristas, voltando a base, zangou com os seis subordinados: Vocês não têm cérebros? Ela é preparada para a troca! O que eles vão pensar sobre a forma como tratamos os prisioneiros?! levando Anna para o hospital.

Anna e seu namorado foram libertados na troca de prisioneiros. “Sem os pertences, vá até a saída, lhe disseram os terroristas. Desculpem os traumas, estamos em guerra... Boa viagem. Caso volte – será fuzilada”.

No «Diário» quase não se fala do seu cativeiro, não há detalhes sangrentos.
Sobre isso será o meu próximo livro conta os planos a autora.

Testemunhos de Anna sobre a sua passagem pelo cativeiro terrorista foram incluídos no relatório do Hugh Williamson, diretor da Human Rights Watch. Os funcionários da ONG com sede nos EUA que se dedica à defesa dos direitos humanos documentam as violações dos direitos humanos em mais de 70 países ao redor do mundo.

Anna conta que os seus familiares possuem diversos apelidos / sobrenomes e têm registos domiciliares diferentes, o que os salvou.

Pelo cativeiro passou o meu pai, a irmã quase que foi capturada, no fim toda a família, na qualidade dos “inimigos do povo”, teve que abandonar a “república popular”.

O pai da Anna não queria deixar Donetsk, um ano ele viveu na sua própria casa de forma clandestina, sem ligar a luz ou a TV. Ele foi raptado no centro da cidade, acusado de ser “corretor da artilharia ucraniana”, a patrulha dos milicianos não gostou o facto de ele fotografar a cidade: os fontanários, neve, namorados, crianças ou pombosEmbora os terroristas não acharam no telemóvel nenhuma imagem incriminatória, ele ficou preso durante dez dias, oito dos quais trancado numa jaula, onde os antigos donos legítimos mantinham os seus cães. Antes de o libertar, os terroristas exigiram que ele assine a declaração de não ter nenhuma reclamação à fazer. 

A irmã mais nova da Anna, Eugénia, também caçada pelos terroristas como ativista do Euromaydan, mudou a sua aparência e foi ao Donetsk a procura do pai. Estava em casa da irmã, Anna, quando percebeu que estavam forçando a porta de entrada. Teve sorte, a porta blindada aguentou.

Diário” da Anna Guz é uma história da refugiada interna, contra a sua vontade, que vive com Donbas na coração. “Conto ao amigo que ficou em Donetsk, sobre o meu dia. Digo: “Fiquei molhada na chuva Ele responde: Ainda bem que não foi com o “Grad, – a autoraas páginas do seu próprio livro.

— Durante a minha palestra na universidade um das alunas perguntou: As pessoas vão para o trabalho sob os bombardeamentos? Igual em Kyiv: de manhã – no trabalho, à noite – na Maidan, – conta Anna Guz. – Espero que eu fui capaz de explicar aos interlocutores, como é – viver e ir ao trabalho sob os bombardeamentos, quando colapsam os prédios e morrem as pessoas. Os habitantes dos territórios ocupados vivem em constante medo de entrar “na cave”, onde tudo pode acontecer ao prisioneiro. Quero que as pessoas em toda Ucrânia saibam como é viver sob ocupação, e percebessem que nós, os participantes do Euromaydan de Donetsk fizemos tudo o que podíamos. E estamos fazendo! Afinal de contas, um terço dos combatentes dos batalhões voluntários são moradores das regiões de Donetsk e Luhansk (@fakty.ua).

Anna pretende fazer a parte do grupo de ativistas de formação da ONG que irá unir os ex-reféns das organizações terroristas “dnr/lnr”, chamada «Associação de prisioneiros».

Os prisioneiros e reféns ucranianos em números e no filme
Recentemente, na cidade de Varsóvia, os ativistas ucranianos apresentaram o filme documental sobre os horrores que as organizações terroristas “dnr/lnr” submetem os reféns e prisioneiros ucranianos.

Desde o início da guerra russo-ucraniana cerca de 10.000-15.000 pessoas passaram pelo cativeiro terrorista. Cerca 2/3 eram presas pelos “delitos administrativos”: o “desrespeito” aos terroristas ou aos horários do recolher obrigatório. Eles passavam no cativeiro por alguns dias, eram usados nas limpezas, carregamento de munições ou na construção das defesas dos “milicianos”. Eram alvos de violência e humilhações de nível moderado.

Cerca de 1/3 dos prisioneiros eram prisioneiros políticos ou foram raptados pelos terroristas para pedir o resgate. Eram ativistas sociais, pessoas que declaravam abertamente a sua posição pró-ucraniana, voluntários, pessoas suspeitas de ter ligações com as forças de segurança ucranianas, jornalistas independentes que se permitiam a criticar os separatistas, empresários e autoridades locais que não apoiaram os terroristas. Eles foram submetidos às torturas mais sofisticadas e passaram em cativeiro por muito mais tempo – de alguns dias até vários meses.

Alguns desses prisioneiros morreram, não aguentando as torturas, alguns foram executados. Pelos muitos prisioneiros militantes os terroristas exigiram o resgate. O valor de resgate variava de algumas dezenas às centenas de milhares de dólares. Pela liberdade de alguns empresários e funcionários seniores os terroristas exigiam os montantes na ordem de um milhão de dólares.

É quase impossível determinar o número exato de vítimas de raptos de civis – os terroristas escondem estes dados, a polícia ucraniana é bastante lenta em documentar e investigar, mesmo nos casos que receberam a ampla publicidade.

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