segunda-feira, março 04, 2013

Quebrando o nariz do Estaline


Um dos problemas com qual invariavelmente se deparam todos aqueles que nasceram por trás da “cortina de ferro” é a grande dificuldade de contar as nossas vivências, para que estas pudessem ser compreendidas pelas pessoas que nasceram nas sociedades livres.

O livro Breaking Stalin’s Nose (publicado na Rússia sob o título Nariz do Estaline) do escritor Eugene Yelchin preenche essa lacuna. Dirigido às crianças entre 12 à 15 anos, o livro conta aos alunos de escola sobre os acontecimentos da época do Grande Terror na União Soviética.

O seu autor e ilustrador, Eugene Yelchin, nasceu em 1956 em Leninegrado, emigrando em 1983 para os EUA. As suas experiências pessoais e familiares são incorporados no livro, mas a obra não é autobiográfica. O passado soviético comum, fantasmagoricamente condensado, mas não menos reconhecível, aparece neste livro, juntamente com os tiques aparentemente desaparecidos, mas “mais vívidos do que os seres vivos”.
capa da edição russa

Quebrando o nariz do Estaline” (editora “Henry Holt and Co.”, ISBN 9780805092165) nos conta as 48 horas da vida de um aluno soviético normal, Sasha Zaichik, que sonha em se tornar o pioneiro e escreve a carta ao camarada Estaline. Mas o dia começa mal, Sasha testemunha a detenção do seu querido pai, oficial do NKVD, faz ensaio para se tornar o porta-bandeira da sua turma da escola, se torna o filho do inimigo do povo, parte o busto do camarada Estaline, provocando a detenção da sua professora, Nina Petovna e até torna-se o alvo de aliciamento por parte do agente do NKVD.

O mundo do Sasha Zaichik desaba momentaneamente: todas as suas noções do bem e do mal, estabilidade e justiça do universo soviético desaparecem. Afinal, atrás das palavras oficiais dos editais dos jornais sobre os “inimigos do povo” se encontram as pessoas próximas e reais. E mesmo o nosso herói, até ai tido como exemplo à seguir, se torna um pária, pessoa cuja cara na fotografia grupal da escola é coberta com a tinta permanente.
capa da edição sul-coreana

Seguem as consequências diretas de ser considerado “filho do inimigo do povo”: o quarto dos Zaichik, o melhor do apartamento comunal, onde vivem 48 cidadãos soviéticos honestos é ocupado pela família de Stukachov. O que torna claro que o patriarca deles, Stukachov Sr., é um informador do NKVD que, muito provavelmente denunciou o pai do Sasha. No apartamento comunal, onde a sua tia Larisa vive com o marido e filho recém-nascido, moram 26 pessoas e alguns são informadores do NKVD. Receosa pela segurança da sua própria família tia Larisa expulsa Sasha, abrigar o filho do “inimigo do povo” torna-se perigoso demais.

Já no fim do livro, estando nos traseiros do famoso edifício do NKVD na Lubianka, numa fila interminável dos familiares dos detidos, Sasha Zaichik enfrenta os sentimentos humanos não chorados das pessoas cujos entes queridos estão em desgraça, e finalmente encontra a esperança.
capa da edição japonesa

A editora “Girafa cor-de-rosa”, que publicou o “Nariz do Estaline” na Rússia, anunciou que planeia organizar uma série de encontros nas bibliotecas, escolas, festivais literários, para discutir o livro.

Em 2011, a revista literária Horn Book considerou o livro como um dos melhores do ano, em 2012 “Quebrando o nariz do Estaline” ganhou o prémio John Newbery. O livro já teve duas edições na Correia do Sul e neste momento se prepara a edição japonesa.

O escritor e ilustrador checo, Peter Sís, o autor da obra «The Wall: Growing Up Behind the Iron Curtain» caracterizou o livro de seguinte maneira: É importante que este livro seja lido por todas as pessoas que vivem na sociedade livre”.

2 comentários:

João Nobre disse...

AHAHAHA,está muito cómico o livro.

A rússia soviética era mesmo uma loucura...

Jest nas Wielu disse...

Tragicômico melhor dizendo, as pessoas chegavam denunciar os seus vizinhos dos apartamentos comunais por se limpar (não havia o papel higiênico, invenção "burguesa") com papel do jornal que tinha algum retrato do Grande Líder Staline ou outro líder menor do tipo Kalinin...